Capítulo 3

Olhei para a palma da minha mão, ensanguentada e em carne viva, e, de repente, soltei uma risada.

Ignácio sentiu uma estranha inquietação no peito, e um traço de pânico apareceu em seu rosto.

— Do que você está rindo?

Ri de mim mesma, da minha estupidez, por ter me ferido tantas vezes em busca do amor superficial e tolo dos meus pais e de Ignácio.

Bastava Célia fingir-se de coitada, que mesmo eu sendo filha deles, a noiva que cresceu ao lado dele, eles confiavam cegamente em Célia.

Com as armações de Célia, tornei-me, aos olhos deles, uma irmã má e invejosa, que a maltratava e roubava seus méritos.

Cerrei o punho, as unhas cravando na carne, ergui os olhos marejados para Ignácio:

— Eu não errei. Não vou pedir desculpas.

As pupilas de Ignácio se contraíram, sentiu-se ferido pela obstinação que encontrou no meu olhar.

— Ignácio... — Célia começou a soluçar. — Minha mão está doendo tanto...

Ignácio não hesitou e imediatamente virou-se para envolver Célia em seus braços.

Com medo de que Célia sentisse frio, voltou ao carro para pegar um casaco de pele de raposa, envolvendo-a cuidadosamente.

Ao ver aquele casaco, senti uma forte pontada no peito.

Era feito das minhas oito caudas arrancadas.

Antes, para incriminar-me, Célia não hesitava em arriscar a própria vida.

E eu, como Raposa de Nove Caudas, cada cauda representava uma vida. Sob a pressão de Ignácio, arranquei oito caudas para salvar Célia.

E mesmo assim, não foi suficiente. No dia em que Célia ganhou o prêmio usando minha poção, ela comentou, de maneira sugestiva, que sentia frio. Ignácio logo transformou minhas oito caudas arrancadas num casaco para celebrar a vitória dela.

Célia, notando meu olhar, acariciou com orgulho a pele do casaco e se encolheu no abraço de Ignácio, choramingando de dor.

A última compaixão que restava nos olhos de Ignácio se transformou em desprezo por mim. Ele falou friamente:

— Se não se ajoelhar e pedir desculpas à Célia, não pense em entrar na minha casa. Quero ver até quando você vai ser orgulhosa!

Dei um sorriso irônico. Ele certamente se decepcionaria.

Em dois dias, eu substituiria Célia e me casaria com o jovem líder da Tribo Serpente.

Foi então que um carro desgovernado avançou em nossa direção.

A Tribo Lobo era conhecida por sua força e velocidade; Ignácio rapidamente se semi-transformou em lobo e protegeu Célia, correndo com ela para um local seguro.

Enquanto corria, esbarrou em mim, que estava mais perto do carro, e caí com uma dor aguda na perna, provavelmente torci o tornozelo.

O carro vinha em minha direção. Fechei os olhos, desesperada.

No último instante, caí nos braços de alguém quente e acolhedor.

Um homem mascarado com uma máscara de couro me carregou e escapou da cena, ainda mais rápido que Ignácio.

Abri os olhos e encontrei um par de olhos verde-esmeralda, imediatamente me lembrei das esmeraldas nos botões de punho.

O homem me colocou num banco à beira da rua e desapareceu antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.

Instintivamente, levei a mão ao bolso e encontrei uma caixa de pomada para queimaduras que não estava ali antes.

Olhei para Ignácio, que, do outro lado da rua, consolava Célia com carinho, e esbocei um sorriso frio.

Imediatamente, peguei do bolso o anel do Pacto de Almas que pretendia devolver e o joguei sem hesitar no bueiro.

Dois dias depois, vestida com um vestido de noiva sob medida enviado pela Tribo Serpente, olhei para o quarto cheio de dotes valiosíssimos e me senti estranhamente atordoada.

Meus pais se aproximaram, hesitantes, perguntando se eu poderia evitar que Célia admitisse publicamente o roubo da poção, sugerindo dizer que fora um mal-entendido, para poupar a reputação dela.

A última ilusão que eu tinha em relação a eles se desfez completamente.

Até o enxoval do casamento fui eu mesma que preparei. Eu já tinha inventado inúmeras desculpas para eles em meu coração.

Dizia a mim mesma que eles apenas haviam esquecido.

Mas eles esqueceram de preparar meu enxoval, embora tivessem lembrado de pedir por sua boa filha.

— Não! Se não, não me casarei. Quero ver se a Tribo Serpente vai aceitar isso numa boa!

Recusei sem hesitar.

— Você...

De repente, uma agitação irrompeu no salão lá embaixo.

Ao descer, vi Ignácio sentado com arrogância no lugar principal do salão, segurando o mesmo ferro de marcar de antes.

— Paloma, faltam 30 minutos para o sistema te designar a um Bestial errante. Se você conseguir se ajoelhar e bater a cabeça para Célia 1800 vezes nesses 30 minutos, talvez eu aceite te marcar com essa Marca de Escravo Bestial.

Ao ver meu vestido de noiva, ele ficou surpreso por um segundo, mas logo franziu a testa profundamente.

— Por que está vestida assim? Quer roubar a cena da Célia como uma Escrava Bestial vestida desse jeito?

Olhei friamente para ele:

— Ignácio, estou prestes a completar o Pacto de Almas com outra pessoa. E vocês... não foram convidados.

— Deixe de teimosia! Já se passaram dois minutos, agora você terá que bater a cabeça 3600 vezes se quiser ser minha Escrava Bestial. Aproveite essa oportunidade. Se não o fizer, não me importo de chamar alguém para te ajudar!

Ao dizer isso, estalou os dedos e alguns assistentes apareceram, prontos para puxar minhas roupas e me forçar a ajoelhar e bater a cabeça diante de todos.

— Não... Ignácio, já disse que hoje é o dia do meu Pacto de Almas...

Enquanto eu lutava, uma risada baixa soou atrás de mim, e um homem alto e esguio se aproximou calmamente.

— Quero ver quem tem coragem de obrigar a minha esposa a se ajoelhar!