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Capítulo 2

Author: Soldador do Atlântico
Noemi abriu os olhos com dificuldade. Ofegante, começou a se debater, gritando com o pouco fôlego que tinha:

— Ícaro, seu desgraçado! Sua mãe e sua esposa ainda estão aqui, se afogando, e você simplesmente foi embora com o cruzeiro!

— Você esqueceu que a Solene tá esperando um filho seu?!

O vento cortante levava suas palavras, dilacerando os gritos em pedaços perdidos no ar.

Mas Ícaro só tinha olhos para a sua frágil e insubstituível Diana. Como poderia sobrar espaço para essa esposa descartável que era eu?

Noemi, tomada por uma fúria impotente, fechou os olhos de novo. O corpo cedeu. Apagou-se nos meus braços, pela segunda vez.

Foi então que percebi, com um frio gelando minha espinha: o mesmo cardume de tubarões da vida passada estava se aproximando.

O pânico me atravessou como uma lâmina. Comecei a nadar na direção oposta, lutando contra a corrente com tudo o que me restava.

Mas eu carregava uma vida dentro de mim. E arrastava outra, desacordada, pela mão. Não importava o quanto me esforçasse, a distância entre nós e os predadores diminuía a cada segundo.

Naquele instante, tive certeza: desta vez, eu não escaparia.

Ícaro.

Na vida passada, você me odiou por ter gritado por socorro, por ter te distraído e atrasado o resgate da sua musa.

Mas nesta, não te devia mais nada.

Parei de lutar. O peso de Noemi me puxava lentamente para o fundo.

Quando fechei os olhos, pronta para afundar de vez, uma voz ecoou do horizonte:

— Solene, aguenta firme!

Ergui a cabeça, incrédula.

Era André Antunes, o motorista de Ícaro, cruzando as ondas com um bote a motor.

E em poucos segundos, ele já estava ao nosso lado.

Agarrei Noemi com força e a ergui com tudo o que me restava.

André captou a urgência no mesmo instante. Juntos, conseguimos colocar a Noemi em segurança no bote.

Ele então passou a mão pelo rosto, tentando limpar a água que escorria, e me estendeu a mão:

— Eu sabia que tinha ouvido vocês. Mas aquela Diana jurava que você ainda estava no navio. Ainda bem que eu...

A frase morreu na garganta dele. Num segundo, ele ergueu o remo e o golpeou com força ao meu lado.

Virei o rosto, assustada, só então vi: uma sombra escura nadava junto a mim. Um tubarão.

O pânico me atingiu como um raio. O corpo reagiu antes da mente. Sem dizer nada, usei braços e pernas para escalar o bote com toda a energia que me restava.

Quando finalmente apoiei os pés a bordo, tentei agradecer. Mas o mundo girou e tudo ficou escuro.

Quando voltei a abrir os olhos, já estava no hospital.

E, para minha surpresa, Ícaro estava ao lado da cama.

Assim que percebeu que eu acordara, sua voz cortou o silêncio com uma frieza cruel:

— Solene, tem ideia do que você fez?

Tentei me levantar, mas cada parte do meu corpo doía como se tivesse sido atropelada por uma tormenta. Ícaro me observava com desdém.

— Fingir fraqueza agora? Pra quê?

— Você empurrou a Diana no mar. E depois tentou se afogar pra fugir da culpa. Isso é mais do que crueldade, é doentio!

— Sabia que você quase matou minha mãe? Quase matou o André? Os dois ainda estão inconscientes! Se algo acontecer com eles, eu faço questão que você pague com a própria vida!

Assim que ele terminou de falar, a porta do quarto rangeu. Diana entrou, os olhos marejados, e caiu de joelhos bem à frente da minha cama.

— Você me odeia por eu ter dividido o amor do Ícaro. Mas eu não vou mais atrapalhar vocês. Eu vou embora, tá bom? — A voz dela saía entrecortada. — Só te peço uma coisa: que daqui pra frente você seja uma boa pessoa. Não use mais o nome da Sra. Cintra pra fazer maldades como essa!

Dizendo isso, levantou-se às pressas e correu em direção à porta.

Ícaro a segurou pelo braço antes que saísse.

— Você não precisa ir embora. Quem tem que sair é essa víbora da Solene!

Foi então que consegui me erguer, mesmo cambaleante. Fiquei de pé, encarando o par romântico à minha frente com uma frieza cortante.

Abri a boca para falar, mas Diana deu um grito, recuando um passo:

— Ícaro, ela vai me bater de novo! Eu tô com medo!

A raiva cegou Ícaro. Sem pensar, ele me desferiu um pontapé.

Não consegui desviar. O impacto me lançou contra a cama, e caí no chão, sentindo um estalo surdo percorrer minhas costas.

Uma dor lancinante, como se meus ossos se partissem, me atravessou. Logo depois, senti algo quente escorrendo entre minhas pernas.

— O bebê... Ícaro... o nosso bebê...

Ele continuava abraçando Diana, e o olhar que me lançou era o de um inimigo mortal.

— Para de fingir! Você sempre fez isso pra incriminar a Diana. Acha mesmo que eu vou cair de novo nessa encenação?

Me virou as costas, ignorando meus gemidos. Diante dos meus olhos, ergueu Diana nos braços.

— Você passou por muita coisa hoje. Vou te levar pra casa.
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