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Capítulo 3

Author: Eloy Guedes
— Juliana, você ficou louca?!

Wagner reagiu de forma exaltada, empurrando-me com ainda mais força.

Minha nuca bateu com força no degrau, e a dor intensa me deixou tonta, tudo girando diante dos meus olhos.

Ouvi as palavras ríspidas de Wagner ecoando alto.

— Juliana, você gosta tanto assim de humilhar os outros?!

— Ficar no mesmo ambiente que uma mulher como você deixa o ar desta casa irrespirável, me dá nojo!

Aguentei a dor e tentei interromper o rumo cada vez mais ofensivo das suas palavras.

— Eu vou me mudar, pode ficar tranquilo.

— É bom mesmo que cumpra o que está dizendo.

Toda a raiva de Wagner parecia presa em sua garganta.

Ele me encarou, furioso, e por fim pegou Clarinda nos braços e se afastou, indo embora.

Enquanto passava a mão na parte de trás da cabeça, sentindo o sangue pegajoso, uma lembrança me veio à mente sem motivo aparente.

Quando eu tinha quinze anos, minha relação com Wagner estava longe de ser tão tensa quanto agora.

Por saber desde cedo do nosso casamento arranjado, por saber que um dia seríamos realmente uma família,

eu vivia grudada nele.

Ele era rebelde, saía escondido para jogar no computador, e eu sempre o seguia.

Depois, por causa de um desentendimento relacionado ao jogo, ele acabou brigando com outro rapaz.

Tentei apartar a briga, mas acabei sendo ferida sem querer, cortando o dedo.

Naquele momento, Wagner parecia uma fera selvagem.

Bateu no homem, que era bem maior que ele, até que o outro pedisse clemência.

Aquele mesmo Wagner, que antes ficava apavorado até quando eu me machucava de leve, hoje era capaz de me ferir e me insultar, tudo por causa de outra mulher, sem se importar com o certo ou o errado.

Mas agora isso já não importava mais.

Quando Guilherme e Lídia voltassem, meu noivado com Wagner poderia ser desfeito.

Olhei para a empregada ao lado, forçando um sorriso apesar da dor.

— Pode me levar ao hospital? Eu posso te pagar.

A jovem empregada recém-contratada hesitou, mas antes que pudesse se aproximar, a empregada mais velha a puxou para trás bruscamente.

Mesmo falando baixo de propósito, não pude deixar de ouvir a conversa delas.

— Você está louca!

— Não sabe que o Sr. Rocha detesta a Srta. Campos?

— Se ele te ver fazendo isso, pode dar adeus ao emprego!

A jovem ficou assustada, olhou para mim uma última vez e saiu correndo.

Balancei a cabeça, rindo amargamente, e fui até o canto pegar meu celular, que estava com a tela quebrada.

Guilherme e Lídia passavam a maior parte do tempo fora.

Só ficavam em casa três ou quatro dias por mês.

Wagner era o único dono da casa, e já tinha dito mais de uma vez:

Eu não fazia parte da família Rocha, e precisava resolver meus próprios problemas.

Por isso, ninguém ousava se aproximar de mim.

Sempre que eu chegava em casa mais tarde, até as sobras de comida eram jogadas no lixo.

Os pratos na mesa estavam sempre vazios.

Felizmente, já me acostumara com isso.

Fiz um esforço e fui ao hospital.

O médico disse que eu estava com concussão.

Pediu que eu ficasse em observação por dois dias.

Ao receber alta, voltei à casa da família Rocha para juntar minhas coisas.

As empregadas observavam friamente enquanto eu arrumava tudo sozinha, de maneira desajeitada.

Naquela mesma tarde, terminei de empacotar todos os meus pertences e os levei para um apartamento que aluguei às pressas.

Era apenas um lugar provisório.

Quando recebesse meu diploma, conseguisse um emprego e rompesse o noivado, eu poderia me afastar de tudo aquilo.

No terceiro dia depois de sair da família Rocha, Wagner me ligou, com a voz perceptivelmente embriagada.

— Onde você está?

— Sala A12, venha aqui.

Eu estava ocupada escrevendo meu currículo e fiquei um pouco irritada por ter sido interrompida.

— Wagner, o que você quer?

Do outro lado da linha, ele pareceu ficar em silêncio.

Até o barulho ao redor ficou mais baixo.

Como não obtive resposta, me preparei para desligar.

De repente, Wagner falou:

— Juliana, onde você está?

Continuei escrevendo o currículo e deixei o celular de lado, respondendo de forma distraída.

— Você não disse que o ar ficava insuportável comigo na mesma casa? Por isso me mudei.

— Fique tranquilo, não vou mais voltar.

A respiração do homem ficou mais pesada e ele soltou uma risada fria.

— Juliana, desde quando você ficou tão obediente?

— Não era você que vivia atrás de mim, insistindo em tudo?

— Já que está tão obediente, se eu mandar você sair desta cidade, desaparecer da minha vida, você vai mesmo embora!?

— Juliana, não sei que joguinho você está querendo fazer, mas se continuar mexendo com a Clarinda, vai se arrepender!

O mouse estava difícil de controlar, e eu fiquei olhando para a tela, digitando.

Só depois de um tempo percebi o teor das palavras de Wagner.

O tom sarcástico dele soou de novo.

— E aí, ficou sem palavras?

— Sempre tão dramática, não acha cansativo?

— Se pedir desculpas à Clarinda, deixo você voltar.

Falei calmamente:

— Está bem, Wagner, eu prometo, vou embora.

Assim que terminei, desliguei o telefone sem esperar sua resposta.
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