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Capítulo 8

Autor: Ginse
Elisa estava de volta à Vila do Mar do Norte. Enquanto arrumava as malas, fazia uma chamada de vídeo com Susana e, entre uma dobradura de roupa e outra, começou a desabafar.

— Eu realmente não consigo entender. — Disse Susana, numa mistura de incredulidade e indignação. — O Daniel parece que foi possuído por algum espírito estranho. Ele não gosta de você, você mesma pediu o divórcio... Era para ele estar comemorando, não se fazendo de difícil desse jeito.

— Na verdade, ele faz tudo isso só para me provocar. — Respondeu Elisa, ajeitando uma camisa sem olhar para a tela. — Quanto mais tento me ver livre dele, mais ele cria problemas só para me tirar do sério.

Susana arregalou os olhos, visivelmente surpresa.

— Esses homens ricos têm um jeito de pensar totalmente diferente. Então quer dizer que vocês nem conseguem se divorciar de verdade?

— Querer se divorciar é uma coisa, não conseguir é outra. — Afirmou Elisa, determinada. — Se ele se recusar a assinar, entro com um processo na justiça. Me ajuda a encontrar advogado, por favor?

Susana quase se engasgou, rindo nervosa.

— Você está maluca! Que advogado vai querer enfrentar o Daniel? Não tem ninguém com coragem para isso.

Elisa soltou um suspiro longo e fez uma expressão de desânimo. Quando Paloma ainda estava viva, ela era capaz de controlar Daniel até certo ponto. Agora, sem ela, ninguém tinha essa força.

Percebendo que Elisa estava abatida, Susana tentou suavizar o clima e mudou de assunto:

— Calma, respira um pouco. Tenho uma notícia boa para te dar. Já aluguei o espaço que você queria. Quando quer ir conhecer?

— Amanhã. — Respondeu Elisa, fechando a mala de repente. — Hoje mesmo vou sair de casa, preciso mudar logo.

— Mas vai para onde? — Perguntou Susana, achando inesperado.

— Por enquanto, vou para algum hotel. Amanhã começo a procurar um lugar definitivo.

Susana, então, protestou, balançando a cabeça com firmeza:

— Hotel nada! Meu pai me deu um apartamento no ano passado, ele está vazio até hoje. Vai para lá, pronto.

— Não sei se devo aceitar... — Murmurou Elisa, um pouco tímida.

— Para com isso, Elisa, não banca modéstia agora. — Rebateu Susana com um sorriso.

Elisa acabou rindo.

— Tá bom, obrigada mesmo, amiga.

Naquela noite, Elisa se mudou às pressas para o apartamento pequeno de Susana. A própria Susana chegou mais tarde e as duas dividiram a cama, conversando em voz baixa até tarde da noite, trocando confidências como já fazia tempo não acontecia.

Elisa estava convencida de que Daniel ficaria furioso ao chegar em casa e não encontrá-la. No entanto, ele não ligou, não mandou mensagem, talvez nem tivesse voltado para casa, o que fazia sentido. Ele mesmo admitia que, sem Paloma por lá, não havia mais motivo algum para pôr os pés naquele lugar.

Na manhã seguinte, Elisa dormiu até tarde, tomou café com Susana, e juntas saíram para visitar o imóvel.

O prédio tinha dois andares, ficava escondido entre ruas movimentadas da cidade, e chamava atenção pela fachada charmosa e pelas características antigas da decoração. Já tinha sido restaurante antes, mas acabou fechando as portas. Elisa o descobriu meio por acaso, ao ler um anúncio de repasse online, e logo pediu que Susana ajudasse na negociação.

Após andarem por cada canto do espaço, Susana se acomodou numa das cadeiras e perguntou, curiosa:

— E aí, tem algo que você não gostou? Se tiver, posso mandar reformar tudo sem problema.

— No geral, está ótimo. Só preciso fazer uns ajustes aqui e ali. — Respondeu Elisa, pegando um caderno da bolsa. — Vou desenhar o que tenho em mente e te mostro.

Ela se concentrou por alguns instantes, rabiscou um esboço e passou o caderno para a amiga.

Susana analisou o desenho com atenção e soltou um assobio divertido:

— Daniel é mesmo cabeça-dura, viu? Renata gosta de posar como artista, mas ela não chega nem perto do seu talento.

Elisa sorriu de leve, mas logo completou:

— Daniel nunca se importou com talento. Para ele, o que conta é a pessoa. Posso criar o quadro mais bonito do mundo e ele vai desprezar. Mas se Renata fizer dois traços, vira obra-prima aos olhos dele.

— Pois ele é cego. — Retrucou Susana, claramente indignada. — Nunca consegui entender o que ele vê nela.

— O amor é assim, né? — Respondeu Elisa, dando de ombros. — Nos olhos de quem ama, até os defeitos viram qualidades.

— Um dia ele ainda vai se arrepender. — Disse Susana, com convicção.

— Deixa ele para lá. — Pediu Elisa, mudando de assunto quase que de propósito. — Quero falar sobre as cotas da sociedade.

— Que cotas? — Perguntou Susana, sem entender.

— As do restaurante. Não quero que você coloque dinheiro e depois saia no prejuízo. Precisamos definir tudo certinho.

— Ah, Elisa, para com isso. — Rebateu Susana, séria. — Estou só emprestando o dinheiro, não investindo. E você vai me devolver tudo, com juros de banco, ouviu?

Elisa percebeu que era só no discurso, pois sabia que a amiga nunca cobraria nada realmente. Então entrou na brincadeira:

— Então quer dizer que não confia em mim? Está achando que o restaurante não vai dar certo?

— Claro que eu confio! — Susana balançou a cabeça, sorrindo. — Você é incrível. Se não fosse por esses três anos ao lado do Daniel, já teria aparecido mais. Quando abrir, vai ser sucesso, pode apostar.

— Então por que não aceita as cotas? — Insistiu Elisa.

— Porque não quero tirar vantagem de você.

— Tirar vantagem? — Elisa riu. — Pensa que é só pagar o aluguel e pronto? Temos reforma, contratação, ingredientes... dinheiro vai sair por todos os lados.

Susana ficou alguns segundos em silêncio, pensativa.

— Posso perguntar uma coisa? Você está sem dinheiro nenhum?

— Não é que eu esteja completamente sem. — Respondeu Elisa, abrindo a mão para mostrar o pouco que tinha.

— 500 mil? — Chutou Susana.

— Pode tirar um zero.

— 50 mil? — Susana quase gritou de susto. — Três anos casada com Daniel e está só com 50 mil? Não imaginava que ele era tão pão duro.

Elisa suspirou fundo, lembrando que tinha um cartão adicional, mas nunca sequer pensou em usar.

— Então, pelo jeito, o futuro do restaurante vai depender do seu cofrinho secreto. — Brincou Elisa, estendendo a mão. — As cotas vão ser divididas meio a meio. Se não aceitar, esquece, não faço o negócio.

Susana conhecia Elisa o suficiente para saber que ela cumpriria a ameaça.

— Tá bom, está bem, aceito. — Cedeu Susana, levantando as mãos. — Meio a meio.

Elisa sorriu aliviada.

— Prometo que você não vai sair no prejuízo, Susana.

Susana riu de volta, tranquila.

— Eu sei. Se tem uma coisa que aprendi nessa vida, é que duvidar de você só faz perder tempo.

Ela não estava nem um pouco preocupada em ter prejuízo. Os outros podiam não saber o quanto Elisa era talentosa, mas ela sabia muito bem do que a amiga era capaz.
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