Capítulo 3

Aos olhos da família Fortuna, Talita voltar para casa significava que ela devia algo a Milena, porque Milena havia passado de filha legítima para adotiva por causa dela.

Mas nada disso foi escolha de Talita, não foi ela quem procurou a família Fortuna, foram eles que a encontraram.

Eles a levaram de volta para casa, mas não a tratavam bem.

Talita também achava tudo muito estranho. Se eles achavam Milena tão perfeita a ponto de substituir uma filha biológica, por que ainda foram atrás dela e a levaram de volta? Só para que ela assistisse de camarote ao carinho e favoritismo que davam a Milena?

O tom sarcástico nos olhos de Talita era evidente, e isso deixou Igor furioso. Com o rosto sombrio, ele disse:

— Se não fosse pela sua imprudência, aquilo não teria acontecido com a Milena.

— O que é "aquilo"? — Talita perguntou.

Milena imediatamente empalideceu, se intrometendo:

— Igor, hoje é o dia do retorno da minha irmã, não vamos falar do passado. Bru, você não disse que queria ver o meu avô? Vamos?

Bruno lançou um olhar profundo para Talita e, com a voz fria, perguntou:

— Você não vem?

Os olhos de Talita brilharam, ela respondeu quase por impulso:

— Eu vou.

Bruno assentiu levemente:

— Então vamos.

Talita se preparava para seguir, mas seu braço foi bruscamente agarrado por Igor. Ele apertou com tanta força que ela franziu o cenho de dor.

— Vai ver o vovô com essa aparência? Vai se queixar para ele de novo?

Ele soltou uma risada fria. Talita, no entanto, não achava que estava vestida de maneira inadequada, pelo menos estava limpa e arrumada. Mas em questões ligadas a ver o vovô, ela preferia não discutir com Igor.

— Eu não tenho roupas limpas.

Na prisão, só havia o uniforme, ela não tinha acesso às próprias roupas. A roupa que usava era a mesma de três anos atrás, então era normal que estivesse desbotada e desgastada pelo tempo.

O olhar de Igor se tornou complicado.

— Vem. — Disse ele, se virando para ir embora.

Talita o seguiu.

Depois de três anos, a mansão havia mudado muito, o que a fez se sentir deslocada. Ao chegarem no segundo andar, o rosto de Igor mostrou certa hesitação.

— Você ficou fora por três anos, então não tinha ninguém para usar o seu quarto. Por isso, transformaram em um closet para Milena.

Talita ficou um instante surpresa, mas assentiu, respondendo sem se importar muito:

— Entendi.

Mas aquela indiferença pareceu, aos olhos de Igor, uma afronta. Ele quis explodir, mas, sabendo que realmente haviam agido mal com Talita, se forçou a conter a raiva.

De cara emburrada, ele empurrou a porta. O closet ocupava o quarto inteiro, cabides com roupas de todos os estilos preenchiam os armários transparentes, como se fosse uma verdadeira loja de roupas do shopping. Era visível o quanto a família Fortuna mimava Milena.

Igor pegou um conjunto de roupas num canto e jogou para Talita.

— Essas são roupas que a Milena não gosta. Ela não gosta que toquem nas roupas dela, então você usa essas aí e não precisa devolver. Se não quiser, pode jogar fora.

Talita trocou de roupa. A blusa de lã ajustada ainda ficava um pouco folgada nela. Ela arrumou o básico e saiu do quarto.

— Já me troquei.

Igor lançou um olhar estranho para ela, depois disse:

— Vamos.

Talita ignorou o tom frio dele. Ela estava nervosa e feliz por finalmente poder ver o avô.

Igor caminhava rápido. Antes que Talita pudesse alcançá-lo, ele já tinha desaparecido.

Ela não se importou, já que sabia onde o avô estava. Com o coração ansioso, estava prestes a sair da mansão quando foi interrompida.

— Tali, você finalmente voltou. — Ao vê-la, os olhos de Karen Neves se encheram de lágrimas e sua voz falhou.

Ela tentou segurá-la pela mão, mas Talita recuou e evitou o toque.

A expressão de Karen ficou imediatamente rígida, tomada por uma tristeza.

— Tali, você está me culpando?

Talita não entendia por que ela perguntava aquilo. Ela não tinha o direito de culpá-los? Eles a mandaram para a prisão, onde ela sofreu horrores. Como poderia não culpá-los?

— Sra. Karen. — A voz de Talita estava rouca — Quero ver o avô.

Karen parecia ter levado um grande golpe. Ela cambaleou, dizendo:

— Tali, do que você me chamou? Você realmente ainda está me culpando...

As lágrimas de Karen caíram incessantemente. Mesmo chorando tanto, ainda era bela e elegante, mas, naquele momento, com um ar mais frágil.

Quando Talita retornou à família Fortuna, tinha gostado muito de Karen. Ela era bonita, sua classe e generosidade eram admiráveis. Quantas vezes desejou que Karen a tratasse como tratava Milena, com gentileza, com carinho...

E a única vez que Karen foi gentil com ela como era com Milena... Foi para mandá-la para a prisão no lugar da outra.

"Que piada!"

— Mamãe, por que você está chorando? — Milena apareceu apressada, cheia de preocupação. — Tali, se estiver com raiva, pode descontar em mim, mas não machuque mais a mamãe. Ela já sofre muito por sua causa, não come nem dorme direito, está cada vez mais abatida. Se você não se importa, eu me importo!

Assim como Karen, Milena estava com os olhos avermelhados.

Karen, vendo a filha que tanto mimava prestes a chorar, imediatamente segurou as próprias lágrimas, a confortando:

— Milena, a mamãe está bem. Não chore, senão vai inchar seus olhos.

— Mãe, é normal a Tali me culpar. Se não fosse por mim, ela teria todo o carinho de vocês. — Milena mordeu os lábios, quase chorando, parecendo frágil e digna de pena.

— A culpa não é sua, Milena. Não pense assim. — Karen a consolava pacientemente.

As duas, mãe e filha, pareciam um retrato de harmonia.