Share

Capítulo 3

Author: Nina Prado
Do lado de fora da sala de cirurgia, o tempo parecia arrastar-se sem fim.

Vitória andava de um lado para o outro, ansiosa, os olhos fixos na porta fechada.

Por fim, a porta se abriu.

Cristiane foi empurrada para fora em uma maca, inconsciente, o rosto ainda marcado por lágrimas secas. Nos lábios pálidos, viam-se as marcas sutis da mordida que ela dera em si mesma.

— Cris! — Vitória correu até ela, o coração apertado.

O médico retirou a máscara, o semblante carregado.

— A cirurgia foi bem-sucedida. Mas o corpo dela está muito frágil. Precisa de repouso absoluto, senão... Pode ser difícil engravidar novamente.

As palavras atingiram Vitória como uma punhalada. Olhou para a amiga adormecida e as lágrimas escorreram sem controle.

"Minha Cris, tão boa... Como foi cair nas mãos desse canalha do Henrique?"

Quando Cristiane acordou, já era tarde.

A mãe de Vitória, Dona Júlia, entrou trazendo uma tigela de canja quente.

— Cris, querida, você acordou. Vem, toma um pouco de sopa para se fortalecer. — O olhar dela era puro carinho diante da palidez da jovem.

— Obrigada, madrinha... — Cristiane tentou sorrir, esforçando-se para se erguer.

— Não, não, fica quietinha. Deita-se. Eu te ajudo. — Júlia a apoiou com delicadeza, soprou a colher para esfriar o caldo e levou até a boca dela.

O coração apertava...

"A menina perdera o bebê de forma tão cruel, tão repentina..."

Cristiane bebia devagar, goles pequenos. O calor da sopa lhe aquecia o estômago, mas os olhos se enchiam de lágrimas.

Lembrava com nitidez: quando ficara sem família e sem rumo, viu Vitória sendo intimidada na volta da escola, então ela a ajudou. Depois disso, Vitória levara-a para casa, e a família Silva a acolhera como se fosse uma filha.

Júlia, principalmente, sempre a tratara como tal.

Enquanto isso, Vitória falava ao telefone, a voz baixa mas carregada de fúria.

— Roberto Costa! Escuta bem: se você continuar andando junto com aquele lixo do Henrique, acabou! Eu termino tudo agora. O noivado está cancelado, e você nunca mais vai me ver na vida!

Desligou bruscamente, atirando o celular sobre a mesa. O peito subia e descia, tomado pela raiva.

Cristiane olhou para a amiga.

— Vi, não briga por minha causa...

— Isso não tem nada a ver com você! — Vitória a interrompeu, furiosa. — Eu não aguento mais o Roberto com essa falta de postura! O Henrique destruiu a sua vida, e ele ainda anda de braço dado com ele? Dá para acreditar? De que lado ele está afinal?

A família Silva e a família Costa tinham um acordo de casamento. Desde os dezoito anos, Vitória e Roberto estavam noivos.

Mas o gênio de princesa de Vitória nunca mudara, o que deixava Roberto à beira da loucura.

Naquele mesmo momento, no salão privativo do clube mais exclusivo da Cidade N.

A música baixa e envolvente preenchia o ambiente, misturada ao cheiro de perfumes caros e de álcool que pairava no ar.

Roberto olhava para o celular, atônito.

— Mas o que foi agora? — Resmungou, encarando Henrique com um ar inocente. — Disse que se eu continuar andando com você, ela termina comigo!

Henrique segurava a taça de uísque. Os dedos longos giravam devagar o líquido âmbar. Ao ouvir a reclamação, ergueu apenas uma sobrancelha, sem mudar a expressão.

Marcelo Rodrigues, sentado ao lado, caiu na risada:

— Eita, Roberto, o bicho pegou pro seu lado! Parece que a sua princesa tem bronca do Rick, hein? Tá aí a sua chance: ou ela ou ele.

Roberto passou a mão pelos cabelos, impaciente.

— Quem entende as crises dela? Não liga não... Vamos beber.

Foi então que a porta da suíte se abriu.

Uma mulher de vestido vermelho justo, alças finas e curvas exuberantes entrou com passos firmes. Era Maria.

Herdeira da família Mendes e estrela do momento, estava em todas as capas de revista. Só na noite anterior, após a festa de aniversário que Henrique lhe oferecera, já havia ganhado mais dois milhões de seguidores. Brilhava como uma estrela intocável.

E se casasse com o Henrique, Maria se tornaria a mulher mais poderosa e respeitada da Cidade N.

A senhora do magnata. A verdadeira primeira-dama da fortuna. Só de pensar nisso, já sorria.

Ela caminhou direto até Henrique, ignorando os olhares de espanto e inveja. Sentou-se ao lado dele, passou o braço pelo seu e repousou a cabeça em seu ombro.

— Rick, na festa de aniversário do Grupo Carvalho neste fim de semana... Posso ser a sua acompanhante?

Não queria mais se esconder. Três anos de espera já eram demais.

O olhar de Henrique suavizou-se.

— Amanhã mando alguém escolher um vestido para você.

O sorriso de Maria iluminou o rosto.

— Eu sabia... Você é o melhor.

— Um brinde à Mia, está quase oficial! — Marcelo ergueu a taça.

Roberto riu, entrando na provocação:

— É, pelo visto o acordo dos três anos está acabando. Mia, você enfim vai colher o que plantou.

Não era segredo: tanto Marcelo quanto Roberto preferiam Maria. Nunca tinham visto Henrique levar Cristiane a lugar algum.

E como o casamento de Henrique era secreto, para o mundo exterior era como se nem existisse.

Maria ergueu a taça com naturalidade e brindou com os rapazes.

— Obrigada, Marcelo, obrigada, Roberto.

Na Cidade N, quatro famílias dominavam tudo. E, naquela noite, três dos herdeiros estavam ao lado dela. Assim que o casamento de Henrique e Cristiane fosse oficialmente encerrado, ela poderia entrar para a família Carvalho de cabeça erguida, como a esposa legítima.

De repente, o celular de Marcelo vibrou com uma notificação. Ele olhou para a tela e, no mesmo instante, quase saltou do sofá de tanta euforia.

— Caramba! N vai voltar!

Levantou o aparelho no ar, mostrando a tela iluminada, onde o título em negrito chamava atenção:

"Fundador da OnçaTech, N confirma presença no congresso médico mundial do próximo mês!"

A voz de Marcelo saiu carregada de incredulidade e alegria. Os olhos marejados denunciavam a emoção.

— Minha vó tem salvação! Isso é maravilhoso!

A matriarca da família Rodrigues sofria de câncer de pulmão e tinha poucos dias de vida.

Aquela notícia caía como uma bênção em meio ao desespero.

Os rapazes ao redor se agitaram ainda mais, as vozes cruzando em um burburinho eletrizante.

— N? Você tá falando daquela pessoa que, três anos atrás, criou a fórmula de tratamento contra o câncer, virou uma lenda e depois desapareceu do nada?

— Meu Deus! Então ele resolveu aparecer de novo? Eu já achava que tinha sumido para sempre, como se tivesse subido aos céus!

— OnçaTech, claro! Ele é uma lenda viva da medicina! Aquela fórmula, três anos atrás, arrancou inúmeros pacientes graves da beira da morte!

— Isso mesmo! Foi ele! Surgiu como um meteoro, deixou a fórmula e sumiu sem deixar rastro. Se agora vai reaparecer... Isso vai explodir no próximo congresso mundial de medicina!

Não muito longe, Henrique ergueu o olhar. Nos olhos profundos, brilhou um clarão intenso, como se uma chama tivesse sido acesa.

O Grupo Carvalho já era referência no setor médico nacional.

Henrique construíra um sistema de saúde inteligente, líder absoluto no país. Em apenas quatro anos, se tornara o homem mais rico da Cidade N. Sob sua liderança, a empresa expandira negócios para mais de oitenta países. Ele era, de fato, um escolhido do destino.

Mas... N!

Aquele nome não representava apenas uma revolução científica, mas também uma força quase mítica.

Para ele, N era como uma ilha misteriosa que exalava poder e atração irresistível...

Se conseguisse unir o Grupo Carvalho a ele, a posição da empresa no cenário global seria imbatível.

Os dedos de Henrique apertaram de leve a taça que segurava. Um sorriso confiante, predador, se desenhou no canto dos lábios.

— Ouvi dizer que o método de N é a "terapia genética"! — Acrescentou Roberto, empolgado. — Usa edição de genes combinada a biotecnologia para atacar as células cancerígenas com precisão. Incrível!

Todos falavam ao mesmo tempo, exaltados, imaginando o impacto devastador do retorno de N. O entusiasmo dominava o ambiente.

N. O maior cientista vivo do planeta. Um valor incalculável.

Foi então que a porta do salão se abriu devagar.

Um garçom jovem entrou, equilibrando uma bandeja. Caminhava com cuidado, tentando não chamar atenção.

Mas, ao ver os três herdeiros mais poderosos da Cidade N reunidos, ficou tão nervoso que tropeçou.

O corpo tombou para a frente.

A bandeja voou.

Copos caíram no chão com estrondo.

— PÁÁÁM!

O som agudo do vidro estilhaçado cortou o ar, quebrando a euforia.

Maria, que estava mais próxima, não teve tempo de reagir.

— Ah! — Gritou, sobressaltada.

O grito curto ecoou, mas Henrique reagiu no mesmo instante. No exato momento em que o vidro estourava, ele a puxou para dentro de seus braços.

O corpo dele serviu de escudo contra os estilhaços que voavam em direção ao rosto dela. Ainda assim, dois fragmentos finos cortaram a pele clara da mão de Maria, deixando um rastro de sangue vivo.

Henrique franziu o cenho. Ao ver o corte aberto e o vermelho escorrendo, o rosto dele escureceu imediatamente.

— Maldição! — Rosnou.

O olhar afiado se voltou para o garçom, que tremia pálido, paralisado pelo medo. A voz de Henrique saiu como uma lâmina de gelo:

— O que está esperando? Cai fora daqui, agora!

O rapaz estremeceu, quase tropeçando ao sair em disparada.

— Rick... — Maria soluçou, aninhada em seus braços. — Minha mão... Dói tanto...

As lágrimas brilhavam nos olhos dela, prestes a cair.

— Não tenha medo. Vou levá-la ao hospital. — Desta vez, a voz de Henrique suavizou-se.

Com cuidado, evitou tocar a mão ferida. Depois a ergueu no colo, em um movimento firme, e deixou o salão sem olhar para trás.

No hospital, o cheiro de antisséptico dominava os corredores silenciosos. Apenas o som dos passos ecoava no piso encerado.

Henrique a deixou aos cuidados da equipe médica. Assistiu de perto enquanto tratavam o ferimento e faziam o curativo.

Maria, com o rosto pálido e os olhos úmidos, parecia ainda mais frágil. Henrique respirou fundo, conteve a irritação e murmurou algumas palavras de consolo, pedindo que descansasse no quarto.

Ao sair, caminhou até a curva do corredor.

Foi então que, de relance, notou uma porta entreaberta. E dentro dela...

Uma silhueta conhecida.

Henrique parou de repente. O coração disparou.

Lá estava ela, deitada numa cama branca. O rosto pálido, sereno, os olhos fechados. Os cílios longos projetavam sombras suaves sobre as maçãs do rosto. O braço delicado sustentava uma agulha de soro, por onde o líquido transparente descia gota a gota.

"Cristiane.

Ela... Aqui? Internada?"

Um turbilhão de emoções tomou conta dele, esmagando o peito como se uma mão invisível o tivesse agarrado à força.

Sem pensar, empurrou a porta e entrou.
Continue to read this book for free
Scan code to download App

Latest chapter

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 100

    — O restaurante preferido da Cris, o Encanto, as flores de lírio que ela mais amava... Tudo foi manchado por aquela sua santinha de vitrine, você...Vitória perdeu totalmente o controle da língua. Wellington, assustado, correu para tapar-lhe a boca.Mesmo assim, dois seguranças já a agarravam pelos braços, carregando-a para fora. Ela se debatia, chutando para todos os lados, como se fosse capaz de despedaçar o mundo inteiro."Meu Deus... Se essa pequena senhorita tivesse poder bélico, já teria aberto um buraco no universo com esse fogo cruzado."Quando finalmente a retiraram dali, o silêncio caiu como um peso.Mas as palavras dela continuaram a ecoar nos ouvidos de Henrique.O restaurante preferido de Cristiane era o Encanto. Ele nunca a tinha levado lá. Pelo contrário: foi justamente naquele lugar que fechou o espaço inteiro para anunciar publicamente o relacionamento com Maria.Só agora percebia... O quanto lhe devia.Mesmo quando ela sofreu um aborto, não lhe ofereceu o mínimo de cu

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 99

    O sorriso no rosto de Maria congelou por um instante. Rapidamente, ela recompôs a expressão e assumiu uma confusão calculada, na medida certa.— Achei que fosse algum grande problema. É só aquela... Empregada do Solar do Mar.O semblante de Henrique se fechou ainda mais.Maria continuou a se explicar, falando devagar, sem pressa. Disse que a tal empregada era filha de uma prima de sua mãe e que, no passado, havia salvado a vida dela. Desta vez, a confusão tinha acontecido porque a mulher roubara mais de trinta mil do patrão. Depois disso, a família aparecia todos os dias, implorando em lágrimas para que Maria intercedesse.Cansada daquilo, ela apenas mencionara o assunto a Henrique. Se ele realmente se importava, poderia devolvê-la para ele, sem problemas."Devolver!"Henrique a ouviu falar com tamanha convicção que chegou a vacilar. "Será que Maria realmente não sabia nada sobre o verdadeiro crime cometido por Camila?"Ele a conhecia havia tantos anos. Sim, ela era mimada e caprichos

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 98

    Sangue.Um vermelho gritante.Na tela, as imagens eram tão grotescas que pareciam retiradas de um filme de terror barato.Mas Henrique sabia: tudo aquilo era real.Tinha acontecido.Acontecido com ela.A mão dele, apoiada na borda da mesa, fechou-se de repente num punho.As veias saltaram, grossas e tensas, como cordas prestes a arrebentar.Os nós dos dedos ficaram esbranquiçados de tanta força.Wellington permanecia alguns passos atrás, a cabeça levemente baixa, mas os olhos de soslaio não se desgrudavam das costas rígidas do patrão.O ar parecia solidificado.Só se ouvia, de tempos em tempos, o ruído abafado vindo do vídeo e a respiração cada vez mais pesada de Henrique.O olhar dele estava colado à tela.E então viu.Aquela repugnante lagartixa de quatro patas, viscosa, rastejando pelo chão… Até alcançar o corpo dela, subindo devagar.O corpo dela tremeu de leve.Os olhos se fecharam suavemente.Nada mais.O coração de Henrique foi apertado por uma mão invisível, torcido até doer.D

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 97

    No chão, um copo de vidro jazia em mil estilhaços.Ao vê-lo entrar apressado, o rosto de Cristiane se tingiu de leve constrangimento. Murmurou uma desculpa:— Eu… Deixei cair sem querer.A expressão rígida de Henrique se suavizou. Em poucos passos, aproximou-se e, sem dar-lhe chance de recusa, voltou a erguê-la nos braços.— Desajeitada… — Resmungou baixo, descendo com ela pelas escadas.No andar de baixo, a mesa estava posta com um farto café da manhã, misturando pratos ocidentais e orientais. Uma empregada trouxe uma tigela de canja.— Senhora Cristiane, este caldo foi preparado especialmente a pedido do senhor Henrique.O semblante dela escureceu de imediato. Nada disse.Henrique dispensou a funcionária com um gesto e afirmou:— Nada do que aconteceu antes vai se repetir. Aqui, todos são de confiança. Foram escolhidos pessoalmente por Wellington. Se houver algum problema… Eu mesmo arranco a cabeça dele!"Tenho motivos pra achar que ele só tem ciúmes da minha cabeça bem-feita", penso

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 96

    Vinte minutos depois, o helicóptero pousou suavemente na Fazenda Vale Verde.Ficava a apenas vinte quilômetros do centro da Cidade N, cercada por montanhas verdes e águas cristalinas, com uma vista ampla e deslumbrante.Para Henrique, também era conveniente: dali podia cuidar dos negócios da empresa com facilidade.Era uma montanha que ele havia comprado anos atrás, planejando transformá-la em um resort de luxo.Mas, quando o avô adoeceu, desistiu da ideia e mandou construir ali uma mansão, entre rios e colinas.Havia jardins preciosos, tratados com o maior cuidado, uma horta orgânica, até mesmo um haras.Tudo respirava um ar de tranquilidade e luxo, feito sob medida para repouso e cura.Mas o Sr. Fernando era apegado ao passado e nunca se acostumara com aquele lugar.Preferia a casa da família.Assim, a mansão permanecera vazia por todo esse tempo.A porta da cabine se abriu.Henrique inclinou-se e, com os dedos longos, desatou o cinto de Cristiane.Logo a envolveu com o braço, pronto

  • Adeus, Esposa do Bilionário   Capítulo 95

    Cristiane não disse nada. A ponta dos dedos deslizava pela tela, acariciando levemente o lugar onde Henrique havia se ferido.Aquele sangue era real. Aquela dor também.— Ao ver que a senhora estava em perigo, ele sofreu mais do que qualquer um. — Continuou Wellington em tom grave. — A senhora sabia que ele também se machucou gravemente? Mas não deixou que ninguém contasse a você."Não deixou? Por quê?"A mente de Cristiane ficou em turbilhão. Por que ele escolhera o silêncio? Por que encobrir Maria?— Se não fosse pela chantagem de Maria, usando uma antiga dívida de gratidão, o Sr. Henrique jamais teria ajudado ela de novo.As palavras de Wellington caíram como uma pedra pesada no lago já revolto do coração de Cristiane.— Dívida? Que dívida? — Finalmente ela falou, a voz seca. Levantou os olhos para encarar Wellington, o olhar cheio de confusão e de busca.Wellington hesitou, ponderando até onde podia falar. Mas duas batidas na porta o interromperam.Rapidamente ele fechou o tablet e

More Chapters
Explore and read good novels for free
Free access to a vast number of good novels on GoodNovel app. Download the books you like and read anywhere & anytime.
Read books for free on the app
SCAN CODE TO READ ON APP
DMCA.com Protection Status