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Capítulo 2

Author: Perara
Eu saí da festa mais cedo, em meio às risadas e vozes animadas. Quando cheguei em casa, já era tarde da noite. Lá fora, começou a chover em algum momento, e o vapor úmido condensou-se em uma fina camada de neblina na janela. Refletida no vidro, vi minha própria silhueta, solitária e melancólica.

A casa era grande. Do lado de fora, havia uma vista deslumbrante do rio. O apartamento, um andar inteiro sem vizinhos, estava localizado em uma das áreas mais caras de Cidade Quilemba. Era o tipo de lar com que muitas pessoas sonhavam. Mas, dentro desse espaço luxuoso e confortável, eu vivia sozinha a maior parte do tempo.

O ponteiro do relógio passou silenciosamente da meia-noite. Eu sabia que Dante, mais uma vez, não voltaria para casa naquela noite.

O som inesperado da porta se abrindo quebrou o silêncio. Olhei na direção do barulho e vi Dante entrando, cambaleando. Para minha surpresa, ele havia bebido. Antes que eu pudesse reagir, senti os braços firmes do homem ao redor da minha cintura. Ele não me deu tempo de pensar e pressionou todo o peso do corpo sobre mim. A sensação era avassaladora.

Dei dois passos para trás, mas fui encurralada contra a janela panorâmica. O cheiro fresco de cedro misturado com a fragrância única de Dante invadiu minhas narinas, aquecendo meu peito em uma onda de inquietação.

— Dr. Dante está com fome? — Perguntei, com um tom de sarcasmo que escondia minha mágoa.

Se eu fosse contabilizar bem, já fazia mais de seis meses desde que tínhamos feito amor. E agora, de repente, ele estava tão interessado. A razão disso era óbvia.

— Tanto tempo sem fazer nada… Não sentiu minha falta? — Ele perguntou, com a voz baixa, enquanto seu hálito quente acariciava minha orelha, provocando uma sensação de formigamento.

Minha mente foi inundada por memórias de nossa lua de mel, quando este homem, que parecia sempre tão contido e educado, revelou um lado completamente diferente na cama. Meu ímpeto de resistir enfraqueceu.

Dante aproveitou a oportunidade. Com uma mão, segurou meu rosto, forçando-me a encará-lo, e invadiu meus lábios de forma possessiva e dominante. Quando percebeu que eu não respondia ao beijo, murmurou entre as investidas:

— Zia, seja boazinha.

Os beijos dele eram intensos e urgentes, completamente diferentes de sua postura habitual, que sempre exalava controle. Havia uma necessidade crua e quase desesperada em sua voz, misturada com uma doçura que me fez sentir, ainda que por um momento, como se eu fosse amada.

Mas como poderia acreditar nisso? Ele nem mesmo se lembrava do meu aniversário.

— Concentre-se. — Ele sussurrou, enquanto aprofundava o beijo. Sua respiração pesada preenchia o silêncio ao nosso redor. — Me abrace.

Vi nossas sombras refletidas na janela. Elas se misturavam, indistintas.

Depois, como de costume, ele voltou a ser o homem frio e distante.

Quando saí do banheiro, já vestida, vi Dante parado perto da janela, falando ao telefone. Ele havia trocado de roupa e agora usava um terno impecável: camisa branca, calça social bem ajustada, ombros largos, cintura fina. Ele parecia imponente e refinado. Sua voz estava tão firme e controlada quanto sempre.

— Minha sogra, não se preocupe. Já incluímos a questão do filho nos planos.

Era minha mãe, Laura Auth, do outro lado da linha. Ela sempre liderou a campanha para nos fazer ter um filho, sem se importar com horário ou circunstância.

Filho? Ele tinha planos de ter um filho?

Enquanto eu tentava processar o que acabara de ouvir, Dante levantou o olhar e nossos olhos se encontraram. Foi apenas um instante, mas eu pude ver claramente o desprezo em seu olhar.

Poucos segundos depois, ele encerrou a ligação.

Ficamos nos encarando, um de cada lado do quarto. Eu me preparava para me desculpar por minha mãe ter ligado para ele, mas ele falou primeiro:

— Amanhã de manhã tenho uma reunião no hospital. Vou voltar para o trabalho agora. Além disso…

Ele fez uma pausa, desviou o olhar para a penteadeira e continuou em um tom frio:

— Não se esqueça de tomar o remédio.

Dante saiu do quarto logo em seguida. Só então percebi o que ele quis dizer. Olhei para a penteadeira e vi uma embalagem de pílulas anticoncepcionais.

Meu coração parou por um instante. Depois, começou a bater com força, enviando uma onda de calor ao meu rosto, fazendo meus olhos arderem.

Eu deveria ter previsto isso. Dante, que foi forçado a se casar comigo, jamais permitiria que eu engravidasse de um filho da família Lima.

Além disso, faltavam apenas três meses para o fim do nosso contrato de casamento de três anos.
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