— Margarida, não tenho para onde ir. — A voz de Vicente soava grave, carregada de súplica, cada palavra revelando a angústia que o sufocava. — Ontem passei o dia inteiro andando de um lado para o outro, encontrei tanta gente, rodei tantos lugares. Será que posso dormir aqui no chão, só por duas horas? Só duas horas, depois vou embora.Ele estava parado à porta, imponente como sempre, mas, ao mesmo tempo, parecia um cão grande e perdido, sem rumo, implorando apenas por um teto sob o qual pudesse se abrigar da tempestade. Cada palavra vinha carregada de cuidado, como se temesse que qualquer tom mais duro fosse suficiente para afastá-la ainda mais.Ao vê-lo invadir o quarto sem permissão, Margarida havia franzido a testa instintivamente, mas, quando escutou a súplica, sua expressão suavizou um pouco, ainda que relutante.— Sr. Vicente, não precisa se rebaixar assim. Sei que você passou por muita coisa ontem, nunca quis impedir que descansasse. Mas esta casa é enorme. Por que exatamente a
Na nova casa.Margarida e Vicente já tinham ouvido falar da confusão que explodia na família Almeida, mas nenhum dos dois demonstrava qualquer intenção de ir até lá presenciar o espetáculo. Margarida já havia tomado a decisão de se divorciar. Logo, em sua visão, não teria mais ligação alguma com aquela família e não fazia sentido se envolver em um circo que já não lhe dizia respeito. Vicente, por sua vez, porque se Margarida não queria ir, muito menos ele iria. No coração dele, nada era mais importante do que ela. Além disso, Marina e Leonor não estavam morrendo, apenas sendo expulsas por Guilherme. Se fosse o fim definitivo daquelas duas, aí, sim, talvez valesse a pena aparecer para conferir a cena.Quem quase explodiu de curiosidade foi Teresa.— Meu Deus do céu! Aquelas duas ridículas, uma sempre pagando de fina, a outra se achando a grande herdeira, agora vão ser chutadas da família Almeida! Um espetáculo desses não acontece todo dia, não posso perder de jeito nenhum! — Ela excla
No coração de Guilherme, sua esposa sempre era apenas Sofia, por isso, todas as vezes em que Marina se agarrava nele e o chamava de marido, um enjoo lhe subia pelo estômago. Para ele, aquilo nunca foi sinal de carinho, mas sim um castigo silencioso, e aceitava sem reagir porque acreditava que essa era a penitência que merecia carregar. Agora, porém, decidido a se divorciar, Guilherme não tinha mais motivos para calar.Marina ficou imóvel no chão por alguns segundos, como se tivesse levado um choque, e quando finalmente assimilou as palavras dele, sua voz saiu trêmula, quase histérica, reverberando por todo o salão:— Guilherme, o que você está dizendo? Acordo de divórcio? Nós já temos essa idade, nossos filhos já estão grandes! Você vai me expulsar da família Almeida com eles? Você enlouqueceu? Você perdeu o juízo?— Não. — A voz dele ecoou firme, cortante, tão gelada que parecia congelar o ar ao redor. — Louco eu estive nos últimos vinte anos. Hoje, pela primeira vez, estou lúcido.
Naquela época, Marina ainda tinha se mostrado compreensiva, garantindo a Guilherme que havia tomado a pílula e que nunca lhe causaria problemas. Tomado pela irritação e pelo peso da situação com Sofia, Guilherme não conferiu o detalhe. Ele sempre era meticuloso, mas naquela noite estava cansado demais para insistir. Só que, um mês depois, Marina surgiu diante dele com um exame de gravidez nas mãos e, pior do que isso, deixou sem querer que a própria Sofia visse o resultado. O que veio depois era fácil de imaginar. A esperança da esposa legítima se transformou em desespero e o alicerce da família desmoronou.O olhar de Guilherme escureceu, a aura pesada de sua fúria parecia esmagar o ar em volta. Marina empalideceu, sem acreditar que ele traria à tona esse episódio que tentava enterrar no passado. Ainda assim, engoliu o medo e vestiu novamente a máscara de vítima, chorando com a voz trêmula e os ombros estremecendo.— Guilherme, eu não quis te enganar. Aquela foi minha primeira vez,
O corpo inteiro de Marina tremia, o suor frio escorrendo pela pele enquanto se ajoelhava no salão da mansão, com os joelhos quase cedendo sob o peso da própria culpa. Ao lado dela, Leonor chorava sem parar, os olhos inchados e vermelhos, já entregue ao desespero. Marina jamais, nem nos seus piores pesadelos, teria imaginado que seria a própria filha a colocá-la contra a parede.Ela tinha se preparado com várias versões da história, pronta para confundir Guilherme, esconder as próprias pegadas. Se fosse necessário, até inverter a situação a seu favor. Mas, antes mesmo de voltar para casa, Leonor já havia entregue tudo que consistia em sua aliança com Eduarda, seu plano para arruinar Margarida e a armadilha armada para esmagar Vicente. Palavra por palavra, cada detalhe havia sido exposto sem chance de recuo. Agora, qualquer justificativa soava inútil.A única saída, Marina sabia, era impedir que Guilherme conectasse esse escândalo recente àquele evento do passado, o sequestro de Vice
Como era de se esperar, Guilherme estava parado na porta do quarto, o rosto carregado de sombras densas, e a expressão rígida, marcada por linhas de fúria contida, deixava claro que havia ouvido cada palavra. Os olhos, idênticos aos de Vicente, ardiam com um brilho cortante, quase assassino. Leonor empalideceu na hora; a raiva que a inflamava segundos antes desapareceu como se fosse engolida pelo gelo. Naquele instante, percebeu sem margem de dúvida. Ela estava perdida....Do outro lado da mansão, Marina ainda não fazia ideia do que acontecia. Depois de armar todo o espetáculo no cais, colocando Eduarda diante de Vicente e atraindo uma multidão de jornalistas para registrar a cena, passava um tempo cuidando de si. Ela tomou banho, trocou de roupa, borrifou perfume caro, retocou a maquiagem. Queria voltar para casa como se nada tivesse acontecido, impecável, a perfeita dama da alta sociedade.Mas o caminho de volta não trouxe a satisfação esperada. Com o celular firme nas mãos, agua