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Capítulo 4

Author: Rolinho Primavera de Morango
Mal terminou de falar, Gustavo disparou em direção à saída do aeroporto como se fosse questão de vida ou morte.

Anabela mexeu no celular com dedos que já não sentiam mais nada, naquele estado de choque que faz a pessoa agir no automático.

Não foi surpresa nenhuma encontrar o post de Rafaela Campos no topo do Instagram, uma simples foto de pintura sem legenda, mas que foi suficiente para fazer Gustavo abandonar todos os compromissos e sair correndo atrás dela.

— Senhorita, o embarque está encerrando. — Avisou a funcionária da companhia.

Anabela balançou a cabeça para sair do transe, decidiu que não ia ficar ali feito uma idiota olhando para o lugar onde ele desapareceu e seguiu para o portão de embarque.

Mal chegou quando recebeu uma mensagem dele.

[Vou atrasar uns dois dias. Se vira aí.]

Anabela ficou meio surpresa com a mensagem. Pelo menos ele não tinha desistido completamente, só ia chegar depois.

Era óbvio que Gustavo estava louco para terminar logo com aquela história e se livrar dela de uma vez por todas.

Em vez de ficar plantada esperando, Anabela contratou um guia da região e se juntou a um grupo de turistas que estava saindo para conhecer os pontos principais.

Seu corpo não aguentava o pique dos outros viajantes, então acabava passando a maior parte do tempo trancada no quarto tentando recuperar as forças.

No dia em que Gustavo finalmente resolveu aparecer, ela já estava de malas prontas esperando o táxi para o aeroporto.

— Anabela, eu cancelei um monte de reunião importante, deixei a empresa pegando fogo para vir nessa sua maluquice, e você quer me fazer de otário?

A fúria dele era tanta que chutou a mala dela com tudo, espalhando roupas e objetos pessoais pelo chão inteiro.

Anabela olhou para a bagunça que virou seu quarto e soltou uma risada que não tinha nada de engraçada.

— Vir comigo? A Rafaela não está ali do lado fingindo que está doente?

O rosto de Gustavo travou na mesma hora, e quando tentou se defender, as palavras saíram sem convicção alguma:

— A Rafaela veio aqui trabalhar, fazer umas pinturas da paisagem. Você podia parar de pegar no pé dela.

Anabela sentiu as unhas cravando nas palmas das mãos, mas escolheu não entrar naquela briga idiota. Se abaixou e começou a juntar suas coisas do chão, uma por uma.

— Oi, gente, estou interrompendo alguma coisa? — Rafaela surgiu na porta de repente.

Foi incrível como a cara de Gustavo mudou na velocidade da luz. A raiva virou preocupação desesperada, como se ela fosse feita de cristal e pudesse quebrar a qualquer momento.

— Você não estava passando mal? Por que levantou da cama?

— Ai, Gustavo, não posso ficar deitada o dia inteiro, né? Escutei uma discussão aqui e fiquei preocupada. — Respondeu ela, com voz manhosa.

Só após garantir que Rafaela estava bem que Gustavo se lembrou da existência de Anabela.

— Você está com fome? Vou ver se tem alguma coisa boa para você comer por aqui. — Ofereceu ele, já todo derretido.

Rafaela fez aquela cara de menina tímida que tanto praticava.

— Se não for muito trabalho...

Gustavo já estava com a mão na maçaneta quando parou e virou para Anabela com a maior má vontade do mundo.

— E você? Vai querer que eu traga alguma coisa?

Anabela tinha acabado de guardar a última peça de roupa na mala, e só aquele esforço mínimo já tinha sido suficiente para deixá-la pingando de suor e sem fôlego.

A diferença gritante entre o tom carinhoso que ele usava com Rafaela e a grosseria que destinava a ela estava clara demais para ser ignorada.

— Não precisa de nada, obrigada.

— Então se vira aí. Com essa cara de zumbi que você está, tanto faz se come ou não. — Zombou ele, antes de bater a porta.

Sozinhas no quarto, o ar ficou pesado entre Anabela e Rafaela.

Não era a primeira vez que se encontravam. A família Campos tinha ficado rica da noite para o dia com uns negócios duvidosos na Cidade do Sul, coisa que a aristocrática família Costa sempre olhou com nojo.

Rafaela, por sua vez, tinha aquele orgulho ferido de quem se sentia humilhada e jurou que ia mostrar para todo mundo do que era capaz. Saiu do país numa birra, prometendo que só voltaria depois de conquistar o mundo.

Agora estava ali, de volta depois de fracassar lá fora, e a primeira coisa que fez foi correr atrás do ex-namorado que a família dele nunca quis aceitar.

Para Anabela, assistir a teatro todo era de uma ironia cruel.

Sem Gustavo ali para ver, Rafaela nem se preocupou em manter a máscara de mocinha frágil.

— Anabela, nossa, fazia tempo que a gente não se via, né?

Depois, ela chutou a mala arrumada de Anabela, espalhando tudo de novo pelo chão.

Ver todo o trabalho dela sendo destruído daquele jeito por pura maldade fez algo explodir dentro do peito de Anabela.

Ela sabia que Rafaela queria provocá-la de propósito, queria fazer ela perder a paciência para poder chorar depois para o Gustavo. Então, decidiu dar exatamente o que ela queria.

O tapa que acertou o rosto delicado de Rafaela foi tão forte que ecoou pelo quarto inteiro.

Foi naquela hora que Gustavo voltou, carregando uma bandeja com comida, e viu Rafaela com o rosto vermelho e os olhos cheios de lágrimas.

A bandeja que ele tinha preparado especialmente para Anabela escorregou das mãos dele e se espatifou no chão.

Sem nem perguntar o que tinha acontecido, Gustavo atravessou o quarto e deu um tapa na cara de Anabela que foi muito mais violento que o dela.

— Anabela, você perdeu o juízo de vez!

Rafaela cobriu o rosto com as mãos, fingindo estar destruída:

— Foi culpa minha, Gustavo. Tropecei e derrubei as coisas dela sem querer. Sei que ela me odeia, então é melhor eu sair daqui.

Ela correu para fora do quarto fazendo a maior cena.

Gustavo ia sair correndo atrás dela quando Anabela o chamou:

— Gustavo, a terceira tarefa da nossa lista é você ficar aqui comigo.
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