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Capítulo 5

Autor: Ginse
— Eu sei. — Respondeu Elisa, respirando fundo antes de continuar. Ela sabia melhor do que ninguém o risco que estava correndo. — Mas não tinha outra saída. A gente vai se divorciar hoje, e não vou mais estar por perto dele. Não sei quanto tempo o corpo dele ainda vai levar para eliminar o resto do veneno sozinho... e se acontecer alguma coisa, todo o meu esforço desses três anos vai ter sido em vão.

— Acontecer alguma coisa? — Tiago franziu o cenho, impaciente com a justificativa dela. — Ele é o novo CEO do Grupo Carvalho, Elisa. Em Ispala, esse homem anda com o peito estufado e todo mundo abre caminho para ele. Que tipo de perigo ele pode correr na posição em que está?

Elisa sorriu de leve, tentando acalmar a preocupação dele.

— Pronto, Tiago, não fica bravo comigo. O que passou, passou. Daqui para frente, eu e ele não temos mais nada a ver um com o outro. Só me ajuda, vai? Me receita alguma coisa para limpar o que sobrou da toxina no meu corpo.

Tiago inspirou fundo, tentando conter a irritação que sentia. Voltou a se sentar à mesa e começou a escrever a receita com movimentos precisos.

— Por sorte, o pior já passou. Só restou uma pequena parte do veneno no seu organismo. Ainda tem o tônico que te dei da outra vez?

— Tenho, sim. — Respondeu Elisa, assentindo com rapidez.

Era mentira. Não tinha mais nada daquele remédio caro. Mas não queria deixá-lo ainda mais preocupado com a situação. De qualquer forma, a dose residual era mínima. Com algumas ervas comuns, o corpo dela conseguiria eliminar o resto, mesmo que demorasse alguns meses. Os medicamentos caros que antes usava em Daniel, ela nunca teria como pagar para si mesma agora.

Tiago terminou a receita e chamou o assistente, pedindo que fosse preparar as ervas com urgência. Depois, voltou-se para ela com expressão séria:

— E o que pretende fazer agora com a sua vida?

— Abrir um bistrô de comida terapêutica. — Revelou Elisa, os olhos brilhando com a ideia. — Quero seguir os passos da minha avó.

— Você podia trabalhar aqui comigo no hospital. — Insistiu Tiago, inclinando-se para frente. — Com o seu talento para medicina tradicional, virar chef de ervas medicinais é quase um desperdício.

Elisa sorriu, meio amarga, e desviou o olhar.

— Você sabe que não posso tratar pacientes diretamente.

Tiago abaixou os olhos, a culpa pesando no peito. Sabia, sim. Achava que, após tantos anos, e principalmente após três anos cuidando do Daniel, ela tivesse superado o trauma do passado. Mas percebeu que não, a ferida ainda estava aberta.

— Se o seu avô ainda estivesse vivo, ficaria feliz em ver você continuar o legado dele de alguma forma. — Comentou Tiago, com voz suave.

Elisa brincou, querendo aliviar o clima:

— O legado dele já está em boas mãos, nas suas. Além disso, um bistrô medicinal é quase uma clínica, vai. Se tiver algum paciente precisando de reequilíbrio alimentar, me indica.

Tiago sorriu de volta, balançando a cabeça.

— Com certeza. Mas me diz, você tem dinheiro suficiente para isso?

— Eu e a Susana vamos abrir juntas. — Explicou Elisa, cruzando as pernas. — Ela entra com o capital, eu com o trabalho e as receitas.

Tiago bufou, incrédulo:

— Inacreditável. Três anos como Sra. Carvalho, e no fim do casamento você não tem nem dinheiro para alugar o espaço sozinha.

Elisa apenas sorriu, sem se defender das palavras dele. Sim, quem acreditaria nessa história? Nem o próprio Daniel jamais acreditaria se ela contasse.

Ele só veria os números frios, um milhão por mês durante trinta e seis meses, totalizando trinta e seis milhões de reais. Mas, na realidade, sua conta bancária não tinha nem sessenta mil guardados.

Tiago a acompanhou até a saída do hospital. Enquanto esperavam o carro dela chegar, ele perguntou, com voz baixa e cuidadosa:

— E você não está nem um pouco triste por esse divórcio?

Triste? Claro que sim. Mas precisava ir embora mesmo assim, não havia outra escolha. Daniel nunca a amou, e ela não tinha vocação para mártir nem queria viver de migalhas.

— Um pouco, talvez. — Respondeu Elisa, forçando um sorriso que não chegou aos olhos. — Afinal, eu gostava bastante da Vila do Mar do Norte onde morávamos.

Tiago soltou uma risadinha e bagunçou o cabelo dela com carinho fraternal.

— Se é da casa que você gosta, te compro uma igual quando você quiser.

Elisa ia responder com alguma brincadeira, mas ele de repente a puxou pela cintura e deu um passo brusco para trás. Um segundo depois, um carro esportivo passou voando por eles, a centímetros de distância, levantando vento. Se Tiago não tivesse reagido a tempo, os dois estariam mortos ou gravemente feridos.

Elisa empalideceu, o coração disparado no peito. Tiago a envolveu nos braços, apertando de leve para acalmá-la.

— Está tudo bem. Já passou, você está segura.

...

No carro preto estacionado na esquina oposta, Vicente soltou um assobio longo e provocador.

— Aquele é o Tiago, né? O médico do momento em Ispala. Metade dos figurões da cidade se consulta com ele. Até minha avó vive elogiando o cara como se fosse um santo. — Comentou Vicente, virando-se para Daniel com um sorriso malicioso. — Então é com o Tiago que ela anda agora... engraçado, né? Em comparação a você, o cara está bem longe de competir.

Daniel permaneceu em silêncio, os punhos cerrados sobre o volante com tanta força que os dedos ficaram brancos.

Ele sabia que Elisa estava apressando o divórcio, e imaginava que havia outro homem envolvido nisso. Mas ver com os próprios olhos era diferente, era real e doloroso.

Ainda estavam casados, e ela já estava ali, nos braços de outro homem, deixando-se abraçar com intimidade. Uma afronta direta.

— Que foi? Está bravo? — Vicente arqueou a sobrancelha, cada vez mais divertido com a situação. — Pensei que você a detestasse. Está prestes a se livrar dela, devia era estar comemorando.

Daniel não respondeu, apenas manteve o maxilar travado.

Vicente abriu um sorriso maroto, percebendo a verdade.

— Espera aí, não me diga que você está apaixonado por ela.

— Cai fora! — Ordenou Daniel, a voz saindo baixa, mas afiada como gelo cortante.

— Ih... ficou bravo. — Provocou Vicente, rindo abertamente agora. — Quando nega assim é porque acertei em cheio.

Daniel lançou a ele um olhar tão frio e cortante que o amigo imediatamente se calou, levantando as mãos em rendição. Mas o sorriso não desapareceu do rosto de Vicente, que virou o rosto para a janela.

Porque agora, ele tinha certeza de que Daniel estava começando a gostar da própria esposa, justo quando estava prestes a perdê-la. E aquilo prometia ser muito divertido de assistir.
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Último capítulo

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