capítulo 2

Meu corpo ainda estava fraco, e acabei dormindo até a madrugada, afundada numa febre leve e constante.

Foi só quando Leonardo voltou que acordei. Ele acendeu a luz do quarto.

Com a expressão fechada, perguntou:

— Clara, por que você me bloqueou?

Como eu não respondi, ele se aproximou. Com grosseria, enfiou a mão fria por baixo da minha camisola e a encostou na minha barriga.

O toque gelado só piorou meu mal-estar.

Leonardo tirou a mão com irritação.

— Isso é porque você tá de birra. Já falei que entre mim e a Valentina não tem nada além de advogado e cliente. Só ajudei porque ela tava mal.

A dor na parte baixa da barriga se intensificava. Eu nem queria, nem conseguia discutir com ele.

Leonardo soltou um suspiro, como se fosse o incomodado da história.

— Tá bom, tá bom. Ontem eu errei, beleza? Mas para de drama, eu prometo mudar, tá bom assim?

As mesmas palavras vazias que ele repetia toda vez. E que, no fim, só eu levava a sério.

Esse pensamento me apertou o peito.

Vendo meu rosto pálido, ele até tentou mostrar algum gesto de cuidado:

— É TPM, né? Já te falei mil vezes pra prestar atenção. Vou fazer um chá de açúcar mascavo pra você, tá? Eu sou tão bom pra você, e mesmo assim você vive me tirando do sério.

Fiquei um instante em silêncio.

Uma mulher grávida não menstrua. E ele nunca tinha se importado o suficiente pra notar isso.

Enquanto Leonardo mexia nas coisas na cozinha, deixou o celular em cima da mesa.

A tela se acendeu: era uma mensagem de “Val”.

Desviei o olhar, fingindo não me importar. Estiquei o braço pra alcançar o copo de água morna no criado-mudo.

Mas Leonardo voltou de repente, e com um movimento rápido, pegou o celular.

No processo, esbarrou no copo.

A água quente derramou sobre minha mão, deixando uma grande mancha vermelha que ardia na hora.

— O que você quer afinal?! Já falei que entre mim e a Valentina não tem nada! E você ainda fuça no meu celular quando eu não tô em casa. Dá pra parar de ser tão sensível?

Vi nos olhos dele um lampejo de nervosismo. Respondi calma, sem me alterar:

— Eu só queria tomar um copo d’água.

Leonardo pareceu travar por um instante, como se tivesse percebido que exagerou.

— Ainda responde? Queimou a mão, né? Vem cá, deixa eu ver.

Puxou minha mão e assoprou levemente, como se isso pudesse aliviar alguma coisa.

— Eu sou seu marido. Se você não confia em mim, quem vai confiar? Num casamento, o mais importante é a confiança.

— É mesmo?

Interrompi, encarando ele nos olhos, como se assim eu pudesse enxergar o que havia por trás daquele discurso ensaiado.

— Claro que é.

— O bebê... já tá com alguns meses. Agora tá tudo bem, né?

Ele nem hesitou, não demonstrou o mínimo desconforto. Só tentou se aproximar, como se quisesse me beijar. Virei o rosto levemente, desviando.

Leonardo se irritou. Ia dizer algo, mas fomos interrompidos.

Era Valentina.

Apareceu na sala com uma camisola de renda provocante, o cabelo solto, meio bagunçado, e os olhos vermelhos.

Leonardo deu um passo em direção a ela, mas parou, lançando um olhar rápido na minha direção. Tentou disfarçar, fingindo seriedade:

— O que você tá fazendo aqui, essa hora da madrugada?

Olhei para os dois com frieza.

— Como é que ela sabe a senha da casa?

Leonardo pareceu desconfortável.

— Foi naquela época da ação judicial... ela esqueceu umas coisas aqui e como a gente não tava em casa, deixei ela vir buscar sozinha.

Valentina se encolheu, com a voz trêmula.

— Clara. Sr. Leonardo tá certo. Desculpa atrapalhar vocês. É que acabou a luz lá em casa e... eu fiquei com medo de ficar sozinha.

Leonardo se apressou em cobrir ela com um casaco, e o jeito como olhou pra ela... tinha uma ponta de carinho no olhar.