Share

Capítulo 6

Author: Peixinho
Eliana ainda sentia o rosto arder de vergonha, o coração descompassado fazia o ventre subir e descer num ritmo nervoso.

A pele macia se destacava contra a calcinha preta, as pernas longas repousavam sobre o lençol cinza e a barriga, lisa e firme, se movia jcoma respiração irregular.

A cena chamava atenção sem que ela quisesse, e a lembrança do toque de minutos atrás, quando Leandro a ergueu do chão, ainda latejava na ponta dos dedos dele.

Sem pronunciar palavra, Leandro se curvou, segurou a barra da calça e, com gestos contidos, vestiu a peça nela até a cintura. Ao roçarem a pele sensível, os dedos provocaram um estremecimento imediato, tornando o ar pesado no quarto. Quando ergueu o olhar, encontrou o rosto dela marcado por um rubor evidente, e nos olhos havia uma hesitação silenciosa que não passava despercebida.

Ele puxou o edredom e a cobriu por inteiro, como se fechasse a cena de propósito. Naquele instante, uma batida discreta interrompeu o silêncio.

— Entra.

O médico particular de Leandro entrou, seguido por Lara, que se aproximou com passo ansioso.

Leandro trocou um olhar rápido com o profissional e fez um gesto seco.

— Ela caiu. Vê se foi algo sério.

O médico se aproximou de Eliana, pediu que se deitasse com calma e a examinou, testando a lombar e a perna. Depois de apalpar com cuidado, afirmou que não passava de um estiramento, algo que melhoraria com repouso e alongamentos leves. Ainda assim, notou o respiro dela congestionado.

— Você está gripada.

— Estou, sim. — Respondeu Eliana.

— Já estão tentando engravidar?

A pergunta veio direta, e Lara, ao lado, ergueu as sobrancelhas, visivelmente atenta à resposta. Antes que Leandro pudesse abrir a boca, Eliana se adiantou com firmeza.

— Estamos.

O médico lançou um segundo olhar a Leandro, e este respondeu apenas com um silêncio pesado. O olhar cravado nela carregava uma advertência clara. Aquela mulher falava o que queria sem medir consequência.

Eliana abaixou os olhos, fingindo não perceber. A resposta não havia sido para o médico, mas para Lara.

Depois da receita e das recomendações, os dois se retiraram. O quarto retomou o silêncio, e a palavra engravidar deixada no ar tornou o clima ainda mais constrangedor.

Eliana não teve coragem de encará-lo. Diferente do habitual, Leandro preferiu não cobrar explicações e se recolheu ao escritório ao lado.

Alguns minutos se passaram até que Dinis surgisse à porta com uma pasta nas mãos.

— Senhor Leandro, aqui está o que pediu. — Ele entregou o documento. — Acordo de convivência, redigido conforme suas instruções.

Leandro folheou por alto e voltou ao quarto. Estendeu a pasta a Eliana sem rodeios.

— Quer esse casamento? Então assina.

Ela não esperava que fosse tão rápido. Sentou-se, abriu o documento e leu as cláusulas com calma. Quando chegou à última, ergueu o olhar e perguntou num tom quase leve:

— E se, apenas se, você acabar se apaixonando por mim... esse acordo ainda vale?

— Isso não existe. — A resposta veio direta, sem pausa.

Eliana não se surpreendeu. Ela sabia que o contrato servia para tranquilizar a cabeça dele, não para mudar a situação dela.

— Nada na vida é cem por cento.

Leandro a encarou de lado, como se pesasse cada palavra. Não havia aprovação nem indulgência naquele olhar.

Consciente do terreno em que pisava, Eliana pegou a caneta, assinou o próprio nome com firmeza, tirou uma foto para guardar consigo e devolveu a pasta. A objetividade dela o fez detê-la por um segundo a mais. Às vezes, parecia que ela entendia realmente o lugar que ocupava.

— De agora em diante, dá um jeito de recusar qualquer convite para voltar à mansão antiga.

...

— E aí, o que tinha nesse acordo? — Perguntou Catarina, curiosa.

Eliana se ajeitou no sofá, enrolada na manta, as pernas cruzadas e o lenço na mão. Ela fungou antes de responder, com a voz ainda meio anasalada:

— Tinha de tudo. Mas o foco era claro. Primeiro, nada de contato físico.

— Ele te tratou como se fosse tarada. — Catarina soltou uma risada curta.

— Com aquele rosto e aquele corpo, é até difícil não parecer. — Eliana suspirou, enxugou o nariz e continuou. — Segundo, se a gente se encontrar na rua, é para fingir que não nos conhecemos.

— Esse aí está desesperado para fugir do casamento.

— Terceiro, proibido contar a qualquer pessoa que tenho alguma relação com ele. — A voz dela ficou mais baixa. — E a última, a mais importante de todas, não posso me apaixonar por ele.

— Ele tem nojo de você ou de casamento? — Catarina resmungou, franzindo o cenho.

— Pode ser dos dois. Ou, mais provável, só de mim. — Eliana deu de ombros com naturalidade.

— E você ganha o quê? Porque, até agora, só tem cláusula te limitando. Não parece te favorecer em nada.

O som de uma notificação interrompeu a conversa. Eliana pegou o celular, leu com calma e arqueou as sobrancelhas, sorrindo logo em seguida.

— Como não favorece? Não preciso lidar com sogro nem sogra, não cuido de marido e, de quebra, recebo uma mesada gorda de algumas dezenas de milhares. Está ótimo.

— Está brincando? Quando ele morrer, vão falar de você.

— Todo mundo morre. É só questão de calendário. — Eliana respondeu sem se abalar. — E, de qualquer jeito, não penso em casar de novo.

Catarina franziu o cenho, séria.

— Você só fala isso porque já não acredita em amor.

— Para de acreditar em conto de fadas. — Eliana corrigiu, rindo. — E também não é que eu esteja assim. Você não imagina o quanto ele é bonito. Zero aparência de doente terminal. Vai que nem morre? Nesse caso, saio ganhando.

Catarina não riu. A sensação era a de que Eliana não havia casado nem por vontade própria, nem só pelo dinheiro, mas parecia mais um castigo que ela mesma se impunha.

O toque do celular interrompeu o silêncio. Eliana olhou o número, franziu o cenho e atendeu com voz calma, escolhendo cada palavra com gentileza. Quando desligou, soltou um assobio curto.

— Está vendo só? A utilidade de estar casada já vai aparecer.

— Que utilidade?

— Espantar paquera.

Eliana havia pedido transferência de volta para Oeiras por causa de Rafael. Não esperava que Márcio, filho do chefe e interessado nela, também fosse transferido. E agora, para completar, ele organizou um encontro com a turma do departamento naquela mesma noite.

Apesar de ainda não ter voltado ao escritório desde que regressou, ela já conhecia todos por causa de feiras e projetos anteriores. Recusar seria deselegante, mas comparecer também exigia jogo de cintura.

No caminho, Catarina não deixou de cutucar:

— Se você quebrar o acordo, o que acontece?

...

Na cláusula mais absurda, Leandro tinha, sim, previsto uma punição.

Se Eliana quebrasse o acordo, teria de se agachar bem no centro da cidade e, pulando, imitar um cachorro.

Quem imaginaria que um homem como ele escreveria algo tão brega? O nojo dele pelo casamento era tamanho que inventava uma humilhação digna de adolescente. Exatamente por isso funcionava. Era ridículo demais para ser suportado. Servia como trava, muito mais para segurar Eliana do que a ele próprio.

Naquela noite, ela desceu do carro, apertou o casaco contra o corpo e atravessou a entrada do restaurante. Do reservado vinha um burburinho alegre, gargalhadas misturadas ao barulho de copos.

— Eliana! Vem, só faltava você. — Alguém chamou da porta.

Diversos rostos se voltaram ao mesmo tempo. Ela respondeu com naturalidade, ajeitando a postura:

— Desculpa a demora. Peguei um resfriado e capotei em casa, acabei dormindo demais.

— Está bem mesmo? — Márcio olhou para ela com evidente preocupação.

— Só um resfriadinho, nada demais. — Ela sorriu de leve.

O ambiente era familiar, colegas de projetos e eventos passados. A conversa fluiu sem esforço, cada um puxando histórias, recordando situações, rindo de piadas internas.

A fofoca de que Márcio se interessava por ela já tinha viajado da matriz até a filial, e o clima estava no ar. Com discrição, deixaram a cadeira ao lado dele livre, e Eliana se acomodou ali sem criar caso, dividindo o papo com todos.

Trabalhar junto sempre rendia assunto. Ninguém deixou a energia cair, o reservado transbordava de risos e comentários soltos.

Depois do jantar, quando já estavam mais relaxados, Márcio se ausentou por alguns minutos e voltou carregando um buquê de rosas champanhe. O gesto provocou sorrisos contidos e olhares enviesados na direção dela.

Eliana compreendeu imediatamente. Com tanta gente presente, recusar sem um motivo convincente poderia pesar no ambiente profissional. Além disso, a porta aberta deixava a cena exposta para quem passasse no corredor.

Márcio parou diante dela, erguendo o buquê.

— Eliana, fiquei sabendo que você voltou a ficar solteira. Me dá uma chance de te amar?

O coro de "ôôô" se espalhou entre os colegas, mas ninguém chegou a forçar uma resposta.

Eliana se levantou devagar. O salão ficou em silêncio por um instante.

Com a mesma clareza com que sempre encarava o inevitável, ela respondeu sem rodeios:

— Desculpa, mas eu não voltei a ser solteira. Estou casada.
Continue to read this book for free
Scan code to download App

Latest chapter

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 100

    Leandro encerrou a ligação sem pressa e trouxe a carne já pronta, servindo-a com movimentos calmos, controlados, como se nada no mundo pudesse apressá-lo.— Leandro, você está tentando me agradar? — Eliana fixou o olhar na tigela fumegante, com pedaços generosos e suculentos, e não conseguiu impedir que a garganta traísse um leve engolir em seco.Ele colocou uma pequena porção de arroz na tigela dela antes de perguntar, sem levantar os olhos:— Você está brava?Eliana semicerrou os olhos, avaliando-o. — Você nem sabe se estou com raiva ou não?— Não sei. — A resposta veio seca, reta, sem a menor tentativa de adivinhar o que se passava na cabeça dela.A indiferença dele a deixou numa mistura de frustração e desorientação. No fundo, não estava realmente irritada, mas Leandro tinha aquele jeito estranho de deixá-la sem mapa, incerta de como avançar.Sentaram-se frente a frente e começaram a comer. De repente, a tela do celular dele acendeu sobre a mesa. O nome que surgiu fez os olhos de

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 99

    A foto, como ele imaginava, era da internet.Leandro leu a legenda no status dela e, mesmo tentando segurar a expressão, o canto da boca se curvou num sorriso quase imperceptível. Saiu da tela e, sem perder tempo, digitou no WhatsApp.[Vou preparar macarrão de carne para você. Volta logo.]Assim que enviou, levantou-se e abriu a geladeira, pegando o pacote de carne que havia mandado entregar pouco depois de Eliana sair....Quando Eliana viu a mensagem, foi como se uma pontada quente tivesse tocado seu peito por dentro, despertando uma inquietação doce. A respiração mudou de ritmo, e, sem pensar demais, ela fez uma captura de tela e postou outro status.[Ver alguém ser tão atencioso assim merece perdão. Estou indo para casa comer macarrão de carne.]A ousadia provocou reação imediata, até Catarina mandou mensagem, curiosa, perguntando o que estava acontecendo, já que aquilo não parecia condizer com o jeito habitual de Eliana.Eliana saiu do quarto e foi até o banheiro, atendendo a cham

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 98

    Eliana se importava com Leandro, mas estava convencida de que esse vínculo não tinha nada a ver com amor entre homem e mulher. Para ela, o peso estava apenas no fato de ele ter salvado a vida da mãe. Fora isso, o casamento seguia porque nenhum dos dois tinha energia ou disposição para enfrentar um divórcio. Se um dia qualquer um resolvesse acabar, encerrariam a relação sem olhar para trás.Quando o caldo de galinha finalmente ficou pronto, Eliana serviu uma tigela para Eduarda.— Está com um cheiro ótimo. — Comentou Eduarda, inclinando o rosto sobre o vapor antes de tomar o primeiro gole. — É estranho pensar que, justo num momento como esse, a pessoa em quem eu mais confio... seja você.— Devo me sentir honrada com isso? — Provocou Eliana, arqueando uma sobrancelha com leve sarcasmo.Eduarda sorriu de leve, o rosto ainda marcado pelo cansaço e os olhos úmidos, mas firmes.— Mesmo que você não queira ouvir, preciso dizer pela última vez. Obrigada.Eliana fez um gesto rápido com a mão,

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 97

    — Está com ciúmes? — Eliana lançou a pergunta sem aviso, mantendo o olhar fixo nele, como se quisesse forçar uma confissão.Leandro a observou com uma expressão que misturava incredulidade e desprezo, como se acabasse de ouvir a provocação mais absurda do mundo. Um sorriso frio ameaçou surgir no canto da boca, mas morreu ali.Eliana torceu os lábios. — Você vive nesse vai e volta com a sua ex. Se ainda sente tanto assim, por que não casa logo com ela?Não ficou claro qual palavra atingiu o alvo de forma mais certeira, mas, no instante seguinte, Leandro largou a cadeira de repente, pegou a própria tigela e sumiu para a cozinha sem pronunciar uma única resposta.O apetite de Eliana se dissipou na mesma hora. Levantou-se, levou o prato até a pia e, quando ele estendeu a mão para pegar, mudou de direção de propósito.— Não precisa, eu lavo sozinha. — Ela disse, num tom seco que cortava o ar.Ele a encarou, e o silêncio carregado falava mais do que qualquer frase. Eliana, sem baixar o olha

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 96

    O pomo-de-adão de Leandro subiu e desceu num movimento sutil, o garfo ainda firme entre seus dedos, como se até esse gesto fosse uma barreira.— Solta.— Não vou soltar. — Eliana arqueou a sobrancelha com um brilho provocador nos olhos, como se estivesse desafiando-o a ir mais longe.As pupilas dele estreitaram, e a tensão no ar aumentou.— O macarrão vai queimar.Sem hesitar, Eliana esticou o braço e desligou o fogo, mantendo o olhar cravado nele.Leandro soltou um suspiro raro, pesado e resignado, como quem já sabe que está entrando num jogo perdido.— O que você está querendo?— Quero macarrão com carne. — A resposta veio firme, com um traço de teimosia quase infantil, mas claramente carregada de malícia calculada.A testa dele se franziu num aviso silencioso.— Se não for isso... — Ela inclinou levemente o rosto, deixando a voz cair num tom baixo e carregado de intenção. — Pode ser você.Leandro apertou os lábios, a expressão evidenciando irritação.— Tem noção do quanto é ridícula

  • O Amor que Me Desarma   Capítulo 95

    — Eu sei. Pode ficar tranquila, não sou louca de colocar minha própria saúde em risco. — Eduarda levou a colher à boca devagar, mas, a cada gole, as lágrimas caíam pesadas na tigela, misturando-se ao caldo quente e salgando o sabor.— Está sentindo alguma coisa estranha? — Eliana, em alerta, já ajeitava o corpo como quem se preparava para correr atrás de um médico a qualquer segundo.Eduarda balançou a cabeça, respirando fundo, o nariz vermelho pelo choro. — Não, é só que eu nunca imaginei que, nesse momento, a pessoa que estaria ao meu lado... seria você.Eliana soltou um riso curto, sem humor, quase um suspiro de ironia disfarçado. — Nem eu esperava.Com os olhos marejados, Eduarda ergueu devagar o rosto até encontrar o olhar da irmã e sussurrou, num tom carregado de arrependimento: — Desculpa.— Desculpa pelo quê? — Eliana franziu as sobrancelhas, já prevendo para onde a conversa poderia ir.— Se não fosse a minha mãe, naquela época...O semblante de Eliana fechou como porta bati

More Chapters
Explore and read good novels for free
Free access to a vast number of good novels on GoodNovel app. Download the books you like and read anywhere & anytime.
Read books for free on the app
SCAN CODE TO READ ON APP
DMCA.com Protection Status