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Capítulo 7

Auteur: Doce Felina
— Eu... — Eu estava prestes a dizer que estava cansada, mas o celular foi desligado antes que eu pudesse terminar.

Tiago me olhou e perguntou:

— Hoje ainda tem compromisso com ele?

Eu balancei a cabeça:

— Não sei, ele não me explicou nada.

A comida mal tinha sido tocada, o clima entre nós finalmente estava leve, e eu não queria estragar aquele momento. Enquanto eu digitava pra recusar o convite do Ícaro, Tiago me interrompeu:

— Não faz isso não. Vai que ele quer falar de mim, da minha promoção.

Todo aquele instante de paz que eu tinha idealizado se despedaçou pela realidade.

— Tiago, será que você só pensa em promoção? Não está vendo que eu estou exausta? Eu não quero sair, só queria descansar em casa.

Tiago tentou acalmar meu ânimo, pegou na minha mão com carinho e disse baixinho:

— Meu amor, me desculpa, a culpa é toda minha, eu sou um fracasso. Se eu fosse melhor, você não teria que ficar se humilhando por aí. Mas você sabe como tá difícil pra nós... Não tenho outra saída.

Ele se posicionou atrás de mim, massageou meus ombros devagar e sussurrou no meu ouvido:

— O Sr. Ícaro te ligou pessoalmente, deve ser coisa séria. Se eu for promovido, prometo que vou segurar essa vaga de gerente e você não vai mais precisar passar por isso.

Na verdade, quando Ícaro me chamava, eu nunca tinha coragem de recusar. Não era nem pelo Tiago, mas sim porque ele tinha pago as dívidas da minha família. Eu devia muito ao Ícaro, não tinha direito de dizer não.

Tiago me empurrava ainda mais fundo numa culpa misturada com pena. Dizem que o sofrimento da mulher casada começa quando ela se ilude antes de casar. Eu achava que era esperta, mas no fim das contas, percebi que estava tão perdida quanto antes.

O carro parou em frente ao Alma do Sabor e, antes de eu descer, Tiago segurou minha mão.

— Meu amor, não esquece o mais importante.

O mais importante? Um homem que não podia ter filhos, mas insistia nisso, chegava a ser irônico.

Eu, irritada, perguntei:

— E como você quer que eu aproveite a chance, se ele sempre usa camisinha?

Tiago apontou para o meu broche e cochichou:

— Usa isso pra furar.

Fiquei sem palavras. Agora entendi porque ele insistiu tanto pra eu usar o broche.

Tiago, quase implorando, disse:

— Yasmin, minha vida é isso aqui. Se eu tiver um filho com você, vou ser o homem mais feliz do mundo. Não importa de quem seja, se for seu, eu vou amar como se fosse meu. Vai lá, Yasmin. Sei que é difícil.

Sempre que ele falava “sei que é difícil”, me dava uma certa repulsa.

Eu encarei Tiago e perguntei:

— Você realmente não se importa em criar um filho de outro homem?

Tiago abaixou a cabeça, todo derrotado:

— Meu amor, eu nem me sinto homem de verdade... Eu não consigo... Eu tenho vergonha de mim mesmo...

Ele começou a chorar, se agarrou a mim, e eu só sentia um aperto no peito.

— Pronto, para com isso. — Eu tentei consolar, passando a mão nas costas dele. — Fui eu que peguei pesado.

Qual homem aceitaria esse papel? No fundo eu entendia Tiago. Ele não ligava pra laço de sangue, era orgulho ferido. Preferia manter as aparências, mesmo que fosse às custas de um filho “emprestado”.

Antes de eu sair do carro, Tiago ainda me abraçou forte:

— Não esquece do principal, Yasmin.

O olhar ansioso dele deixava claro o quanto ele desejava que eu engravidasse.

Quando entrei no restaurante e abri a porta da sala reservada, vi Ícaro tomando café, me olhando de cima a baixo, como se me despisse com os olhos.

A roupa que Tiago escolheu pra mim era absurdamente curta, uma saia preta mínima. Quando tirei o casaco, minhas pernas ficaram à mostra. Eu mesma achei demais e tentei puxar a barra pra baixo, envergonhada.

Ao sentar, senti a mão de Ícaro pousar naturalmente na minha coxa.

— Como veio pra cá? — Ele perguntou.

Eu desviei o olhar:

— Vim de táxi.

Ícaro ergueu levemente as sobrancelhas, esperando a verdade.

Eu olhei pela janela, sabendo que, dali, dava pra ver perfeitamente o Tiago me deixando na porta do restaurante.

Abaixei os olhos:

— Foi ele que me trouxe.

— Você... — O tom dele era de quem se decepciona, mas vinha com uma gentileza inesperada.

Ícaro pegou a xícara e serviu café para mim também:

— Tá frio lá fora, toma um pouco pra se aquecer.

— Obrigada. — Eu tomei um gole devagar.

Ele foi direto ao ponto:

— E aí, já pensou no que te falei?

Eu fiquei confusa:

— Sobre o quê?

— Na saída do aeroporto. Eu falei pra você se separar.

— Ah... — Fui pega completamente de surpresa. — Sobre isso...

Eu fiquei sem palavras por um instante. Ele não me apressou. Olhei para a xícara na mesa, perdida nos meus pensamentos.

A xícara de porcelana branca parecia feita de jade, emitia um brilho suave e acolhedor, bem parecido com a sensação que ele transmitia: elegância, serenidade e força ao mesmo tempo.

Ele apoiou o braço no encosto da minha cadeira de forma casual e anunciou, sem rodeios:

— Amanhã você vai se divorciar do Tiago.

O tom dele não soava como um pedido, era uma ordem direta e cheia de autoridade.

— Sr. Ícaro, receio que não posso concordar com isso.

Pelo canto do olho, eu vi quando ele aproximou as pernas das minhas e inclinou o corpo em minha direção.

— Eu realmente não entendo. O que tem nele que te faz querer ficar?

Eu também não entendia o motivo da insistência dele nessa história de divórcio.

Tomei coragem e respondi:

— Sr. Ícaro, pra você eu sou só uma fase, como uma flor de primavera: bonita, mas passageira. Eu sei bem o meu lugar. Agora, você só não enjoou ainda, mas logo vai passar. Pra quê mexer tanto com minha vida? E se eu realmente me divorciar, vai ser cômodo pra você, porque eu ficaria livre pra te atender quando quisesse. Mas e eu? Além de carregar o estigma de mulher divorciada, nessa cidade eu não tenho família, não tenho ninguém. Foi o Tiago que me deu um lar, que cuidou de mim em cada detalhe. Eu não posso simplesmente abandonar ele.

Eu disse aquilo não porque esperava que Ícaro tivesse compaixão, mas porque queria lembrá-lo de que não podia, por um capricho, exigir que eu destruísse meu casamento.

A resposta não o surpreendeu. Ele manteve a expressão serena e, sem olhar pra mim, foi colocando mais água na minha xícara — tanto que a água começou a transbordar e ele nem se deu conta.

Eu o encarei, meio atordoada:

— Sr. Ícaro, a água...

Ele só comentou:

— As pessoas são como essa xícara. Existe um limite para o quanto podem aguentar.

Naquele instante, eu entendi que, aos olhos dele, eu era como aquela xícara — e que ele queria me lembrar do meu próprio limite.

— Yasmin. — Ícaro largou a xícara, pegou um guardanapo e secou as mãos com toda calma. — Se você não conseguir se separar, eu arranjo uma solução pra você.

— Eu...

Antes que eu terminasse, Ícaro ergueu a mão, olhou nos meus olhos e falou:

— Você pretende continuar presa a um casamento sem sexo, só pra fingir pra quem? O que o Tiago pode te oferecer além de te puxar pra baixo?

Eu respondi de pronto:

— Amor.

Quando ouvi a palavra amor, ele esboçou um sorriso quase imperceptível — não era deboche, mas parecia pena ou talvez uma resignação diante da minha ingenuidade.

— Você acha mesmo que o Tiago te ama?

Eu afirmei com a cabeça, sem hesitar:

— Acho, sim.

Ele então apontou com o queixo para o meu celular:

— Liga pra ele agora. Manda ele vir te buscar.

Eu não entendi o motivo, mas obedeci. Talvez ele só quisesse que eu fosse embora de uma vez, depois de ouvir minha recusa.

Disquei para Tiago, pedindo que viesse me buscar imediatamente. Pelo tom de voz, Tiago parecia até um pouco aborrecido comigo.

Eu vesti o casaco e me preparei para sair. Ícaro também se levantou e foi comigo até a porta.

Lá fora, o vento da noite estava gelado. Quando vi, Ícaro puxou minha mão e colocou dentro do bolso do casaco dele. Eu tentei soltar, preocupada que alguém nos visse, mas ele segurou firme.

— Sr. Ícaro. — Falei, olhando ao redor, em alerta. — Alguém pode ver a gente.

Ícaro virou o rosto, abaixou os olhos até os meus e respondeu com um sorriso intrigante:

— Você tem mais medo de ser vista comigo do que eu, né?

Eu fiquei sem reação, não sabia o que responder:

— Se algum cliente te vê com uma mulher casada desse jeito, pode ser ruim pra empresa.

Ele retrucou, direto:

— Está preocupada comigo ou está com medo por você?

Eu jamais admitiria que era medo de alguém conhecido me flagrar. Isso só me deixaria mais desconfortável.

— Estou preocupada com você.

Ícaro enxergou minha mentira, mas não comentou:

— Fica tranquila, no mundo dos negócios ninguém liga pra isso. O que importa é o lucro.
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