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Capítulo 0003

Author: Luna Santos
Eu dei um sorriso sarcástico, cheio de desdém.

— Henrique, quantas vezes eu tenho que te repetir? Eu estou quase morrendo. Não há tempo para esperar pelo próximo rim.

Essas palavras fizeram Henrique explodir. Com força, ele me empurrou até a cama e, quase gritando de raiva, disparou:

— Pra tanto drama por causa de um rim? Se você insiste que já vai morrer, então vá morrer!

Depois de lançar essas duas frases como se fossem descartáveis, ele saiu do quarto sem se virar.

Não demorou muito até eu ouvir o som de um carro arrancando lá embaixo. Henrique havia deixado a casa.

Não pude segurar o que veio, uma súbita tosse, seguida de sangue. Logo depois, perdi a consciência, caindo pesadamente sobre o colchão.

Sem saber quanto tempo havia se passado, fui acordada pelo insistente toque do telefone.

Meus olhos se abriram vagarosamente. Eu nem queria atender, mas o telefone fixo na cabeceira insistia sem parar.

Assim que atendi, ouvi a voz sarcástica e carregada de malícia da Mariana do outro lado da linha:

— Mana, o que você está achando de ficar sozinha, presa nessa casa de campo?

Minha ausência de resposta pareceu apenas encorajar Mariana. Com um tom provocador, ela continuou:

— O Rick me contou que esse telefone foi configurado especialmente. Dá pra atender, mas não dá pra ligar. Então, esquece essa ideia de pedir socorro.

Aquelas palavras me feriram como agulhas finas perfurando o coração, uma dor que me deixava quase sem ar.

Henrique, para evitar que eu atrapalhasse a cirurgia de Mariana, havia me confinado naquela casa, cortando todo o contato com o mundo exterior.

Eu me perguntava, com amargura, como pude me apaixonar por um homem assim durante oito longos anos.

— Mana, você não faz ideia... Enquanto você lutava pra respirar na UTI, o Rick não estava te acompanhando nos momentos em que você precisou. Ele estava ao meu lado. Ele dizia que, ao me ver chorar, não hesitaria em entregar o mundo inteiro... Inclusive, a sua vida...

Não perdi tempo. Encerrei a ligação de forma abrupta.

Senti um nó na garganta, o nariz arrepiado e, logo, meus olhos se encheram de lágrimas.

Apressadamente, baixei o olhar e as lágrimas escorreram, molhando a colcha com marcas úmidas e silenciosas.

Aquela internação na UTI foi o momento em que estive mais perto da morte.

Foi ouvindo as enfermeiras conversando ao lado do meu leito que descobri:

Quem assinava meus avisos de agravamento era minha mãe.

Ela vinha às pressas só pra assinar… E logo ia embora.

A forma como elas falavam deixava tudo ainda mais claro.

Havia pena na voz. Um tipo de compaixão silenciosa:

— Que pena dessa paciente... Nem mesmo um parente apareceu pra vê-la na UTI.

— O médico pediu pra mãe ficar, mas ela alegou que tinha que cuidar da outra filha, que tinha quebrado a perna. Mandou o hospital chamar uma cuidadora. Ah, fala sério! Isso é preferência escancarada. Cair e machucar a perna é grave, mas... Mais do que alguém na UTI?!

— E ouvi dizer que a irmã tem um namorado rico cuidando dela. Nem seria necessário que a mãe se importasse com ela.

Deitada ali, de olhos fechados e com o tubo de oxigênio preso ao rosto, senti uma tristeza tão profunda que parecia que faltava um pedaço de mim. Uma dor que apertava o peito até quase me sufocar.

Naquele momento, me perguntei: “Quando a Mariana começou a ter um namorado?”

Dois dias após minha transferência para uma enfermaria comum, Henrique finalmente apareceu.

Com um gesto grandioso, ele me transferiu para uma ala mais sofisticada do hospital.

Ele explicou que tinha estado em viagem internacional e não pôde voltar a tempo.

Eu acreditei em suas palavras. Ao me envolver em seus braços, aquela sensação de amargura se dissipou temporariamente.

— Rick, eu achei que seria o nosso adeus... Se eu não visse você pela última vez, até no mundo dos mortos, eu não conseguiria ficar em paz.

Henrique me abraçou apertado, beijou minha testa e, com voz baixa, prometeu:

— Sabi, não diga essas coisas que me assustam. Eu não vou deixar nada acontecer com você. Vou estar sempre ao seu lado.

Mas, enquanto minhas lembranças se misturavam com a amarga realidade, meus olhos se fixaram no rastro de sangue no chão.

Com um sorriso pálido, em meio à angústia, perguntei:

— Henrique, você me prometeu que nunca me deixaria... Agora, eu estou morrendo, onde você está?
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