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O Disfarce do Demônio
O Disfarce do Demônio
Author: Beatriz Falcão

Capítulo 1

Author: Beatriz Falcão
Eu estava parada do lado de fora, ouvindo nitidamente a conversa entre Jone e Carlos.

A fruteira em minhas mãos tremia por causa do leve tremor do meu corpo.

— Você não se arrepende nem um pouco?

Ao ouvir a dúvida de Carlos, uma ponta de esperança acendeu em meu coração.

— Tudo é por Paula. Eu não me arrependo.

Carlos massageou a testa, parecendo frustrado, e tentou argumentar: — De que adianta ter ajudado Paula a consolidar-se no Grupo Sousa? Ela ainda escolheu Luis! Você vai mesmo machucar quem te ama por causa de alguém que não te ama?

Jone ouviu, inexpressivo, e olhou seriamente para Carlos: — Não importa quem Paula escolheu, essa é a liberdade dela, eu só queria ajudá-la. Quanto à Sofia, ela me ama tanto... Se eu não me casar com ela, aí sim eu a estarei machucando. Contanto que ela não descubra a verdade, ela não sofrerá. Eu também a estou protegendo.

Carlos ficou sem palavras diante daquela lógica distorcida de Jone.

E eu, por outro lado, ri da minha cegueira, da minha burrice, dos meus últimos três anos.

Nestes três anos, eu vi Jone como meu benfeitor, minha salvação.

Tudo porque, quando eu era zombada por toda Salvador, ele se colocou à minha frente.

Ele não apenas me ajudou a quitar minhas dívidas, mas também a enterrar meu pai.

Graças a ele, eu, uma mulher falida, encontrei um novo abrigo.

Também foi por causa dele que não guardei rancor após o abandono de Luis.

Mas agora, a conversa dele com Carlos me dizia que tudo era uma farsa.

E eu estava prestes a me casar com o homem que arruinou minha família e meu pai.

Ouvi passos dentro da casa.

Não tive outra escolha a não ser correr de volta para o meu quarto.

Assim que Carlos foi embora, Jone voltou para o quarto e segurou minha mão, ficando de frente para mim.

— Suas mãos estão congeladas. Está doente?

Ele tocou minha testa para medir minha temperatura. — Sem febre. Sofia, você está sentindo algum mal-estar?

Olhar para Jone na minha frente, parecendo tão preocupado, me dava arrepios.

Ele não me amava, mas sempre conseguia fingir que me amava loucamente.

Eu balancei a cabeça levemente, soltei a mão dele e sorri de leve: — A janela estava aberta, talvez tenha sido o vento.

Jone foi até a janela, fechando-a, e me repreendeu: — Você é frágil, não pode ficar pegando vento. E se ficar doente? Eu vou ficar preocupado.

Antigamente, ao ouvir isso, eu sorriria radiante e o abraçaria para fazer charme.

Mas agora, eu apenas me calei.

Ele percebeu minha tristeza, agachou-se e me olhou nos olhos: — O nosso casamento é amanhã. Você não está feliz em se casar comigo, Sofia?

Depois de ouvir a conversa dele com Carlos, eu estava perdida, sem saber o que fazer.

As palavras de Jone me trouxeram de volta à realidade: eu não podia me casar com ele.

Eu precisava ir embora.

Preocupada que ele percebesse algo estranho, me apressei em acalmá-lo: — Ansiedade pré-casamento? Não se preocupe, eu consigo.

Jone sorriu: — Sofia, não se preocupe. Eu vou estar sempre ao seu lado.

Há três anos ele disse a mesma coisa e, de fato, ele fez isso durante todo esse tempo.

Mas eu achei que era por amor. Na verdade, era para compensar e me manter sob controle.

— Sofia, vamos arrumar nosso novo apartamento de casal?

As palavras de Jone interromperam meus pensamentos, e eu apenas concordei com a cabeça.

A nova casa ficava na Zona Oeste de Salvador, uma mansão luxuosa.

Na primeira vez que a vi, eu adorei.

Jone me disse que a escolheu baseando-se no meu gosto.

Ao contrário da alegria da última visita, ao pisar na mansão, senti um frio percorrer meu corpo.

O homem à minha frente era meu inimigo; o amor da minha vida era o causador da destruição da minha família. Como eu poderia sentir que aquela casa era aconchegante?

Enquanto eu lutava para controlar minhas emoções, o celular de Jone tocou.

Era o toque exclusivo de Paula.

Uma vez eu briguei com Jone por causa desse toque, mas ele me disse que era porque Paula era sua parceira de negócios.

Ele disse isso com tanta seriedade que eu tive que acreditar.

Mesmo a contragosto, não falei mais sobre meu descontentamento, com medo de que ele me achasse dramática.

Mas agora, ao ouvir o toque de novo, senti que era um som de salvação.

Jone me olhou com um semblante constrangido, atendeu o telefone e se afastou.

Quando ele voltou, estava com uma expressão de urgência.

— Sofia, houve um problema na empresa. Preciso ir. Você pode arrumar as coisas aqui. Eu volto para te ajudar com o resto.

Ele disse isso e saiu, sem esperar minha resposta.

Observar as costas dele sumindo, sem olhar para trás, me deu um alívio imediato e, ao mesmo tempo, uma dor profunda.

Eu fui ingênua, e também fingi não ver.

Jone sempre atendia as ligações de Paula como se fosse uma missão, não importa o que estivesse fazendo.

Houve uma vez, enquanto estávamos nos beijando, que ele atendeu a ligação de Paula. Assim que ouviu o choro dela, ele vestiu a roupa e saiu na mesma hora.

Do começo ao fim, ele não olhou para mim, nem me deu uma explicação.
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