capítulo 3

— Fica aqui hoje à noite. Amanhã de manhã eu passo lá pra dar uma olhada. Veste isso, vai acabar pegando um resfriado.

Valentina me lançou um olhar provocador.

Mordeu o lábio, com a voz meiga:

— Clara, se você não quiser, eu vou embora. Só não fica brava com o doutor Leonardo por minha causa.

Leonardo pareceu irritado.

— Olha o estado dela. Será que dá pra parar com esse ciúme bobo? Ela acabou de se divorciar, tá frágil. Custa nada ter um pouco de compaixão.

Meu corpo mal se aguentava de pé. A dor na barriga era tão forte que nem consegui entender direito o que ele estava dizendo.

— Faz o que quiser.

Virei as costas e fui pro quarto.

Leonardo ficou parado por um segundo, sem reação. Depois, levou Valentina pro quarto de hóspedes.

E aquela tigela de chá de açúcar mascavo foi pra lá também.

Ele não voltou pro nosso quarto a noite toda. Nem precisei perguntar onde dormiu.

Leonardo e eu começamos a namorar na faculdade.

Uma vez, voltando do nosso encontro, cruzamos com um grupo de delinquentes perto do campus.

Eles começaram com provocações, depois tentaram me agarrar. Leonardo se colocou na frente sem hesitar. Mas eram três caras crescidos.

Enquanto ele tentava me proteger, escondida, eu liguei pra polícia. Quando os agentes chegaram, Leonardo já estava desacordado, estirado no chão.

As lágrimas escorreram pelo canto dos meus olhos.

Como foi que a gente chegou nesse ponto?

Na manhã seguinte, a casa estava vazia. Só eu.

Arrumei minhas poucas coisas, deixei tudo que Leonardo tinha me dado exatamente onde estava.

A porta do quarto de hóspedes estava aberta. No pé da cama, dava pra ver uma lingerie rendada esquecida ali.

Caminhei até lá com firmeza. Peguei o celular e tirei uma foto.

Estava prestes a sair quando dei de cara com os pais do Leonardo.

Eles estavam animados, sorrindo, puxando assunto.

— Viemos pra escolher o restaurante da festinha do bebê.

Um aperto me atravessou o peito. Respondi com amargura:

— Ainda tá cedo pra isso.

Mas eles nem ligaram. Já estavam ligando pro Leonardo.

— Alô, pai? Mãe? Aconteceu alguma coisa?

A voz de Leonardo soou no viva-voz, mas logo em seguida veio outra voz — feminina, melosa e impossível de ignorar.

— Leonardo, acho que esqueci minha lingerie aí na sua casa. E agora? Será que ela vai descobrir?

Os pais dele congelaram. Em seguida, como se despertassem de um pesadelo, desligaram o viva-voz às pressas.

— Seu moleque sem noção! Volta pra casa agora! E manda essa sirigaita sumir! Quer matar eu e sua mãe de raiva, é?

Peguei minha bolsa, sem paciência pra assistir àquela cena patética.

— Preciso ir. Tenho coisa pra resolver.

Os dois abriram a boca como se quisessem me impedir, mas acabaram engolindo as palavras.

Chamei um táxi e fui direto pro escritório de advocacia.

Depois que me formei na faculdade, meu pai queria que eu voltasse pra casa e começasse a aprender sobre a empresa da família.

Mas eu insisti em abrir um escritório com Leonardo. Como não era formada em Direito, só podia cuidar das tarefas administrativas.

Cheguei à minha mesa e comecei a organizar minhas coisas.

Do lado da copa, ouvi cochichos.

— Essas mulheres... Dá até pena. Ajudam o cara a construir tudo do zero e, no fim, levam um pé.

— Você não viu a que apareceu aqui esses dias? Cheia de charme barato, e o chefe ainda caiu na dela! Por causa dela, perdemos um cliente grande, e ele nem ficou bravo!

Meus dedos pararam por um segundo, mas continuei empacotando.

Na mesa ao lado, o celular não parava de vibrar com mensagens. Virei o aparelho de tela pra baixo com um gesto seco.

Leonardo apareceu logo depois. Viu meu movimento e fechou a cara.

— O que você tá fazendo?

Sem mudar o tom, respondi:

— Tô indo embora. Decidi cuidar da gravidez em casa.