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Capítulo 8

Author: Helena Amorim
Ela caminhou até a sala. Eulália já estava tão cansada que mal conseguia manter os olhos abertos.

Pegou a filha no colo, levou ela para o quarto, deu tapinhas em suas costas e colocou o coelhinho rosa de pelúcia em seus braços.

Ajudou a filha a arrumar a mochila e ficou observando o cãozinho amarelo-claro feito à mão no cartaz. Maristela suspirou. Ela decidiu que iria até a ONG de animais no dia seguinte para dar uma olhada.

...

Aureliano jogou o celular na mesa de cabeceira, com uma toalha cinza pendurada no pescoço, e passou a mão rapidamente no cabelo.

Vanessa estava ao lado dele, fazendo várias perguntas seguidas:

— É uma paciente, essa mulher? Pela voz parece jovem... E bonita. Está solteira? Fale com mais carinho. Esse cachorro é dela?

— Vanessa, desde quando você ficou tão curiosa? — Aureliano abaixou o tom da voz e, com as pálpebras pesadas, chamou ela pelo nome.

— Ah, eu só estou preocupada com você.

O homem sorriu levemente e jogou a toalha no sofá. O cabelo preto, curto, estava um pouco bagunçado, caindo sobre a testa.

— Você tem visão de raio-X? Consegue imaginar a aparência só pela voz no celular? Está desperdiçando seu talento no Grupo Martins. Devia trabalhar num centro especializado, afinal, tem esse dom.

— Ela é bonita, não é? — Vanessa logo ficou animada.

— Feia. — Ele respondeu de forma indiferente, se sentou no sofá e abriu o notebook para checar o prontuário.

Sem nem levantar o olhar, disse diretamente:

— Fecha a porta.

— Claro que deve ser bonita. — Vanessa conhecia muito bem o temperamento do irmão mais novo.

Nessas horas, o jeito era dizer o contrário do que ele afirmava. Caminhou alguns passos até se sentar ao lado dele e perguntou, curiosa:

— Maristela... É um nome bonito. Tem foto? Me mostra, por favor.

— Vanessa, desde quando você ficou igual à mãe, tão tagarela? — Aureliano levantou a mão, os dedos longos apontando no ar. — A filha dela já é alta, tem cardiopatia congênita e já passou pelo meu consultório.

— Ela é casada? — Vanessa ficou surpresa. — Então é mesmo paciente? Eu achei que...

Vendo o irmão tão frio e distante, Vanessa, obedecendo às ordens de Marcelo e Rafaela, decidiu insistir:

— Você chegou a encontrar a filha da família Rodrigues? Ela é realmente filha do Sr. Eduardo?

— Sim, encontrei. — Aureliano entregou o celular para ela. — Também já a adicionei no Facebook, conversamos. Pode avisar à mãe que a missão está cumprida.

Vanessa olhou para o irmão com aquela expressão indiferente e entendeu que a situação não era simples. Abriu o celular de Aureliano e deu uma espiada nas mensagens trocadas com Beatriz. Era, de fato, um assunto delicado.

Beatriz perguntava: [Aureliano, você está ocupado hoje? Tenho dois ingressos para um festival de música...]

Aureliano respondeu: [Estou muito ocupado.]

Beatriz perguntou: [Aureliano, uma amiga tem um problema no coração. Pode dar uma consultada nela?]

Aureliano respondeu: [Ela pode marcar consulta.]

Beatriz perguntou: [Aureliano, ouvi dizer que você folga neste sábado. Que tal irmos ao cinema?]

Aureliano respondeu: [Tenho plantão.]

Vanessa leu aquelas poucas mensagens, percebeu o distanciamento e o cuidado do irmão para não se expor, e sentiu uma dor de cabeça surgir.

— Que tipo de mulher você gosta? A Beatriz não te agradou? E as outras? E a filha do diretor Leonardo? Ah, e tem aquela da família Cardoso, né? Como são?

Vanessa estava incomodada com a falta de interesse e frieza do irmão, mas não esperava que Aureliano realmente apresentasse um padrão tão específico.

— Peito grande, cintura fina, pernas longas, pele clara. Ah, não gosto de mulher muito magra, nem de rosto muito chamativo, nem muito baixa. O ideal seria por volta de 1,68m.

Vanessa hesitou por um instante, e de repente uma imagem começou a se formar em sua cabeça.

Olhou para Aureliano. Depois de pensar, falou um nome:

— Tipo a Silvana?

No segundo seguinte, o olhar profundo e escuro do homem a varreu. Aureliano não respondeu mais, apenas fechou o computador e disse:

— Saia.

Ele deu a ordem para que ela saísse.

Embora Vanessa fosse seis anos mais velha que o irmão e atuasse como diretora-executiva do Grupo Martins há muitos anos, às vezes não conseguia lidar com ele. O temperamento de Aureliano era o que mais lembrava o de Marcelo. Se não fosse pela escolha da medicina e pela vontade de não prejudicar a relação fraternal com o irmão mais velho, ele já teria assumido o comando do Grupo Martins.

Ele tinha uma presença imponente e habilidades extraordinárias. Um líder nato.

Quando ela saiu do quarto, foi detida por Rafaela, que a esperava na porta e segurou sua mão para perguntar algo.

Vanessa respondeu com poucas palavras, e Rafaela suspirou:

— Ele está procurando namorada ou uma modelo? Com altura e ainda com medidas tão exatas...

Rafaela orientou a filha:

— Não conte esses critérios para o seu pai. Senão, ele, com aquele pensamento antiquado, vai achar que o gosto dele é vulgar.

— Mãe, você ainda lembra... Quando o Aureliano estava na universidade, ele teve uma namoradinha...

— Lembro sim. Naquela época, por causa dela, o Auri até mandou a Rosália para o exterior... — Rafaela não poderia esquecer. Aquele episódio causou um rebuliço, mas a culpa realmente foi de Rosália.

Ela quase tinha esquecido, mas se essa moça ainda não tivesse se casado, talvez pudesse tentar reatar.

Vanessa sabia bem o que Rafaela queria dizer.

Quando ela mencionou isso, o rosto de Aureliano ficou sombrio num instante.

Ela quis cortar o assunto, mas, vendo a expressão vibrante de Rafaela, preferiu se controlar.

Ela também se lembrava de que, sete anos atrás, pouco depois de o irmão voltar do exterior, eles terminaram, e ela enviou um pacote enorme para ele.

Na época do Ano Novo, quando Aureliano abriu o pacote, ela viu que a moça havia devolvido todas as coisas do relacionamento de três anos, separando tudo com clareza, desaparecendo sem deixar rastro.

Até o valor de uma garrafa de água mineral foi acertado com ele. Foi a primeira vez que Vanessa viu o irmão com uma expressão tão carrancuda.

...

Uma semana passou rápido. Maristela participou da exposição de tecidos da Serra da Lua, acumulando algum material.

Alguns colegas cochichavam.

Ana segurou sua mão:

— Você ouviu? A diretora Beatriz está namorando. É um casamento arranjado, o noivo é de uma família poderosa, uma das principais famílias da Serra da Lua.

Sendo uma das famílias mais influentes da região, Maristela, embora normalmente não se interessasse por fofocas da alta sociedade, não pôde deixar de pensar na família Martins, que dominava o topo social da Serra da Lua.

Ela não gostava muito de algumas atitudes de Beatriz no trabalho, mas não quis opinar sobre a vida pessoal dela.

— Se um magnata de uma família rica gostar da minha amiga, eu vou ser sustentada para sempre. — Ana balançou o braço de Maristela enquanto falava. — Vai lá, usa sua beleza para conquistar alguém.

Maristela sorriu:

— Minha filha já tem seis anos.

Além disso, Maristela não se achava bonita. Mesmo depois de emagrecer, com os elogios dos colegas de trabalho e os olhares de admiração de algumas pessoas na rua, ela não se via como atraente.

Talvez porque, quando era mais gorda, sofreu muita discriminação. A insegurança e a baixa autoestima pareciam estar impregnadas em seu sangue.

— E daí que você tem uma criança? Hoje em dia, a verdadeira raridade é a beleza. — Ana levantou o queixo dela. — Se eu fosse homem, adoraria uma mulher delicada e de traços suaves como você.

Ela ainda passou a mão na cintura de Maristela.

— Que fininha! Como você mantém isso?

Maristela deu um tapinha na mão dela, levando como uma brincadeira.

— Vamos lá, vamos tirar fotos para registro. Esses tecidos precisam ser analisados na reunião de amanhã.

O celular vibrou. Maristela estava fotografando quando isso aconteceu. A exposição estava lotada. Depois de terminar, ela e Ana foram a um restaurante para jantar.

Foi quando viu que tinha uma chamada perdida à tarde. Ao olhar o número, Maristela perdeu o apetite. Era o número de Aureliano.
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