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Capítulo 4

Author: Mel Soares
Augusto e Leonor haviam oficializado o namoro apenas no dia anterior, e agora o símbolo do compromisso deles já tinha desaparecido. Era, sem dúvida, um tremendo problema.

Mas Margarida jamais poderia imaginar que isso teria algo a ver com ela.

Suportando a dor latejante na perna, ela seguiu Luísa escada abaixo.

Na ampla sala de estar, Leonor já havia retornado do jardim e chorava desconsoladamente pela perda do seu precioso sapato de cristal, enquanto Augusto a envolvia num abraço protetor, tentando acalmá-la com palavras sussurradas.

No entanto, assim que ele avistou Margarida, toda a doçura em seu olhar desapareceu num piscar de olhos, dando lugar a uma frieza cortante.

— Cadê os sapatos? — Disparou Augusto diretamente, sem hesitação, já tomando partido de Leonor, as sobrancelhas franzidas em acusação.

Margarida contraiu os lábios e lançou um olhar rápido para Leonor, que a encarava com um brilho de malícia mal disfarçado nos olhos marejados. Com a voz firme e articulando cada sílaba com precisão, Margarida questionou:

— Srta. Leonor, você realmente acha que fui eu quem roubou seu sapato de cristal?

— Não foi? — Leonor soltou uma risada cheia de sarcasmo. — Margarida, antes eu te pedi para me acompanhar na visita à propriedade da família Carvalho, mas quando chegamos no jardim, percebi que você estava com aquela sua cara fechada, como se não quisesse estar lá. Tirei os sapatos para brincar um pouco na água sozinha e, quando olhei para trás, você já tinha sumido. E os sapatos também! Margarida, sei que você vem de família humilde e nunca viu nada de valor, mas precisava mesmo ser tão desonesta?

Leonor lhe lançou um olhar acusador, os lábios tremendo numa encenação perfeita de indignação, como se estivesse diante da mais vil criminosa.

Sentado no sofá, o rosto de Augusto se fechou ainda mais, uma sombra de decepção escurecendo suas feições.

Margarida teve que conter o impulso de revirar os olhos. A tentativa de Leonor de incriminá-la era tão absurda que beirava o cômico. Então, indicando a direção do jardim com um gesto calculado, ela sugeriu:

— E as câmeras? O jardim não tem sistema de segurança?

— Hoje estão desligadas para manutenção. — Explicou Luísa, levantando-se do sofá.

A família Carvalho fazia atualização de segurança todo ano, e justo aquele dia o sistema estava passando por reconfiguração. Tinha câmera, sim, mas não gravou absolutamente nada.

Isso significava que Margarida havia perdido a única prova concreta que poderia inocentá-la.

Coincidência? Margarida cravou o olhar em Leonor, recordando-se de como ela parecia perfeitamente à vontade no jardim, como se já conhecesse cada cantinho daquele lugar. Mas Leonor permanecia impassível, sustentando uma postura provocadora, o queixo ligeiramente erguido em desafio.

— Está procurando câmera por quê? Você sabe muito bem que estão desligadas hoje. Está só fingindo ser honesta, né? — Leonor rebateu com desprezo, um sorriso venenoso dançando nos cantos da boca. — Mas ninguém aqui vai cair nessa sua encenação, Margarida! Você roubou os sapatos de cristal, que tem um valor especial para mim e para o Augusto, só para me forçar a sair da família Carvalho. Então é isso? Pois bem, eu vou embora! É isso que você queria, não é?

Ao dizer isso, Leonor fez menção de se levantar do sofá sair dramaticamente, mas Augusto segurou sua mão delicada antes que ela pudesse dar o primeiro passo.

No meio daquele silêncio carregado de tensão, ele encarou Leonor com um olhar repleto de carinho, tentando transmitir calma, mas, em seguida, se voltou para Margarida com olhos gelados.

— O que pertence a alguém, deve permanecer com esse alguém. E você não pode forçar a Leonor a sair da família Carvalho. Entregue os sapatos, Margarida. Não me obrigue a contar tudo para meu pai e pedir que ele resolva isso à maneira dele.

Carlos Carvalho, pai de Augusto e presidente do poderoso Grupo Carvalho, era um homem de temperamento rígido e decisões implacáveis. Se essa história de roubo chegasse aos seus ouvidos, Margarida certamente enfrentaria consequências severas.

Luísa, que até então permanecia dividida entre defender a filha ou não se envolver, ficou visivelmente mais aflita ao ouvir a menção de que o marido poderia descobrir o ocorrido.

Contudo, Margarida se manteve em silêncio, seus olhos perscrutadores passando por cada rosto na sala até se fixarem em Leonor, que sorria vitoriosa por trás do ombro de Augusto. Naquele instante revelador, Margarida compreendeu que qualquer explicação seria como jogar palavras ao vento.

Então, em meio às acusações e ao burburinho crescente, ela simplesmente tirou o celular do bolso e, sem nem ao menos piscar, arremessou-o na direção de Leonor.

— Chama a polícia.

O ambiente mergulhou num silêncio absoluto e imediato. Até as empregadas que espiavam discretamente da entrada ficaram boquiabertas, os olhos arregalados de espanto, incapazes de acreditar que Margarida havia realmente proposto aquilo.

Leonor, que até ali estava toda confiante, levou um susto quando o celular caiu do lado do pé dela. Sua expressão empalideceu num instante, como se todo o sangue tivesse abandonado seu rosto, e ela cambaleou para trás, quase perdendo o equilíbrio.

Interpretando aquilo como um sinal de que ela havia se machucado, Augusto rapidamente a segurou pela cintura e lançou um olhar de profunda reprovação na direção de Margarida.

— Que palhaçada é essa?

— Nenhuma. — Margarida devolveu com um sorriso gélido, os olhos brilhando com determinação. — Só estou oferecendo uma solução prática. A Srta. Leonor não está afirmando que roubei os sapatos? Então chama a polícia e deixa que eles investiguem o caso como deve ser.

— Você tem noção das consequências de trazer a polícia até aqui? — Augusto baixou o tom, incrédulo com a ousadia dela. — Se a polícia entrar nesta casa, a reputação do Grupo Carvalho vai por água abaixo num piscar de olhos. As pessoas vão especular, a imprensa vai cair em cima, e isso pode prejudicar seriamente os negócios. Você acha que tem condições de arcar com um prejuízo desse tamanho?

— Não sou eu que tenho que arcar com coisa alguma. — Retrucou Margarida, o sarcasmo pingando de cada palavra. — Essa confusão toda foi a Leonor quem criou. Ela é a nobre herdeira da família Almeida, então que ela resolva o problema que inventou. E já que está tão certa do que diz, por que não chama a polícia agora mesmo? Ou será que está com medo de algo?

Ainda segurando o celular com dedos trêmulos, Leonor hesitou visivelmente.

Alguns dos presentes que antes acreditavam piamente em suas palavras começaram a demonstrar sinais de dúvida, enquanto ela própria parecia perder o chão sob seus pés caros.

Com o semblante cada vez mais fechado, Augusto deu um passo ameaçador à frente para advertir:

— Margarida, já basta!

— Não, não basta. — Margarida o encarou com firmeza inabalável, sem uma única gota de medo no olhar. — Ontem, eu disse que ia te dar uma última chance de escolha. Agora, a decisão está em suas mãos. Esses sapatos foram escondidos de propósito pela própria Leonor para me incriminar. Você acredita ou não?
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