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Capítulo 3

Author: Doce Felina
Quando o desejo finalmente se acalmou, já era madrugada. Ícaro saiu do banheiro, sentou-se no sofá e acendeu um cigarro com toda a tranquilidade do mundo.

A fumaça fina desenhava o rosto dele, austero e bonito. Eu fiquei encarando, meio perdida, até que ele me trouxe de volta à realidade com a próxima frase.

— Você tem que se divorciar.

Por um segundo, achei que tivesse ouvido errado. Ele percebeu meu espanto, a expressão de incredulidade no meu rosto. Apagou o cigarro e, com aquele jeito autoritário, começou a me dar lição de moral.

— Esse divórcio vai acontecer, é questão de tempo.

Por que ele falava como se tivesse certeza? Para ele, eu não passava de distração, companhia de uma noite. Eu e o Tiago é que tínhamos uma história de verdade. Ou será que Ícaro queria algo a mais?

Ele percebeu o que se passava na minha cabeça e, com um tom de desdém, não hesitou em esclarecer.

— Não se iluda. Eu nunca vou casar com você. Só acho que fica mais conveniente assim.

Mais conveniente? Não consegui segurar a pergunta.

Afinal, entre nós só havia um caso rápido, algo pra ser esquecido. Por que ele queria se meter no meu casamento?

— Sr. Ícaro, esse cargo de assistente nem vai durar muito. Não precisa se preocupar com detalhes assim.

Minha postura deixava claro que eu sabia me posicionar. Não importava quem ele era, ele não tinha poder pra controlar minha vida fora dali.

Ícaro sorriu de lado, com aquela voz preguiçosa e cheia de ironia.

— Você tem razão. Eu realmente sou alguém que repara nos detalhes.

Ele pegou a taça de vinho, bebeu um gole. O movimento do pescoço dele, o som leve enquanto engolia, me lembrou nossos beijos intensos. Meu rosto esquentou sem que eu percebesse.

— Eu nunca pensei em me divorciar. — Respondi baixinho.

Ele me olhou com calma, depois fez um gesto com o dedo, me chamando.

Mesmo sem vontade, vesti o roupão e fui até ele.

Ícaro segurou minha mão, me sentou no colo dele e abriu o decote do meu roupão. Instintivamente, cobri o corpo com as mãos, morrendo de vergonha.

— Você acha mesmo que tem um marido que te ama sem limites e um casamento fiel?

Ele me deixou sem resposta. Continuou a brincar com meus cabelos, os dedos contornando minha orelha vermelha. Eu não consegui reagir.

Ele não parou.

— Não seja ingênua. Chegar na sua idade e ainda acreditar em conto de fadas é burrice. Quem ama de verdade entregaria a mulher pra outro homem?

Minha boca se abriu, pronta pra rebater, mas não encontrei argumento. Ainda assim, respondi teimosa:

— Você não pode mandar na minha vida.

— Não posso? — Ele deu uma risada curta, pelo nariz, que me deixou ainda mais nervosa. Eu era só um brinquedo nas mãos dele.

Ele encostou a taça nos meus lábios e eu bebi o vinho de uma vez.

Quando ele segurou o copo junto comigo, disse algo que me deixou ainda mais desconfortável.

— A vida que você tem agora fui eu quem dei. Se eu quiser que você mantenha, vai manter. Se eu quiser que você largue, você larga.

Era verdade. A promoção do Tiago, a dívida dos meus pais, tudo estava nas mãos dele. Eu não tinha escolha.

Ícaro me olhou com atenção e perguntou:

— Você acha mesmo que pode depender dele pra sempre?

Todas as oportunidades vieram do Ícaro. Até o Tiago dependia dele. Como eu poderia confiar eternamente no Tiago?

Respondi, contrariada:

— Também não posso depender de você pra sempre. Mas enquanto eu não desistir do meu casamento, o Tiago também não vai desistir de mim.

Ícaro balançou a cabeça, como se debochasse da minha certeza.

Com o pouco de coragem que restava, quis provar que Tiago me amava, que tudo que eu fazia era por esse sentimento. Olhei firme pra ele:

— Sr. Ícaro, eu sei bem meu lugar aqui. Vim porque quis, não porque ele me forçou. Ninguém me entregou pra ninguém.

No fim, nem eu acreditei muito no que dizia. Ele riu, baixo, mas foi como se desse um tapa na minha cara.

— Haha.

O riso dele foi leve, mas me feriu fundo.

Esse homem era insuportável. Não precisava dizer nada; só a presença dele já me fazia sentir vergonha.

Ícaro passou a mão no meu rosto, com aquele olhar de quem observa o circo pegar fogo.

— A vida ensina mais do que qualquer pessoa, Yasmin.

Pisquei, tentando entender a mensagem por trás das palavras dele. Fiquei inquieta — será que algo ruim ia acontecer com o Tiago?

Perguntei, aflita:

— Você prometeu que faria o Tiago subir pra gerente regional.

A mão de Ícaro escorregou até meu pescoço, segurou meu queixo com firmeza.

— O que eu prometo, eu cumpro. Mas lembre-se: enquanto estiver comigo, não quero você pensando em outro homem.

Senti o peso do aviso.

— Eu entendi.

Ícaro olhou as horas.

— Vai dormir. Amanhã vamos encontrar um cliente. À noite, quero você comigo num jantar.

— Tá bom.

Eu só não imaginava que, no jantar de amanhã, eu mesma seria servida como prato principal naquela mesa.

Na manhã seguinte, Júlia já me esperava lá embaixo. Quando ela viu eu e Ícaro descendo juntos, manteve o sorriso no rosto, mas o olhar que lançou pra mim parecia uma faca.

Cada passo que eu dava me fazia lembrar da noite anterior. Antes mesmo do café, ele me tomou mais uma vez, dessa vez ainda mais intenso. No banho, vi que tinha ficado até machucada, então andava devagar, atrás dele.

Júlia percebeu na hora. O olhar dela deslizou descarado entre minhas pernas e ela soltou, cheia de veneno:

— Yasmin, se não estiver se sentindo bem, pode voltar pro quarto e descansar. Hoje o dia vai ser só de negócios, eu posso acompanhar o Sr. Ícaro.

Era verdade que eu não participava de nada importante nos negócios. Na prática, meu trabalho era só acompanhar o Ícaro, mas ouvir isso dela, cheia de insinuações, me deixou irritada.

— Júlia, obrigada pela preocupação. Mas está tudo certo comigo.

Fiz questão de ser a primeira a entrar no carro e sentei no lugar que seria dela, só pra mostrar quem mandava.

Ela veio até meu lado, mas por causa do Ícaro, não pôde reclamar. Sentou atrás dele, me fulminando com o olhar.

— Sr. Ícaro. — Júlia se inclinou pra frente, colocando a mão no encosto do banco. — O presidente da Tecnofly, Davi Siqueira, marcou jantar hoje no Clube Bellavista. Ele vai levar a esposa também, só fiquei sabendo agora. Já deixei um presente preparado, está no meu carro.

Ícaro não tirou os olhos do celular.

— Me manda a nota, peço pra financeira te reembolsar.

Eu sabia que, nesses encontros, se a esposa do cliente vai junto, é de bom tom levar um presente à altura, como manda a etiqueta.

— Não precisa reembolso. — Respondeu Júlia, toda íntima. — A esposa do Davi é minha colega de faculdade, faz tempo que não nos vemos. Ela é muito reservada, só aceita se for de mim.

Pela conversa, já estava claro que ela não ia abrir mão de ir ao jantar.

Ícaro apenas assentiu, deixando subentendido que ela estava liberada.

Pelo canto do olho, percebi a satisfação dela. Júlia parecia pronta pra me deixar de fora daquela noite.

Mas, no fim do expediente, Ícaro mandou entregar no meu quarto um vestido preto justo e elegante, junto com um par de saltos de couro de cordeiro.

O couro era preto, o solado vermelho, e só de experimentar aquele salto, senti uma força selvagem subir pelas pernas.

Me olhei no espelho. Tirei o batom chamativo, passei um mais suave, queria parecer mais acessível.

Tinha acabado de me arrumar quando a porta se abriu. Ícaro tinha meu cartão do quarto.

Ele se aproximou por trás, nossos olhos se encontraram pelo espelho. Ele passou a mão na minha cintura, beijou meu pescoço e foi subindo devagar, até tocar meus seios com delicadeza, mas cheio de desejo.

Quando ele levantou minha saia, eu me assustei, mas o corpo não resistiu. Eu até protestei dizendo que estávamos atrasados, mas cada parte de mim já respondia a ele.

Ele me pressionou contra o espelho, me tomou ali mesmo. Eu pude ver tudo acontecendo, e permiti.

Foi intenso, louco, quase surreal.

Só quando ele ajeitou minha saia e pediu pra eu me recompor, entendi que era hora de ir.

...

No Clube Bellavista, um clube privado luxuoso, entrei no salão ao lado de Ícaro.

Júlia já estava lá, coberta de joias, posando como se fosse a dona do lugar. Ela pegou o paletó de Ícaro, pendurou com todo cuidado e, com um sorriso falso, pediu:

— Yasmin, pode servir as bebidas pra gente?

Ela logo se sentou ao lado de Ícaro, os dois conversando animados sobre o jantar com Davi. Eu fiquei de pé, do lado, igual a uma garçonete.
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