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capítulo 2

Author: Mentatte
— Otávio, será que a minha irmã tá chateada comigo? Por que ela ainda não entrou em contato com a gente?— Perguntou Lívia, fazendo cara de frágil enquanto se aninhava no peito dele.

— Imagina, Regina é sua irmã. E você tá doente, esse era o seu único desejo. Regina não é do tipo que guarda mágoa. Depois a gente compensa ela de alguma forma. — Respondeu Otávio, num tom baixo, tentando acalmar ela.

Lívia assentiu e, logo em seguida, animada, puxou Otávio e meus pais para irem jantar.

O banquete de frutos do mar, que custou milhares de reais, fez meu pai e minha mãe quase morrerem de dor no bolso.

Mas para a Lívia, parecia tudo normal.

Depois do jantar, voltei a seguir eles até o hotel.

Otávio recusou as tentativas da Lívia de seduzir ele com uma camisola nova e foi sozinho até a varanda, onde ficou fumando em silêncio, com o olhar perdido, sabe-se lá pensando no quê.

Me virei e flutuei até o quarto dos meus pais. Também ainda estavam acordados, provavelmente remoendo o gasto do jantar caríssimo.

Sentados na cama, balançavam a cabeça, soltando suspiros pesados um atrás do outro.

Minha mãe pegou o celular e tentou me ligar, mas viu que o aparelho estava desligado.

Na hora, o rosto dos dois ficou ainda mais tenso.

Na cabeça deles, tudo sempre foi assim: um tapa, depois um agrado. Se ligassem primeiro, na lógica deles, já era o suficiente pra me fazer esquecer tudo. Era sempre desse jeito.

Mas dessa vez, não haveria ninguém do outro lado da linha para atender.

— Carlos, eu acho que a Livinha gasta demais, não guarda nada. Quando a gente envelhecer, ainda vai ter que contar com a Regina. Mas ela não atendeu nosso telefonema agora há pouco... Será que ficou magoada com a gente? — Perguntou minha mãe, olhando pro meu pai com preocupação.

Ele tragou o cigarro, soltou o ar pelo nariz e resmungou, ríspido:

— A gente criou ela. Somos os pais. E a irmã tá doente. O mínimo que ela podia fazer era ceder. Tá se achando por quê?

Fiquei ali, parada no canto do quarto, observando em silêncio, o rosto impassível. Por dentro, só restava o gosto amargo da ironia.

Naquele momento, uma parte de mim chegou a se sentir aliviada por já estar morta.

Duas semanas depois, eles voltaram da lua de mel, radiantes.

Lívia usava meu pijama como se fosse dela desde sempre, e se jogou sem cerimônia na cama onde eu deveria ter dormido com meu marido. Parecia, sem nenhum esforço, a dona da casa.

Otávio olhava ao redor, vagando pelo quarto, como se procurasse alguma coisa ou alguém.

Mas, depois de alguns minutos andando de um lado pro outro, ele percebeu o óbvio: não havia mais nenhum vestígio meu ali. Como se eu nunca tivesse existido.

Ele parou, perdido, diante da porta do escritório onde eu costumava passar tanto tempo.

— Otávio, agora eu sou sua esposa. Não quero nada de outra mulher nessa casa. — Disse Lívia, manhosa, enquanto enlaçava os braços no peito dele. — Comprei tantas roupas novas, que tal transformar esse escritório num closet bem bonito, hein?

A voz dela era melosa, quase infantil, como um gancho afiado cutucando o coração dele.

Otávio hesitou. Afastou as mãos dela com delicadeza, mantendo certa distância. A expressão era incerta, desconfortável.

— Livinha, a Regina ainda é minha esposa. Eu aceitei tudo isso só por causa do seu último desejo... esse escritório, será que...

— Não! — Cortou ela, de imediato. Os olhos se encheram de lágrimas, e a voz soou teimosa e ofendida. — Agora eu sou sua esposa de verdade! Você não pode mais guardar espaço pra outra!

No fim, Otávio cedeu.

Aceitou transformar o meu tão sonhado escritório no closet de Lívia.

— Coloca isso ali!

— Isso aqui pode jogar fora!

— Esse também, fora!

Lívia comandava os operários como se estivesse limpando qualquer traço meu do mundo.

Otávio assistia tudo calado, parado num canto.

Ele sabia. Eu tinha contado tantas vezes que meu maior sonho, desde criança, era ter um cantinho só meu. Um escritório onde eu pudesse existir.
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