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Capítulo 5

Author: Nina Prado
Depois de alguns dias de repouso, Cristiane finalmente recebeu alta.

Nunca gostara do cheiro de desinfetante dos hospitais.

Vitória estava em viagem a trabalho, então mandou apenas o motorista para buscá-la.

Ainda frágil, mas firme, Cristiane voltou para o apartamento que comprara antes do casamento. Não era grande, mas cada canto carregava a marca dela. Ali havia segurança, ali era seu verdadeiro refúgio.

A casa estava impecável, sempre bem cuidada. O ambiente era limpo, aconchegante. Até as flores frescas sobre a mesa pareciam recebê-la de volta.

O edifício situava-se na área mais valorizada da cidade, um pedaço de ouro por metro quadrado. Da varanda, tinha-se uma vista privilegiada: ao erguer os olhos, avistava-se a imponente torre de oitenta andares do Grupo Carvalho, erguendo-se como um gigante no coração da metrópole.

Antes do casamento, costumava ficar ali, olhando para o horizonte. Havia um motivo simples: naquela torre estava o homem que ocupava seus pensamentos.

Agora, seus olhos frios refletiam apenas indiferença. Tudo ficara para trás. Estava pronta para começar uma nova vida.

Deu alguns passos para dentro e puxou as cortinas, fechando a vista.

Uma dor aguda latejou em seu ventre. Era como um lembrete cruel do que havia perdido, uma vida que jamais veria a luz do dia.

Cristiane respirou fundo, sacudiu a cabeça, tentando expulsar a tristeza.

Não podia se afundar em dor. Havia algo mais importante a fazer.

Abriu o notebook que estava parado há semanas. A tela iluminou-se. Entre as mensagens do e-mail, uma em especial chamava atenção: marcada com estrela, ainda não lida.

Clicou.

Leu rapidamente, os olhos ficando cada vez mais gélidos.

Digitou poucas palavras no teclado:

[Então sigamos com o plano.]

Enviou.

Fechou o computador num gesto seco. A mulher frágil que estivera no hospital parecia ter desaparecido.

Pegou os comprimidos prescritos pelo médico, engoliu-os com um gole de água. O gosto amargo se espalhou pela boca, mas ela não pareceu sentir.

O cansaço tomou conta. Deitou-se na cama macia, deixando o corpo render-se ao sono profundo.

No cair da tarde, no escritório presidencial do Grupo Carvalho.

O assistente, Wellington, entrou com um relatório.

— Sr. Henrique, a Sra. Cristiane recebeu alta hoje. Não voltou para a Chácara Paraíso. Mudou-se direto para um apartamento em seu nome.

Henrique revisava documentos. Ao ouvir, a caneta parou por um segundo. Apenas um segundo.

— Hm. — O som curto não denunciava nenhuma emoção.

Ergueu os olhos. O olhar escuro parecia uma tinta que não se dissolvia.

— Onde ela mora não me diz respeito.

Desde o início, nunca dividiram o mesmo teto. Encontravam-se apenas uma ou duas vezes por mês. Quem diria que, no futuro, seria ele quem não pararia de bater à porta do apartamento dela, repetidas vezes.

Wellington ficou em silêncio. O ar no ambiente parecia ter ficado alguns graus mais frio.

Henrique largou os documentos assinados de lado, a voz fria como se comentasse o clima:

— Entregue o acordo de divórcio para ela. Quero que assine o quanto antes.

— Sim, Sr. Henrique. — Wellington respondeu com respeito, mas não conseguiu evitar o suspiro em silêncio.

No fundo, lamentava por aquela esposa que nunca recebera um mínimo de carinho verdadeiro do marido. Parecia mesmo o fim da linha.

Henrique voltou os olhos para a tela do computador, números piscando diante dele. Era como se o assunto fosse apenas mais um contrato sem importância.

Apenas a pressão nos dedos denunciava o contrário: os nós estavam esbranquiçados de tanto segurar a caneta.

Ele não percebia, mas quanto mais frio se mostrava agora... Mais doeria depois, quando a verdade viesse à tona.

A porta se abriu.

Maria entrou, radiante.

Wellington apanhou discretamente a pasta do divórcio e se retirou.

Ela estava deslumbrante, como sempre, impecável em cada detalhe, afinal, era a estrela do momento.

E naquele dia, a felicidade transbordava. Mal podia acreditar na sorte: o quarto do Hospital São José onde Henrique aparecera... Era justamente o de Cristiane. E mais: ela descobrira que a mulher perdera o bebê.

Um riso venenoso quase lhe escapou.

"Pobrezinha… Nem para manter uma gravidez ela serve. O bebê se perdeu sozinho, sem que eu precisasse fazer nada. É a própria sorte ao meu favor.

Nem a televisão ousaria escrever um drama tão perfeito.

Sem criança, Cristiane jamais permanecerá ao lado de Rick."

E o melhor? Henrique ainda não sabia da notícia. Isso lhe daria espaço para brilhar ainda mais.

— Você por aqui? — Perguntou Henrique, erguendo os olhos, e pela primeira vez, seu olhar suavizou, deixando transparecer um traço de ternura.

— Claro, vim jantar com você! — Maria sorriu doce, os olhos brilhando. — Quero aproveitar esse tempinho livre para ficar ao seu lado. Semana que vem começo a disputar uma vaga numa superprodução.

O sorriso dela era puro entusiasmo, impossível de disfarçar.

Henrique observou o ar feliz da atriz e, sem perceber, deixou os lábios curvarem-se em um leve sorriso.

— Se a nossa estrela Maria Mendes se interessou, com certeza não é projeto qualquer.

Ela não resistiu e revelou, vaidosa:

— Flor do Cerrado! É a novela mais comentada do momento. O papel principal será escolhido por votação online. Estou em segundo lugar.

O orgulho cintilava em cada palavra.

Henrique conhecia bem o projeto. No mês anterior, já dera início à compra da Aurora Entretenimento. O plano era simples: adquirir a empresa onde Maria estava contratada e colocá-la em suas mãos.

Nunca se interessara pelo mundo do entretenimento. Mas, para garantir o futuro dela, não hesitou em investir pesado.

Maria, porém, nada sabia. Ele queria fazer disso uma surpresa.

Henrique assentiu e segurou a mão delicada dela.

— Com o seu talento, vai alcançar o primeiro lugar.

Maria não perdeu tempo. Sentou-se em seu colo, enlaçando-lhe o pescoço com gesto mimado.

— Rick, é tão bom ter você... Sei que sempre esteve por trás, me apoiando. Obrigada por cuidar da minha carreira.

Henrique apertou de leve a bochecha dela, num gesto de carinho.

— O importante é que você esteja feliz.

Sim. Quatro anos antes, na Baía do Abismo, na França, ele teria morrido afogado se não fosse por ela ou, ao menos, assim acreditava.

Não sabia, contudo, que a mulher capaz de mergulhar tão fundo no mar... Não era a que agora estava em seus braços.

Henrique acreditava que Maria merecia o melhor que o mundo podia oferecer, inclusive o seu amor.

Ela apoiou a testa contra a dele, aproximando-se devagar para um beijo doce.

O hálito quente dele roçava sua pele. Ele não se afastou.

Mas, de repente, o toque do celular quebrou o momento.

Maria franziu o cenho, irritada.

Henrique riu baixo, pegou o telefone e atendeu. Do outro lado, Marcelo falava em tom animado:

— Rick! Alexandre voltou. E dizem que está jantando no Clube Jardim Imperial com um convidado misterioso. Você acha que... Poderia ser o N?

Henrique ficou surpreso por um instante. Em seguida, uma centelha brilhou em seus olhos.

— Estou a caminho.

Desligou.

Ficou em silêncio por alguns segundos, perdido em pensamentos.

Alexandre Martins era nada menos que o herdeiro de um dos maiores conglomerados da França além de ser o fundador do congresso médico internacional.

Quatro anos antes, ele e Henrique haviam se encontrado brevemente na França.

E agora, logo após o anúncio da presença de N, Alexandre surgia em segredo na Cidade N.

Por que escolher justamente essa cidade?

Henrique precisava descobrir. Custasse o que custasse, garantiria a parceria entre N e o Grupo Carvalho.

— Rick, aconteceu alguma coisa? — Maria perguntou, com um ar desconfiado.

Henrique afagou os cabelos sedosos dela, sorrindo de leve.

— Nada de importante. Vou te levar para comer algo especial.

Pegou o paletó, segurou a mão dela e juntos saíram do escritório.

O silêncio no apartamento foi quebrado pelo som insistente da campainha.

Cristiane despertou, ainda sonolenta.

Arrastou-se até a porta de chinelos, os passos lentos. Girou a maçaneta suavemente.

A porta se abriu.

E diante dela surgiu um homem.

Um rosto familiar, marcado agora por traços de maturidade e firmeza.
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