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Capítulo 4

Author: Nina Prado
Cristiane estava ali, deitada em silêncio.

A luz fria do hospital acentuava ainda mais a palidez do seu rosto. Aquela face que antes fora tão viva e luminosa agora parecia desprovida de cor. O pulso fino trazia a agulha do soro, de onde o líquido transparente pingava lentamente para dentro de seu corpo frágil.

Henrique sentiu um aperto no peito.

"Deve ser a gastrite de novo..."

Lembrava-se: ela sempre sofrera com esse problema. Já se internara outras vezes por causa disso.

Naquele instante, uma lembrança antiga ameaçou emergir. Ele balançou a cabeça, afastando os pensamentos. Seu olhar se fixou nos lábios pálidos dela.

Cristiane parecia inquieta, mesmo dormindo. A testa franzida, o corpo movendo-se de leve, como se buscasse algum alívio.

O cobertor escorregara para o lado.

Quase sem pensar, Henrique deu um passo à frente e estendeu a mão. Puxou o tecido suavemente, cobrindo o ombro descoberto dela.

A ponta dos dedos tocou por acaso a pele fria.

Ele estacou. Retratou a mão de imediato, como se tivesse tocado em brasa.

Só então percebeu o que acabara de fazer.

Um incômodo tomou conta dele, como se estivesse fora de si.

Olhou ao redor: o quarto era pequeno, comum, impregnado pelo cheiro de antisséptico. O andar era baixo, e o barulho da rua entrava facilmente pela janela.

Henrique franziu o cenho...

"Como ela poderia se recuperar num lugar desses?"

Pegou o celular e ligou para o assistente, a voz firme, sem espaço para réplica:

— Hospital São José. Quarto 302. Cristiane. Quero ela transferida imediatamente para a suíte VIP do último andar.

Do outro lado da linha, o assistente hesitou por um segundo, mas respondeu rápido:

— Sim, Sr. Henrique.

— E mais. Passe na Cantina Sabor & Tradição. Peça uma porção de coxinha de frango e uma tigela de canja de galinha. Tem que ser acabado de sair da cozinha, entendeu?

Era o prato favorito dela.

Ele mesmo não sabia por que lembrava disso com tanta clareza. Nem por que dera essa ordem sem pensar.

Talvez... Apenas não quisesse vê-la tão miserável.

Sim. Era só isso.

— Entregue na suíte VIP.

— Certo, Sr. Henrique. Providenciarei agora mesmo.

Henrique desligou o telefone e lançou um último olhar para Cristiane. A testa dela parecia um pouco mais relaxada, como se o sono enfim tivesse encontrado algum alívio.

Ele pressionou os lábios, virou-se e saiu do quarto com passos firmes, carregando a frieza habitual.

Maria, agora com a mão enfaixada de branco, ainda sentia a raiva latejando por dentro. Assim que saiu da sala de curativos, avistou Henrique no final do corredor, emergindo de uma ala que... Parecia ser de enfermarias comuns.

O coração dela deu um pulo. No rosto, porém, abriu-se um sorriso doce, de fragilidade calculada. Correu até ele, enlaçando seu braço com delicadeza.

— Rick, onde você estava? Saí e não te vi, levei um susto. — Disse em tom mimoso.

De soslaio, Maria lançou um olhar rápido para a placa da porta atrás dele: 302.

Henrique desviou o olhar para a mão dela, ainda coberta de gaze. A voz soou neutra:

— Nada demais. Entrei no andar errado.

— No andar errado? — Maria piscou, com voz melosa. — Ai, Rick, você é mesmo um distraído... Até nisso se perde.

Mas, por dentro, um riso gelado brotava.

"Ele? O homem que nunca dá um passo em falso? Como poderia "se enganar de andar"?

Esse 302... Tinha algo escondido ali."

Henrique não respondeu. Apenas comentou:

— A mão ainda dói? Se já terminou, vou levá-la para casa.

— Um pouquinho só... Mas obrigada, Rick. — Maria respondeu com docilidade, enquanto gravava mentalmente o número do quarto.

"Quero ver quem é a descarada que o atraiu até aquele lugar."

Na mansão da família Mendes, as luzes brilhavam intensas.

Assim que entraram, Vanessa, mãe de Maria, correu até eles num teatro de preocupação.

— Ai, minha filha querida! O que aconteceu com a sua mão? Deixa a mamãe ver! — Agarrou os dedos enfaixados, com um olhar de dor exagerada. Mas os olhos, cheios de cálculo, não paravam de lançar sorrisos bajuladores para Henrique.

— Sr. Henrique, muito obrigada por cuidar da nossa Mia. Deve ter dado tanto trabalho!

Igor, o pai de Maria, logo se apressou a reforçar:

— Isso mesmo! O senhor foi atencioso demais. Se não fosse por você, essa menina já teria aprontado uma desgraça maior.

— Não foi nada. — Henrique respondeu sem emoção. Depois virou-se para Maria: — Use a pomada nos horários certos. Nada de molhar o curativo.

— Sim, Rick. Obrigada. — Maria respondeu num tom suave, obediente.

Henrique assentiu levemente e, sem intenção de ficar mais, anunciou:

— Tenho outros assuntos. Preciso ir.

Enquanto isso, no hospital, Cristiane despertava. A noite já caíra.

Um aroma delicioso invadira o quarto e a fizera abrir os olhos, ainda tonta. O estômago vazio reclamava, mas a dor aguda no corpo tinha diminuído.

Ao focar a visão, notou os recipientes sobre a mesa de cabeceira. Eram caixas térmicas elegantes.

E em uma delas estava o logotipo da Cantina Sabor & Tradição.

Coxinha de frango. Canja de galinha.

Cristiane piscou, confusa.

"Isso... Quem mandou?"

Instintivamente, pensou em Vitória. Mas logo descartou a hipótese: a amiga sabia que ela não podia comer aquelas coisas.

"Então... Seria ele?"

O nome surgiu em sua mente como um relâmpago. Recordava-se: uma vez, no Cantina Sabor & Tradição, pedira exatamente aqueles pratos e Henrique a vira.

De repente, sentiu um nó na garganta. Empurrou os recipientes para o lixo, sem sequer abrir.

Não queria dever nada àquele homem. Nem mesmo uma refeição.

A porta se abriu e uma enfermeira, de uniforme rosa, entrou sorrindo profissionalmente.

— Srta. Cristiane, acordou? Como está se sentindo?

— Melhor... Obrigada. — Respondeu, com a voz ainda fraca.

A enfermeira olhou para o cesto e arregalou os olhos.

— Ué, uma refeição tão boa dessas... Por que jogou fora? Ali tem micro-ondas, podia esquentar.

Os recipientes ainda estavam intactos, entregues há poucas horas.

— Já estragou. — Cristiane respondeu seca, com um duplo sentido que a enfermeira não entendeu.

Enquanto trocava o soro, a profissional comentou animada:

— Ah, e vamos transferi-la para outro quarto.

— Transferir? — Cristiane a encarou, surpresa. — Por quê?

— Arrumaram tudo lá em cima. A senhorita vai para a suíte VIP. Mais silêncio, mais conforto para a sua recuperação.

— VIP? — A descrença era tanta que sua voz quase tremeu. — Quem... Quem pediu isso?

A enfermeira manteve o sorriso treinado:

— Não sabemos. Só recebemos ordens. Pode ficar tranquila, já está tudo pronto.

Cristiane respirou fundo e balançou a cabeça.

— Não. Não vou sair daqui.

Primeiro, a comida misteriosa. Agora, o quarto de luxo. Quem mais poderia ser o responsável, além dele? Mas ela não queria esmolas. O estrago já estava feito.

Nesse momento, Vitória entrou com uma tigela fumegante de sopa e um buquê de flores nas mãos.

— Cris, já está se sentindo melhor? Tá com fome? Minha mãe mandou a canja caseira do amor. — Num piscar de olhos, notou o logotipo na caixa no lixo. — Cantina Sabor & Tradição? Desde quando eles entregam delivery?

— Não sei. — Cristiane respondeu fria. — De qualquer forma, não serve mais.

Vitória lhe piscou um olho malicioso.

— Deve ser algum admirador secreto... Eu já disse: o mundo tá cheio de peixe bom. Pra que insistir naquele traste?

Em algum lugar da cidade, Henrique espirrou de repente.

Vitória então se lembrou de algo, sentou-se na beira da cama com expressão séria.

— Espera aí. Você ainda internada e já anunciaram a sua volta?

— Volta? — Cristiane ficou confusa.

Vitória mostrou o celular. Nos cinco primeiros tópicos dos trending, só se falava de um nome: "N".

Em poucas horas, a notícia da presença de N no próximo congresso médico já incendiara a internet mundial.

O coração de Cristiane se apertou.

No mundo, apenas duas pessoas ousariam divulgar aquilo tão cedo.

Era ele.

O contrato de três anos mal havia terminado.

Esse louco não conseguiu esperar nem um único dia!
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