LOGINTrês anos depois da minha morte, meu marido finalmente se lembrou da minha existência. Acontece que a amiga de infância dele teve uma recaída de leucemia e precisava urgente de um transplante de medula. Ele foi lá em casa para me fazer assinar a doação, mas quando chegou, não achou ninguém. Preocupado, procurou os vizinhos e começou a perguntar insistentemente por mim. Uma vizinha olhou para ele com pena e disse: — Você está falando da Carina? Ela morreu tem anos! Mesmo doente, arrancaram a medula dela. Voltou do hospital acabada e não aguentou. Meu marido se recusou a acreditar. Estava convencido de que a vizinha mentia para ele. Ele ficou vermelho de raiva, virou para mulher e gritou: — Se ver ela, avisa: se não aparecer em 3 dias, não pago mais nada para o tratamento daquele bastardo que ela insistiu em criar. A vizinha só suspirou, balançou a cabeça e resmungou baixinho: — Coitada, mas a criança já morreu de fome faz tempo...
View MoreFelícia saiu com o rosto pálido, quase sem cor. Ela também parecia estar perdendo completamente a sanidade, alternando entre crises de choro e risos descontrolados.Enrico voltou para dentro de casa e começou a limpar com cuidado as urnas que continham minhas cinzas e as do nosso filho. Quase me esqueci de mencionar. Alguns dias atrás, ele foi ao crematório buscá-las. Estavam cobertas por uma espessa camada de poeira acumulada pelo tempo. Com um pano macio, foi removendo cada partícula de sujeira, como se estivesse cuidando de algo profundamente sagrado.Nos últimos dias, já não conseguia mais segurar nosso filho em meus braços etéreos. Ele finalmente estava livre das amarras terrenas e podia ir para onde quisesse. Mas eu ainda permanecia presa a Enrico e ao que havíamos deixado inacabado.Sabia que era hora de me despedir do meu pequeno.Naquela noite, depois de ele ter brincado o dia inteiro pelo quintal recém-cuidado, o envolvi com meus braços translúcidos. Lhe contei uma históri
Naquela noite, Enrico não foi embora. Dormiu no mesmo quarto onde eu e nosso filho costumávamos dormir. Eu não conseguia entender o que se passava na cabeça dele. Durante anos jamais se importou conosco, e agora encenava esse papel de homem arrependido? Para quem?Na manhã seguinte, ele dirigiu até a cidade e voltou com várias ferramentas de jardinagem. Mal chegou, arregaçou as mangas e começou a batalhar contra o mato alto que dominava o pátio.Era pleno julho, o auge do verão do país. O sol castigava sem dó, e não havia nem um sopro de vento para aliviar o calor sufocante. Mesmo assim, ele seguiu cortando o matagal e podando as rosas e hortênsias que haviam crescido selvagemente, como se fosse imune àqueles quase 40 graus.Quando a sede apertava, tomava um gole da água mineral. Quando a fome chegava, mordia um pedaço do pão duro que comprara na cidade. Dentro da casa, ele limpou cada canto com uma atenção meticulosa, removendo camadas de pó e sujeira acumuladas por três longos ano
Enrico desabou no sofá.Balançava a cabeça incessantemente, repetindo com voz embargada:— Não... Era impossível... Eu ainda nem tinha a perdoado... Como ela pôde morrer assim?Ri até as lágrimas escorrerem pelo meu rosto espectral.Então era por isso? Eu não podia partir daquele mundo porque ele, em sua arrogância, ainda não havia me concedido seu perdão?Com mãos trêmulas, ele pegou o celular do chão e abriu a galeria de fotos. Aquela única imagem... O único registro dele com nosso filho juntos. Enrico ficou olhando fixamente por um tempo que pareceu interminável, enquanto seus ombros começavam a tremer e lágrimas silenciosas caíam sobre a tela iluminada.De repente, ele se levantou num impulso e saiu de casa às pressas, quase correndo. As mãos ainda tremiam no volante enquanto dirigia. Pela segunda vez em poucos dias, estacionou em frente à casa onde eu e nosso filho morávamos. Em questão de dias, nos visitou mais vezes do que em todos os últimos anos juntos. Não sei se isso me cau
Enrico bloqueou o cartão adicional esperando que eu ligasse desesperada, implorando por ajuda. Mas, em vez disso, o que chegou primeiro foi o relatório do detetive particular que ele havia contratado.O detetive enviou uma série de arquivos por e-mail. Entre eles, algumas capturas de tela de um portal de notícias local com uma manchete alarmante: "Chocante! Mãe e filho são encontrados mortos em casa dias após o falecimento."A reportagem era curta e não mencionava o nome da vila, apenas o da cidadezinha próxima. Mas a foto anexada não deixava dúvidas. Era exatamente da casa onde eu morava. Enrico a reconheceu imediatamente.Ele ficou paralisado diante da tela, encarando aquelas palavras com descrença. Ele se recusava a acreditar no que via. Com as mãos trêmulas, pegou o celular e tentou me ligar, mas recebeu a mensagem de número inexistente. Tentou pelo WhatsApp, mas ninguém respondeu.De repente, como se uma ideia assustadora o atingisse, abriu o aplicativo do banco e acessou o ger






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