Capítulo 1

Quando vi aquela silhueta no hospital de obstetrícia, uma imagem que eu jamais esqueceria, senti meu corpo congelar de medo. O sangue parecia correr ao contrário nas minhas veias.

A dor do facão atravessando meu ventre ainda estava viva na minha memória. E aquele homem que chorava dizendo que se importava comigo agora acariciava, com ternura, o ventre da verdadeira culpada.

Estávamos distantes, mas eu conseguia sentir o amor paterno transbordando dele. Foi aí que percebi que o casamento que eu tinha considerado minha salvação não passava de uma farsa.

Meus pais, que haviam prometido estar sempre ao meu lado, destruíram todas as provas do crime e forçaram Bernardo a se casar comigo apenas para protegerem a filha biológica deles. Assim, ela não precisaria pagar na justiça pelo crime de tentativa de homicídio.

Que piada.

Eu engoli a dor e desviei o olhar de Bernardo. Nesse momento, a tela do meu celular acendeu. Era uma ligação dos meus pais.

O toque insistente revelava a urgência do outro lado da linha. Respirei fundo, tentando manter a calma, e atendi.

— Valentina, onde você está? — A voz do meu pai soou preocupada. — A empregada disse que você saiu de casa no meio do dia. Foi para o hospital? Quantas vezes eu e sua mãe já dissemos que você não pode sair assim sozinha com sua saúde frágil? E se algo acontecer no caminho, o que faremos?

Minhas unhas bem cuidadas se cravaram na palma da minha mão, trazendo-me de volta aos pensamentos. Por que tanta preocupação nesse momento? Era medo que eu corresse perigo ou que eu descobrisse a verdade?

— Valentina, você está ouvindo? Onde você está? Eu e sua mãe já estamos no hospital. Vamos te encontrar agora.

A aparente preocupação na voz dele era como uma faca girando no meu coração.

Pensei por um momento e respondi com um tom calmo:

— Estou no banheiro da ala de obstetrícia. Vocês são muito preocupados, pai. Eu só vim fazer um exame de rotina, nada demais. Além disso, eu já sou adulta. Não posso ficar dependendo de vocês para tudo.

Minha resposta, fingindo leveza, pareceu aliviar meus pais do outro lado da linha.

Poucos minutos depois, minha mãe entrou no banheiro apressada e começou a me examinar de cima a baixo.

— Não aconteceu nada, certo? Já fez o exame? — Perguntou ela, ansiosa.

Sob meus cílios baixos, observei a preocupação em seu rosto. Mas, ao conectar isso à pressa de ambos os meus pais momentos antes, ficou claro para mim que eles não estavam preocupados com minha segurança. Eles estavam preocupados que eu cruzasse com Melissa Souza e estragasse seus planos.

— Mãe, está tudo bem. Quando cheguei no hospital, senti um desconforto no estômago e acabei demorando um pouco. Ainda não fiz o exame.

— Ainda bem. — Minha mãe respondeu automaticamente, mas logo percebeu o que havia dito. Virou-se para mim com o rosto sério. — Ainda bem que não fez o exame. Eu e seu pai estamos aqui. Não vamos deixar você enfrentar os aparelhos sozinha. Vamos, nós vamos com você.

Na porta do banheiro, estava meu pai, um homem de meia-idade com uma expressão calorosa.

Embora ele não fosse meu pai biológico, eu tinha crescido acreditando que ele era o homem que mais me amava no mundo. Mas, naquele dia, percebi que, diante de laços de sangue, nada disso importava.

Se era assim, talvez fosse hora de eu retribuir o presente deles com algo à altura.