Share

Capítulo 6

Author: Rolinho Primavera de Morango
Anabela baixou o olhar, relembrando às vezes que havia visto Gustavo levando Rafaela ao parque de diversões, onde ele tirava fotos com ela por horas sem demonstrar o menor cansaço.

Não se tratava de competir com Rafaela, mas sim de realizar um sonho antigo da sua infância. Aquela quarta coisa era um presente para a pequena Anabela que ainda morava dentro dela.

Embora Gustavo estivesse fisicamente ao seu lado, sua mente já havia voado para bem longe. Ele mantinha os olhos fixos no celular, e sempre que Anabela pedia para ele tirar uma foto, precisava chamar quatro ou cinco vezes até conseguir arrancar sua atenção da tela.

Quando a noite chegou e Gustavo insistiu três vezes para que fossem embora, ela fingiu não escutar nenhum dos pedidos dele.

Foi então que a roda-gigante se iluminou na distância, fazendo os olhos dela brilharem de esperança enquanto apontava na direção das luzes coloridas.

— Me acompanha só nessa última, depois a gente vai.

Gustavo ficou parado no lugar, observando aquele brilho tímido que tomou conta do rosto de Anabela. Depois de um longo silêncio, ele disse com seriedade:

— Anabela, mesmo que essa roda-gigante chegue ao topo do mundo, eu jamais vou conseguir te amar.

O tempo passou em segundos que pareciam eternos. Anabela sentiu uma ardência nos olhos e girou o rosto para o lado com pressa.

— Que ideia maluca! Eu só nunca andei numa dessas na vida!

De repente, o toque do celular quebrou o silêncio constrangedor. Do outro lado da linha, Rafaela falava alguma coisa com urgência na voz. Assim que desligou, Gustavo saiu correndo mais uma vez, só que daquela vez nem se incomodou em pedir desculpas.

Quando a roda-gigante alcançou o ponto mais alto, Anabela contemplou o mar de luzes espalhado lá embaixo. As lágrimas desceram pelo seu rosto enquanto sussurrava para si:

— Anabela, feliz aniversário.

...

Depois daquele dia, uma febre alta levou Anabela direto para o hospital.

O barulho constante dos aparelhos ecoava pelo quarto, mas ela parecia surda a tudo. Durante os momentos de delírio, teve a impressão de que Gustavo havia aparecido para visitá-la.

Ao vê-la naquele estado deplorável, ele não mostrou nem um pingo de piedade. Gustavo abriu um sorriso cruel e começou a gargalhar.

— Bem feito! Quem planta vento colhe tempestade. É melhor você morrer de uma vez, assim não preciso mais fazer aquela besteira que você pediu por último.

Mesmo no sonho, Anabela ficou furiosa ao ponto de ranger os dentes, mas sentia o coração como se tivesse sido mergulhado em limão por dias inteiros. Ela juntou toda a força que conseguiu encontrar e forçou os olhos a se abrirem, mas não encontrou a pessoa que esperava ver.

— Graças a Deus, finalmente acordou. — Disse uma voz conhecida — Você faz ideia de quanto tempo passou dormindo?

Anabela sempre teve muito orgulho, e o círculo social em que vivia era movido pela fama e pelo dinheiro. Com a família Souza arruinada e Gustavo sendo seu inimigo declarado, todo mundo sabia que ele seria o primeiro a aparecer para rir da desgraça dela. Por isso, todas as antigas amigas já tinham escolhido seu lado há muito tempo, cortando qualquer tipo de contato com ela.

A única pessoa com quem Anabela ainda conseguia conversar era Eduarda Santos, a enfermeira que cuidava dela.

Ouvindo aquela pergunta, Anabela olhou para ela em pânico.

— Que dia é hoje?

Eduarda pensou que ela estava preocupada com o pouco tempo que lhe restava e tentou escolher as palavras com cuidado.

— Dia vinte e oito, Anabela, você...

— Onde está minha peruca? — Anabela a interrompeu.

Eduarda ficou confusa por um momento antes de responder:

— Está aqui, guardei ela para você.

Anabela encolheu os dedos e pegou a peruca das mãos dela. Baixou as pálpebras, tornando impossível descobrir o que estava pensando.

— Eduarda, enquanto eu estava desacordada, alguém veio me ver? — Ela fez a pergunta com cautela, apertando a peruca entre os dedos.

Eduarda sentiu o coração se partir vendo ela assim, mas não queria mentir para a amiga.

— Anabela, o Gustavo não apareceu aqui nem uma vez.

Depois de falar, Eduarda virou o rosto depressa para esconder os olhos vermelhos. Ele não só havia ignorado completamente a situação como nem quis ouvir as ligações e indiretas que ela tentou fazer.

— Desacordada? Que piada é essa? — Gustavo disse, com desprezo. — Todo mundo pode desmaiar, menos a Anabela. Estou ocupado demais para brincar com ela. Tirando aquela última coisa, não vou fazer mais nada que ela pedir. Fala para ela parar de inventar drama quando não tem o que fazer!
Continue to read this book for free
Scan code to download App

Latest chapter

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 25

    Vendo Gustavo naquele estado deplorável, Eduarda sentiu uma satisfação imensa, e se pudesse tirar fotos, certamente mandaria uma para mostrar a Anabela no além.Gustavo lambeu os lábios ressecados enquanto a observava.— Onde está a corda vermelha?Eduarda ignorou sua pergunta e tirou um caderno da bolsa.Gustavo acompanhou cada movimento dela com olhos fixos e desesperados.Ela encostou o diário na parede de vidro que os separava.— O que é isso? — Perguntou ele, confuso.Queria ver a corda, não aquilo.Eduarda permaneceu em silêncio e simplesmente abriu o caderno para que ele pudesse ver.Ao contemplar o conteúdo, Gustavo arregalou os olhos em choque total.Cada página, cada linha estava coberta com uma caligrafia trêmula e irregular.Eduarda não disse nada, mas ele começou a tremer de forma descontrolada. Depois de um longo silêncio, ela falou finalmente com frieza calculada:— Gustavo, aquelas cartas que você recebeu não foram escritas pela Anabela. Você jamais soube o quanto ela s

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 24

    Gustavo ergueu os olhos lentamente e lançou um olhar gelado para a pessoa que havia falado.— Seria melhor o quê? — Perguntou ele, com frieza cortante.Quem havia feito o comentário emudeceu na hora, encolhendo-se e se escondendo atrás dos outros.Vendo a reação patética, Gustavo soltou uma risada amarga.— Como é? Agora não têm coragem de falar? Estão arrependidos de não ter trazido o filho bastardo de volta?Descobrira que seu pai tinha um filho ilegítimo, algo que toda a família Costa sabia exceto ele.Quando ele sofreu o acidente e ficou temporariamente cego, cada um deles começou a conspirar para tirá-lo do poder.Se não fosse Anabela cuidando dele com dedicação e o ajudando a se recuperar, essa matilha de lobos já o teria devorado vivo.Ao pensar nisso, sentiu o peito se contrair de novo numa dor lancinante.Observou como todos arregalaram os olhos, surpresos por descobrir o segredo.A expressão de Gustavo se tornou ainda mais aterrorizante, declarando:— Não só não vou entregar

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 23

    — Anabela, que tal se eu me vingasse por você? — Murmurou ele, com carinho desesperado.Mal terminou de falar e já estava pegando uma garrafa da mesa para se golpear repetidas vezes na cabeça, fazendo o sangue jorrar e tingir sua camisa branca.Abraçou o retrato de Anabela e se deitou no sofá quando o telefone tocou, interrompendo o silêncio mórbido.— Desculpe, Sr. Gustavo, recebemos centenas de ligações sobre a recompensa, mas nenhuma sobre a corda vermelha que procura. — Informou o assistente.— Entendi. — Respondeu ele, fechando os olhos enquanto uma dor profunda o atravessava.No momento seguinte, já estava pedindo ao assistente para reservar uma passagem de avião, pois se não conseguia encontrar a corda, iria pessoalmente ao lugar sagrado pedir uma idêntica.Algumas horas depois, aterrissou e atravessou montanhas e vales até chegar ao pé da elevação onde, segundo os locais, havia um templo no topo que só recebia visitantes com coração puro e boa sorte.Gustavo subiu em silêncio,

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 22

    O celular de Gustavo estava repleto de mensagens de felicitações de aniversário, e só então ele se deu conta, num sobressalto tardio, de que era seu aniversário.Funcionava como uma máquina desprovida de alma, com o cérebro desligado de qualquer pensamento consciente enquanto deslizava os dedos pela tela sem propósito, até que acabou encontrando as mensagens antigas que Anabela havia enviado.05.27.2024 00:00"Gustavo, feliz aniversário."05.27.2023 00:00"Gustavo, feliz aniversário."05.27.2022 00:00"Gustavo, feliz aniversário."...As palavras na tela se transformaram em feras que o devoravam vivo.Um frio glacial tomou conta de todo o corpo, como se criaturas invisíveis o dilacerassem com garras afiadas, espalhando uma dor insuportável por cada membro até que começou a tremer sem controle.O celular escorregou de suas mãos e se despedaçou contra o chão.Não sabia se deveria reconhecer que Anabela o conhecia bem demais, sabendo que mesmo enviando as mensagens ele jamais as leria, ou

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 21

    Gustavo aprisionou Rafaela naquela mansão isolada após confiscar seu celular e todos os pertences, garantindo que não restasse qualquer alimento nos cômodos.Ignorou seus gritos desesperados enquanto trancava a porta principal e partia sem olhar para trás.O celular não parava de tocar com as ligações insistentes do assistente, que finalmente suspirou aliviado quando Gustavo atendeu.— Sr. Gustavo, que bom que atendeu! Temos uma emergência que precisa de sua atenção urgente.Gustavo ignorou o assunto e se limitou a dar ordens secas.— Compre algumas caixas de bebida e mande para casa. — Ele disse antes de desligar e ignorar o aparelho pelo resto do dia.De volta ao quarto que um dia compartilhou com Anabela, vedou todas as janelas e fechou as cortinas, criando uma escuridão perpétua onde se refugiou abraçado ao travesseiro dela, inalando com desespero os últimos vestígios de seu perfume.Mas logo percebeu que até mesmo aquele aroma único e especial dela estava desaparecendo aos poucos.

  • A Terceira Carta é Meu Adeus   Capítulo 20

    Gustavo se ajoelhou ao lado do fogo, movendo-se como um autômato sem alma enquanto retirava as notas cerimoniais com cuidado e as alimentava às chamas que dançavam na bacia.A necessidade de saber onde Anabela havia sido enterrada o consumia tanto que as noites se tornaram uma tortura insone, com a saudade corroendo cada momento de descanso.Quando questionou seu assistente sobre o assunto, descobriu que a notícia da morte havia chegado através de uma carta anônima contendo a foto do cancelamento de identidade de Anabela, prontuários médicos e apenas uma imagem de lápide mostrando seu nome, sem qualquer informação adicional que pudesse guiá-lo até ela.A revelação o atingiu como um raio devastador, mas logo pensou em Eduarda, a mulher que vinha atormentando-o com vingança implacável. Como amiga de Anabela, ela certamente sabia onde o corpo havia sido sepultado, talvez até tivesse sido responsável pelo funeral.Correu até a casa dela sem hesitar, mas descobriu que havia se mudado e tro

More Chapters
Explore and read good novels for free
Free access to a vast number of good novels on GoodNovel app. Download the books you like and read anywhere & anytime.
Read books for free on the app
SCAN CODE TO READ ON APP
DMCA.com Protection Status