Capítulo 3

Rodrigo ficou em silêncio, observando ela por um longo tempo, até que uma risada baixa escapou da garganta dele. Naquela quietude da noite, o som carregava algo provocante. Ele não tocou mais no assunto e apenas deslizou os dedos pelo rosto dela com delicadeza, dizendo com a voz suave:

— Não é nada. Descansa logo.

Clarissa fechou os olhos de novo e murmurou baixinho:

— Tá bom.

Rodrigo esperou até que a respiração dela ficasse calma e regular, indicando que ela estava dormindo de verdade, antes de sair do quarto com passos leves. Assim que a porta se fechou, Clarissa abriu os olhos devagar e olhou para o luar que entrava pela janela, com uma expressão complexa no rosto.

Provavelmente por ter encontrado Renato duas vezes no mesmo dia, Clarissa não conseguiu dormir bem naquela noite e ficou tendo pesadelos. Quando acordou no dia seguinte, estava sem energia, mas ao ver Marta, forçou um sorriso no rosto.

— Mãe.

— Minha filha. — Respondeu Marta, acenando várias vezes com a cabeça. Depois de cinco anos sem vê-la, não conseguiu segurar as lágrimas ao vê-la de novo. — Clarissa, você sofreu tanto.

Sempre que via a filha, não conseguia evitar lembrar de cinco anos atrás. Quando ela estava deitada na mesa de cirurgia fria, à beira da morte, com os médicos avisando que o estado dela era crítico. Graças a Deus, a filha dela havia sobrevivido.

— Imagina, mãe. — Disse Clarissa com um sorriso doce, abraçando ela e acalmando até que as emoções de Marta se estabilizassem.

Rodrigo desceu as escadas naquele momento e, percebendo o clima pesado, tentou aliviar a situação com uma brincadeira:

— Clarissa, nesses anos que você ficou fora, a Marta quase virou estátua de tanto esperar por você.

Clarissa riu da comparação, e ao ver que Marta também estava sorrindo, finalmente relaxou. Depois do café da manhã, Rodrigo se ofereceu:

— Primeiro dia de trabalho, deixa eu te levar?

— Não vai te atrapalhar? — Clarissa sorriu de canto.

— Nada que você precise é um atraso para mim. — Respondeu Rodrigo, já pegando a bolsa dela. Mas antes de sair, viu Marta chamar Clarissa até a cozinha e olhou para a mulher com desconfiança.

— Rodrigo, preciso te pedir uma coisa. — Disse Marta, olhando para a cozinha antes de baixar a voz. — Agora que a Clarissa voltou, fica de olho nela. Não deixa ela ter contato com o Renato de novo, e com aquela criança também...

Ela não queria passar de novo pela dor de quase perder a filha para sempre. Rodrigo assumiu uma expressão séria e respondeu com firmeza:

— Pode deixar, Marta. Mesmo que você não tivesse falado nada, eu não ia deixar a Clarissa ter contato com ninguém da família Esteves.

Se ele soubesse que abrir mão dela naquela época ia resultar em algo tão terrível, nunca teria feito aquela escolha. Marta finalmente ficou tranquila, e quando Clarissa saiu da cozinha, disfarçou como se nada tivesse acontecido.

Já no carro, Clarissa perguntou de repente:

— Rodrigo, minha mãe falou daquele assunto com você de novo, né?

— Falou. — Confirmou Rodrigo sem negar. — A Marta está com medo de você repetir o mesmo erro.

— Não vou repetir. — Disse Clarissa, olhando pela janela. — Rodrigo, eu já fiz aquela burrice uma vez, e isso já foi mais que suficiente. Além disso, não gosto mais dele.

Naquele momento em que estava na mesa de cirurgia, sentindo a vida escapar aos poucos, ela tinha tomado uma decisão. Se conseguisse sobreviver, ia ficar longe de Renato pelo resto da vida. Rodrigo olhou para ela, tão calma e tranquila, e de repente passou a mão nos cabelos dela com carinho.

— Nossa Clarissa amadureceu mesmo.

Clarissa não negou. Qualquer pessoa que passasse pela sensação de estar à beira da morte aprendia a encarar tudo com mais serenidade.

Quando chegaram ao hospital, Clarissa recusou a oferta dele de entrar junto. Afinal, sob a liderança de Rodrigo, o grupo empresarial dele já tinha expandido para várias áreas, e ele era uma figura importante. O hospital inclusive tinha investimento dele, então se Rodrigo aparecesse por lá, com certeza a direção ia dar um tratamento especial para ela.

Ela não queria aquela sensação de estar usando contatos. Queria conquistar o cargo de chefe de departamento com o próprio esforço. Depois de recusar Rodrigo de novo, Clarissa entrou correndo no hospital para se apresentar. Havia outra mulher que também tinha começado junto com ela no mesmo período.

A moça usava salto alto, vestido justo e cabelos soltos em ondas grandes. Estava encostada na mesa com uma postura arrogante. Quando viu Clarissa, revirou os olhos com desprezo. A hostilidade era evidente, já que as duas estavam competindo pela mesma vaga, e apenas uma ia ser escolhida no final.

Clarissa ficou tranquila mesmo após levar aquela cara feia. Fingiu que não havia visto nada. Após conhecer os respectivos orientadores no escritório, Clarissa descobriu que a outra mulher se chamava Nanda Santos e que havia conseguido entrar no hospital por causa de uma relação com o diretor.

Na porta do escritório, Nanda soltou um resmungo e disse perto do ouvido de Clarissa, com arrogância:

— Você não vai ganhar de mim. Melhor desistir logo!

— Por que eu ia te ouvir? Eu nem te conheço. — Retrucou Clarissa com indiferença, deixando Nanda boquiaberta enquanto se afastava com calma.

Nanda ficou cada vez mais irritada, olhando para as costas de Clarissa e xingando baixinho. Durante todo o dia em que Clarissa estava se familiarizando com o ambiente do hospital, Nanda não parou de implicar com ela. Clarissa não se abalou e continuou conversando com o orientador de forma profissional.

Perto do fim do expediente, a orientadora entregou alguns prontuários para ela e instruiu:

— Acompanha o caso desses pacientes. Já que você tem experiência de estágio, não preciso te ensinar como se comunicar com eles, né?

Clarissa olhou os prontuários com atenção. A orientadora de repente se lembrou de algo e acrescentou:

— Ah, tem uma paciente no quarto VIP que quer ter alta. Dá uma passada lá e conversa com ele.

— Tudo bem. — Respondeu Clarissa, anotando as informações.

Assim que a orientadora foi embora, ela foi sozinha até o quarto. Bateu de leve na porta e, ao ouvir a voz de uma mulher vindo de dentro, empurrou a porta e entrou. Mas quando viu quem estava na cama, o rosto de Clarissa mudou de expressão.

Bianca Esteves também não esperava ver ela ali e ficou paralisada por um instante. Foi quando a porta do quarto se abriu de novo. Renato entrou e, ao ver Clarissa, deixou escapar um lampejo de surpresa nos olhos antes de baixar o olhar para o crachá dela: Hospital de Rio do Norte. Departamento de Cardiologia: Clarissa Correia.

Renato ficou em silêncio por alguns segundos, controlando qualquer reação, e explicou com a voz neutra:

— Minha mãe descobriu um problema no coração esse ano e está internada aqui.

Clarissa baixou os cílios e não olhou para ele, perguntando de forma protocolar:

— É para dar alta?

A voz dela estava fria, e ela franziu levemente as sobrancelhas. Estar no mesmo ambiente que Renato já a deixava desconfortável. Renato manteve o olhar nela e hesitou algumas vezes antes de responder:

— A gente está pensando nisso, mas queremos ouvir a opinião do médico.

— Sugiro que ela faça um exame mais detalhado amanhã e espere o que o médico responsável vai dizer. — Disse Clarissa, e logo se virou para sair do quarto.

Quando ela passou por ele, Renato perguntou de repente:

— Você voltou, mas não vai ver a criança?

Clarissa parou no lugar, sem demonstrar nenhuma emoção, e respondeu:

— Essa é a sua filha. Não tem nada a ver comigo.

Ao ouvir a resposta, o rosto de Renato escureceu, e ele ficou ali parado, observando ela em silêncio. Clarissa se irritou com aquele olhar, baixou os cílios e tentou sair. Renato continuou com os olhos escuros e profundos fixos nela e disse com a voz fria:

— Não precisa ignorar a criança só por minha causa.