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Capítulo 7

Author: Hannah
Daniela descascava a tangerina com um jeito cuidadoso, revelando os gomos que estavam escondidos sob a casca amarela. Ao separar um deles, ela ainda tirou com paciência todos os fiozinhos brancos antes de levar finalmente o pedaço à boca. O gosto, no entanto, não agradou nem um pouco.

Ela franziu as sobrancelhas e, num gesto de leve irritação, soltou um suspiro.

— Sinceramente, nessa época do ano, tangerina só serve para passar raiva.

Sem pensar muito, jogou o resto da fruta no lixo, demonstrando um certo desprezo pela qualidade do que havia acabado de provar.

Bruno apareceu ao seu lado com aquele sorriso fácil, tentando deixar a situação mais leve.

— Concordo demais! Ainda falta um tempão para a temporada da tangerina melhorar. Vou pedir para tirarem todas as que sobraram daqui! — Ele piscou para Daniela, mostrando que estava do lado dela.

Fabiano Coelho, um dos amigos do Severino, lançou um olhar à tangerina inacabada na mesa e murmurou, confuso:

— Ué, sério? Eu comi agora há pouco e achei até gostoso...

— Eu achei horrível também.

Lucas Dias ajeitou os óculos de armação dourada e, sem pensar muito, lançou um olhar direto, quase de reprovação, para Fabiano, depois pegou com naturalidade todos os gomos de tangerina que estavam na frente do amigo e jogou de vez no lixo.

Assustado com a reação, Fabiano arregalou os olhos ainda mais. Seu rosto, sempre arredondado e com cara de menino, parecia ainda mais surpreso.

— Ei... Lucas... Você...

Ele mal conseguiu reagir, pois Daniela já se levantava do sofá naquele momento. O rabo de cavalo preto dela balançou junto ao movimento firme.

— Gente, aproveitem aí. Eu preciso de um pouco de ar fresco.

No reservado, ainda meio escuro, com a iluminação baixa, ela saiu de lá de boca fechada, quase sem expressão, e, passando os olhos rapidamente por Severino, que estava cada vez mais com a expressão fechada, não hesitou nem um segundo e seguiu direto para a porta.

Quando já estava quase na porta, Mariana chamou sua atenção de um jeito doce e com aquele sorriso impecável de sempre, tentando manter o clima amigável.

— Srta. Daniela, será que você não quer escutar pelo menos a música que preparei antes de sair? Está indo embora tão rápido, será que acha que o meu canto é assim tão terrível? — Sem esperar resposta, Mariana continuou, mordendo discretamente o lábio e voltando o olhar para Severino, soltando a voz com um tom levemente manhoso. — Olha, dizem que até canto bem, viu? Para ser sincera, o Severino escreveu e compôs uma música exclusiva para mim, acredita? Fica só até eu terminar, não custa nada, né?

Sem se abalar, Daniela levantou um sorriso irônico.

— Não vou ficar não. — O olhar dela, afiado, era puro desprezo. — Depois dessa tangerina ruim, só falta me dar enjoo no meio da música...

Abriu a porta e foi embora, sem nem olhar para trás.

A resposta direta de Daniela pegou Mariana de jeito. O sorriso dela travou de repente, e os dedos ficaram ainda mais tensos em volta do microfone.

Vendo Daniela sair, Severino não suportou e tentou correr atrás dela.

— Dani...

— Severino! — No instante seguinte, Mariana foi rápida e o chamou de volta, a voz subindo num tom ansioso. O ruído do microfone ressoou no ambiente.

Severino parou com a mão na maçaneta. Ficou imóvel, sentindo o pedido de Mariana ecoar na cabeça.

Suando na palma da mão, Mariana olhou fixamente para ele, os olhos já ficando úmidos.

— Severino, me ajuda na hora da música? O som aqui está ruim, tenho medo de me enrolar, seria uma vergonha para todos nós...

Enquanto falava, a voz dela foi suavizando cada vez mais, e seus olhos até ganharam um tom avermelhado.

Severino ficou parado, com expressão indecifrável. Olhou pelo vidro fosco da porta e viu Daniela se afastando no corredor. Aquilo o deixou ainda mais sombrio. Sentiu os dedos relaxarem na maçaneta, virou-se e foi na direção do palco.

Mariana nem conseguiu esconder a alegria.

Pegou o microfone com pressa e entregou para Severino, o sorriso agora aberto e reluzente.

Bruno observou tudo meio incrédulo, incapaz de aceitar que Severino realmente não tentaria mais alcançar Daniela.

— Severino, sério que vai deixar ela assim? — Ele questionou, sem conseguir disfarçar sua surpresa.

Mas Severino estava decidido. Ele se manteve ao lado de Mariana, com expressão séria, e respondeu de modo frio:

— Às vezes a Dani precisa mesmo esfriar a cabeça. Está mal acostumada, é bom baixar a bola. E hoje, já que a Mari está animada, vou aproveitar para curtir a noite com ela.

Bruno ficou sem palavras, só observando, atônito, aquela cena.

— Vou lá fora fumar.

Lucas levantou do canto de forma discreta, pegou o cigarro na mesa e, sem se dirigir a ninguém, saiu sem dizer mais nada.

No palco, Severino mal conseguiu disfarçar o incômodo. O nervosismo crescia por dentro enquanto ele encarava o chão, onde uma garrafa de cerveja caída parecia ecoar sua própria irritação. Num impulso, ele apenas deu um chute para o lado, tentando, sem sucesso, livrar-se daquela sensação ruim.

...

Depois de sair da sala, Daniela andou pelo corredor e acabou indo direto para o banheiro. Na verdade, sua intenção era só entregar o presente e ir embora, mas teve receio de acabar estragando o clima de quem estava ali. Por isso, preferiu se esconder no banheiro, jogou algumas partidas no celular para matar o tempo.

Só quando percebeu o pescoço dolorido e se deu conta de que já tinha passado ali uns trinta minutos, resolveu se mexer. Guardou o celular pronta para voltar, dar um tchau rápido e sumir dali.

De repente, ouviu uma voz familiar bem perto dali.

— Eu sempre disse, conquistar o Severino é comigo mesma.

Daniela, que já segurava a maçaneta, parou no mesmo instante. Preferiu se sentar de novo, atenta, e se inclinou levemente para ouvir melhor.

— Você viu as notícias de hoje? Agora todo mundo sabe que Severino é pai do Henry.

Diante da pia, Mariana largou o celular em viva-voz, abriu o estojo de maquiagem e passou a retocar o rosto devagar diante do espelho, como se pouco ligasse para o que estava prestes a acontecer.

— Eu assisti ao vídeo, Mari. Sério, você foi genial. Jogou com a opinião pública, forçando o Severino a admitir que é pai do Henry. — Do outro lado da linha, Raquel Soares, mãe adotiva de Mariana, relaxava de máscara no rosto e elogiava sem reservas. — Mas, olha, esses jornalistas não são baratos. Só para armar tudo, gastei 50 mil.

O movimento da mão de Mariana vacilou por um instante. O olhar refletido no espelho deixou escapar um traço de desprezo, ainda que ela tivesse disfarçado logo em seguida, terminando de arrumar até o último detalhe ao redor do nariz.

— Daqui a pouco te mando 100 mil. O resto você pode ficar, pelo esforço. — Comentou Mariana sem emoção, fechando o pó compacto.

— Beleza. Sabia que podia contar com você, Mari! Você é a melhor, nunca nega nada! — Respondeu Raquel, tentando agradar. — E quando vai contar para galera do seu casamento com o Severino? Seu pai anda se gabando para todo mundo dizendo que o presidente do Grupo Cardoso é o genro dele, mas ninguém acredita. Ele está doido para você contar logo só para calar a boca do pessoal.

Sem levantar muito o olhar, Mariana guardou a maquiagem e pegou um batom para dar o retoque final nos lábios.

— Fala para ele não fazer escândalo. O Severino não quer que essa história do casamento saia agora. O mais importante é eu engravidar, então pede para o pai não inventar moda.

— Tá bom, filha. Você pode contar comigo se precisar de qualquer coisa. — Raquel percebeu o tom impaciente e encerrou a conversa sem se prolongar.

Os olhos escuros de Mariana transbordavam desprezo. Ela lançou um olhar gelado para o celular sobre a pia, guardou o batom e saiu do banheiro sem hesitar.

O silêncio reinava quando, de repente, um toque de celular alto quebrou completamente a calma do ambiente.

— Quem está aí?

A mão de Mariana, que segurava o estojo de maquiagem, tremeu. Com o rosto pálido, ela girou rápido tentando descobrir de onde vinha aquele som, os olhos arregalados e fixos, tomada por uma ponta de nervosismo.
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