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Capítulo 3

Autor: Ginse
No dia seguinte.

O toque insistente do telefone fixo da mansão arrancou Elisa de um sono profundo e pesado. Ainda meio tonta, com os olhos ardendo de cansaço, ela atendeu com a voz rouca e fraca:

— Alô, quem fala?

— Elisa? O que aconteceu com você, amiga? Está doente? — A voz preocupada de Susana Pinto, sua melhor amiga, veio do outro lado da linha, carregada de urgência.

Elisa não tinha como explicar que passara a noite inteira sendo "massacrada" por Daniel. Tentou disfarçar como pôde:

— É só uma gripe. Por que está ligando?

— Como assim por quê? Você esqueceu? A gente combinou de comemorar o divórcio hoje! Estou te esperando no restaurante faz um tempão! Liguei mil vezes para o seu celular e nada...

Antes que Susana terminasse de falar, Elisa se sentou de sobressalto na cama. Olhou para o relógio na parede e sentiu um frio percorrer sua espinha. Onze horas. O horário combinado com Daniel para ir ao cartório assinar o divórcio havia passado há mais de uma hora.

Ela olhou em volta, procurando por ele no quarto vazio. Nem sinal de Daniel. O homem já tinha sumido, como sempre fazia.

...

Restaurante Meia-Lua.

Susana encarava a mão de Elisa, ainda coberta por uma faixa de gaze branca. Quando ouviu toda a história do ferimento na cozinha e da ida ao hospital, ficou completamente possessa.

— Esse desgraçado do Daniel ainda se acha homem? — Gritou Susana, batendo a palma da mão na mesa com força. — A esposa se machuca, precisa da assinatura dele para operar, o cara não atende o telefone e ainda está lá, trocando carinho com a amante! E depois te faz passar vergonha na frente dela? Ah, não, eu matava!

A voz dela ecoou alta demais, atraindo olhares curiosos das mesas ao redor. Elisa se encolheu na cadeira e colocou a mão boa diante do rosto, querendo desaparecer.

— Fala baixo, pelo amor de Deus, Susana...

— Falar baixo o caramba! — Susana estava em ponto de ebulição, as bochechas vermelhas de indignação. — E você ainda vem me dizer que não se divorciou? Está louca? Vai esperar o quê, o Natal para isso?

— Não é que desisti do divórcio. — Elisa tentou explicar, mexendo no guardanapo sobre a mesa. — É que... não deu tempo.

— Não deu tempo? — Susana arregalou os olhos, incrédula. — Não me diga que você dormiu demais depois de tudo que aconteceu?

Elisa assentiu, sem graça, sentindo o rosto esquentar.

Susana bufou e cruzou os braços:

— Três anos casada e o homem nem te encostou. Aí, justo antes do divórcio, você resolve dormir com ele? Foi o quê, um último adeus na cama?

Elisa corou até a raiz dos cabelos e murmurou, olhando para o prato vazio:

— Ué... não pode ter uma transa de despedida?

Um riso abafado soou atrás delas. Elisa virou o rosto devagar e sentiu o sangue gelar nas veias.

Era Daniel.

De terno impecável, acompanhado de Vicente Navarro, seu melhor amigo, e, claro, Renata, a mulher que sempre o rondava como uma sombra.

O riso anterior vinha de Vicente, que parecia se divertir com a situação. Daniel, porém, estava com a expressão dura de sempre, os olhos fixos nela com uma intensidade perturbadora. E Renata... essa parecia ter levado um soco no estômago, o rosto pálido e os lábios apertados em uma linha fina.

Afinal, ela mesma havia mandado o vídeo para Elisa na noite anterior, querendo humilhá-la com as imagens de sua intimidade com Daniel. E agora descobria que ele, aquele homem frio e controlado, havia dormido com Elisa logo depois. Por quê?

Renata se lembrava bem de como Daniel sempre foi racional, contido, quase inatingível em suas emoções. Mas com Elisa, ele havia perdido o controle. Isso só podia significar uma coisa que ela não queria admitir.

Três anos fora do país. Três anos em que Elisa ficou ao lado dele, todos os dias, cuidando dele. Será que o tempo fez Daniel se apegar a ela? A ideia lhe corroeu o peito de raiva e ciúme.

Sem perceber o que se passava na cabeça de Renata, Vicente, querendo se divertir às custas de Daniel, perguntou a Elisa com um sorriso provocador:

— E então, Sra. Carvalho? Essa tal transa de despedida foi boa?

Elisa não pretendia responder à provocação. Mas quando viu o olhar de Daniel fixo nela, frio e ameaçador, como quem dizia "fala uma besteira e eu te mato", uma onda de provocação lhe subiu à cabeça. Ela estava cansada de se encolher, de ter medo, de se calar.

— Ah... foi mais ou menos. — Disse ela com um ar displicente, dando de ombros.

A reação foi imediata e poderosa. O olhar de Daniel escureceu como uma tempestade prestes a estourar.

Qualquer homem ficaria irritado com uma resposta dessas, mas Daniel, o intocável, o orgulho da elite de Ispala, parecia prestes a explodir de raiva contida.

Elisa, porém, não desviou o olhar dessa vez. Ele a encarava como se quisesse devorá-la, e ela, firme e decidida, revidou sem piscar, cansada de sempre se encolher diante dele.

Daniel quase riu. A mulher que até ontem se calava diante dele e aguentava tudo agora o enfrentava com insolência. Devia ser isso, pensou com amargura. Agora que a tia dele morria e o dinheiro cessava, ela não precisava mais fingir docilidade.

— Três da tarde. — Daniel disse apenas, jogando as palavras como uma sentença final.

Virou-se e saiu do restaurante, sem olhar para trás, como se até respirar o mesmo ar que ela fosse uma ofensa insuportável.

Renata apressou o passo para alcançá-lo, mas não resistiu. Antes de sair, lançou a Elisa um olhar cheio de ódio venenoso, como se prometesse vingança.

— Coragem a sua, viu? — Vicente comentou, ainda divertido com a situação, inclinando-se para a mesa delas. — Falar mal do desempenho do Daniel... você é uma heroína. Ninguém nunca teve coragem de fazer isso.

Elisa nem respondeu. Ficou ali por um instante, absorvendo o silêncio pesado que ficou depois da tempestade.

"Três da tarde."

Então era isso. O divórcio estava marcado para hoje mesmo. Pela primeira vez em muito tempo, Elisa sentiu o estômago roncar de fome de verdade.

Ela tinha vontade de comer novamente.
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