Capítulo 1

Durante o corte do bolo, uma colega do mesmo curso entregou a primeira fatia para Dante, que havia acabado de chegar apressado. Como se fôssemos estranhos, ele não percebeu a presença da pessoa que dividia a cama com ele todas as noites: eu.

O som de risadinhas tomou conta da sala, e alguém mais ousado brincou:

— Liz Jansen, isso é um anúncio oficial?

A garota, com um penteado de coque divertido, ficou visivelmente envergonhada. Ela olhou timidamente para o homem ao seu lado e murmurou:

— Dante veio de tão longe, deve estar cansado.

A voz dela era doce e delicada. Combinada com os pequenos buracos de covinhas que surgiam em seu rosto quando sorria, era impossível não despertar simpatia. Mas ela não estava errada. O Hospital Dona Presidente ficava a mais de uma hora da faculdade de medicina. Além disso, Dante estava impecavelmente vestido em um terno, com a gravata borboleta amarrada com perfeição. Era evidente que ele havia se esforçado para estar ali.

Afinal, duas horas antes, ele ainda estava na sala de cirurgia.

Dante aceitou o pedaço de bolo com a elegância de um cavalheiro. Cada movimento dele era repleto de classe, e a luz que incidia sobre suas feições acentuava ainda mais seus traços marcantes. A aura fria e imponente que geralmente o acompanhava parecia suavizada naquele momento.

— De fato, estou com fome. — Disse ele, com sua voz grave.

Enquanto falava, seus olhos estavam fixos no rosto de Liz, e seu tom carregava um calor que contrastava com seu habitual comportamento sério e reservado.

As orelhas de Liz ficaram coradas. Ela murmurou, quase inaudível:

— Dante, todos estão olhando.

Dante levantou o olhar suavemente, varreu a sala com os olhos e, por fim, fixou a atenção em mim, que estava sentada na direção oposta. Sua voz permaneceu calma quando comentou:

— Essa pessoa parece ser nova por aqui.

Eu apertei levemente os dedos, enquanto pensava: "Já estamos casados há três anos, e ele ainda mantém essa habilidade de atuar impecavelmente."

Era compreensível. Afinal, nosso casamento era apenas um acordo. Até mesmo nossa certidão de casamento havia sido retirada pelo motorista da família Lima. Era um contrato vazio, sem substância. Ele não queria reconhecer nossa relação em público, e eu não podia culpá-lo por isso.

Entrei no jogo:

— Nos vimos na festa de aniversário da universidade no mês passado.

Naquela ocasião, Liz também estava presente. O chefe do departamento havia delegado a ela e a alguns outros alunos a tarefa de recepcionar os ex-alunos ilustres, incluindo Dante. Agora fazia sentido: foi quando os dois se conheceram. Fazia apenas um mês.

Dante pareceu indiferente à minha explicação e não fez nenhum comentário. Era como se ele realmente não se lembrasse de mim.

Liz percebeu a situação e rapidamente tentou amenizar o clima:

— Dante, talvez você não saiba, mas Quezia é a nossa aluna mais brilhante. Ela foi admitida na faculdade por meio de um processo de seleção especial. Ela é incrível!

Ao ouvir a expressão "seleção especial", senti uma pontada de amargura. Oito anos atrás, por causa de uma única frase de Dante, escolhi seguir o mesmo curso de medicina que ele. Desde então, dediquei-me completamente aos estudos. Mas agora, oito anos depois, éramos apenas estranhos que se conheciam bem demais.

Dante soltou uma leve risada irônica. Sua voz, indiferente, chegou aos meus ouvidos:

— Melhor que o seu Dante?

Ele enfatizou o "seu Dante" com um tom sutil, mas cheio de arrogância.

Ele tinha o direito de falar assim. Dante era um aluno prodígio, e, ainda jovem, já havia conquistado a posição de vice-chefe do departamento de neurocirurgia no competitivo Hospital Dona Presidente, tornando-se um exemplo para os estudantes mais novos.

Eu, por outro lado, era apenas uma aluna esforçada, sem nenhuma habilidade especial.

Liz também sabia disso. Olhou para mim e depois para Dante, tentando se justificar com cuidado:

— Dante, será que eu disse algo errado...?

Antes que ela pudesse terminar, o dedo de Dante, longo e perfeito, pousou inesperadamente no chapéu de aniversário que Liz usava, empurrando-o levemente para baixo. O gesto foi tão carinhoso que não deixou dúvidas sobre seu significado.

O som de vozes animadas e brincadeiras encheu a sala. O ambiente estava repleto de risos e uma energia vibrante, mas meu coração afundava lentamente, como se estivesse sendo arrastado para o fundo do oceano.

Foi naquele momento que percebi algo que nunca havia notado antes. O homem que eu persegui por oito anos, meu marido, tinha um lado divertido e encantador que eu nunca conhecera.

Ele lembrou-se do aniversário dela e enfrentou o frio do início do inverno para estar ali. Mas ele não se lembrou que, naquele mesmo dia, era também o aniversário de sua esposa. Meu aniversário.