Capítulo 0002

Uma dor esmagadora tomou conta de Catarina naquele instante, tão intensa que mal conseguiu se manter consciente. Ela encarou a silhueta de Félix se afastando e, entre soluços de sofrimento, ainda tentou chamá-lo:

— Félix, por favor... Não vai embora... Minha barriga...

Ele chegou a parar, mas voltou o olhar para ela sem qualquer traço de calor.

— Catarina, não tenho tempo para essas encenações. A mão da Eunice não pode ficar marcada, ela é uma estrela! Você sempre precisa ser tão cruel, não é?

Sem esperar resposta, Félix simplesmente seguiu carregando Eunice nos braços, sumindo no corredor sem olhar para trás.

Vendo-o ir embora, Catarina fechou os olhos, consumida pelo desespero. Uma dor latejante atravessou seu corpo, obrigando-a a buscar ajuda com um fio de voz:

— Socorro! Por favor, salve o meu bebê...

Sentiu um calor estranho lhe escorrer pelas pernas, enquanto o cheiro forte de sangue inundava o ambiente. Ao baixar o olhar, tudo que conseguiu ver foi o vermelho vivo que rapidamente se espalhava ao seu redor.

— Não... — Ela murmurou, e as lágrimas irromperam sem controle, transbordando medo e angústia.

Era seu filho. Ela não podia perdê-lo, era tudo o que tinha!

Felizmente, alguém percebeu a gravidade da cena e se aproximou em disparada.

— Moça! O que houve com você? Ei, aguenta firme, já vou chamar uma ambulância!

O socorro não demorou a chegar. Dentro da ambulância, Catarina lutava contra a dor insuportável, mas encontrou forças para suplicar a médica:

— Doutor... Pelo amor de Deus, salve meu filho... São só três meses... Me ajuda, por favor...

— Fica tranquila, senhora. Vamos fazer todo o possível. — Respondeu a médica, adotando um tom calmo, mesmo sabendo no íntimo que a esperança era mínima. — Me deixe avisar seu marido, logo ele estará aqui com você.

Pegou o celular e discou para Félix, mas quem atendeu do outro lado foi Eunice.

— Alô? Quem fala?

— Por favor, preciso falar urgente com o marido da Catarina. Ela está em estado grave, perdendo muito sangue. Peça para ele ir ao hospital agora.

Naquele momento, Félix já havia deixado Eunice no hospital e seu celular tinha ficado esquecido no fundo da bolsa dela.

Eunice suspirou, com aquele veneno na voz:

— Nossa, Catarina, você realmente não cansa de fazer cena? Agora até médica você coloca no meio da história? Você acha que, usando esse bebê de desculpa, o Félix vai voltar para você? Se eu não tivesse ido morar fora há três anos, seria eu a esposa dele hoje. Ele sempre me amou, acha mesmo que pode competir comigo?

— Moça, por favor! Isso é questão de vida ou morte. Passe o telefone para o marido da paciente agora!

Com quase nenhuma força, Catarina tentou responder com a voz rouca e embargada:

— Eunice, não estou competindo com você. Só te peço... Avisa o Félix, meu bebê está morrendo.

— Para ser sincera, eu não acredito em nada disso, mas, já que você insiste, vou mostrar hoje quem realmente importa para ele. Eu ou essa criança.

Na ambulância, o tempo parecia passar mais devagar diante do sofrimento de Catarina. Do outro lado, Eunice enfim passou o recado:

— Félix, é a Catarina. Diz que está acontecendo alguma coisa séria com o filho dela, está pedindo para você voltar.

— Deixa para lá, deve ser mais um truque. O que importa agora é a sua mão, Eunice. Não se preocupe, a médica já está vindo.

Cada palavra de Félix cortou Catarina por dentro, como se atravessasse seu peito. Tudo foi escurecendo ao redor, seu corpo ficando mais distante, como se perdesse contato com a própria vida.

A médica ainda tentou falar, mas agora o telefone de Félix já estava desligado.

— Ai, meu Deus, que situação. Sra. Catarina, não perde a esperança, vamos fazer o que for possível! — Disse a médica, apertando levemente sua mão, tentando transmitir força, mas nada parecia capaz de conter o abismo de dor que se abria dentro dela.

Catarina já sabia que tinha perdido seu bebê naquele instante.

Quando finalmente recobrou os sentidos, foi recebida pelo forte cheiro de desinfectante impregnando o ar, fazendo nariz e olhos arderem. A médica a observava com um olhar cheio de pesar e tentou consolá-la:

— A senhora ainda é jovem, logo terá outras oportunidades...

Catarina manteve o olhar preso no teto, passando a mão pelo ventre agora plano enquanto, resignada, deixou as lágrimas correrem. Ninguém além dela sabia quão difícil foi chegar até aquele bebê.

O pessoal da família Gonçalves nunca simpatizou com sua presença, mas sempre a pressionaram para engravidar. Quando finalmente conseguiu, todos comemoraram como se ela tivesse conquistado seu lugar na família.

Agora, seu bebê se foi, e o perdeu justamente pelas mãos do próprio pai.

Ela sabia, do fundo da alma, que o pessoal da família Gonçalves voltaria dificilmente a se importar com ela depois daquele dia.