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Capítulo 4

Author: Melissa Z
— Você viu.

O Damien estava encostado no batente da porta.

Eu não fazia ideia de quanto tempo ele ficou ali.

O rosto dele estava calmo, como se tudo tivesse acontecido como ele planejou.

— Vi o quê? — limpei o sangue do canto da minha boca.

— Seu pai. Como ele realmente é — disse ele, entrando no quarto. — Ainda não entendeu? Ninguém se preocupa com você. Só eu.

Eu quase ri.

— Se preocupa comigo?

— Já mandei meus contatos falarem com os melhores negociadores de arte da Europa. — Ele tirou uma lista do bolso. — Um Monet original. Uma obra-prima do Impressionismo. E um retrato de Rembrandt, que pertenceu à realeza. Mais raro e mais valioso que o quadro do seu avô.

Olhei para a lista, para os nomes das obras e seus preços.

— Eu não quero esses quadros.

— E a Sophia? — ele disse, com um sorriso cruel. — Eu a encontrei por você. Ela faz o Leo feliz. Assim você não precisa mais fazer isso. Está vendo? Podemos fazer isso funcionar.

Um equilíbrio. Ele achava que isso era uma negociação.

— Damien, você ainda não entendeu. — Dei a lista de volta para ele. — Eu não estou negociando com você.

O rosto dele ficou rígido.

— Então o que você quer?

— Eu já te disse. Liberdade. Agora você tem a Sophia. Por que precisa de mim?

— Liberdade? — ele zombou. — Acha que sair daqui é liberdade? O mundo lá fora vai acabar com você.

— Melhor do que apodrecer aqui dentro.

O Damien me observou, como se procurasse um arrependimento na minha decisão.

Finalmente, ele suspirou.

— Tudo bem. Você precisa de tempo pra pensar. Nós conversamos amanhã.

Ele virou e saiu do quarto.

A porta foi trancada de novo.

Anoiteceu.

A casa estava silenciosa, exceto pelo som de passos de vez em quando ou uma porta sendo fechada.

Sentei na minha mesa de trabalho, encarando os suportes vazios.

O Leo não tinha destruído só um quadro. Ele tinha destruído todas as minhas memórias naquele lugar.

Eram dez da noite.

Um gemido suave feminino vindo do andar de cima. — Damien…

Depois uma risada baixa masculina.

O ritmo da cabeceira batendo contra a parede.

Eles nem tentaram ser discretos.

Fechei os olhos.

Então era assim que ele pretendia “fazer isso funcionar”.

A Sophia não estava ali só para cuidar do Leo. Estava ali para cuidar do pai dele também.

Eles combinavam. Formavam uma família mais feliz.

Eu era a peça que estava sobrando.

Ouvi passos pararem do lado de fora da minha porta.

— Ainda está brava? — A voz de Leo veio pela fresta, com um tom estranho de triunfo. — Ouviu isso? O papai já te esqueceu.

Não respondi.

— A Sophia é cem vezes melhor que você — ele continuou. — Ela está me ensinando a dançar. Assiste filmes comigo. E dá abraços quentinhos no papai. Diferente de você.

Os sons do andar de cima ficaram mais altos.

— Ela disse que você é só mais uma interesseira — a voz de Leo ficou venenosa. — Que você só está aqui pelo dinheiro do papai.

Respirei fundo e fui até a porta.

— Leo.

— O quê?

— É isso mesmo que você acha?

Depois de alguns segundos de silêncio, ele gritou: — Sim! Quero que você saia da nossa casa!

Naquele instante, o último fio de afeto que eu tinha por ele morreu.

Enfiei a mão no bolso e peguei a chave do carro que encontrei ontem em uma gaveta do estúdio.

A única coisa naquela mansão que era realmente minha.

Meu Ford Mustang. O presente do meu avô.

Caminhei até a janela.

— O que você está fazendo? — o Leo perguntou, com a voz repentinamente preocupada.

Ele devia estar curioso da razão do meu silêncio.

Não respondi.

Peguei o martelo de emergência, quebrei a janela e pulei.

A queda do terceiro andar não era tão alta.

Caí nos arbustos do jardim.

Meu braço ficou arranhado, mas eu não me importava.

Corri para a garagem.

No momento em que eu coloquei a chave na ignição, o motor ligou.

Aquele carro era minha obra-prima. O resultado de oito anos de noites sem dormir fazendo modificações.

— Elara!

O Leo estava na entrada da garagem, segurando uma arma de verdade.

— Aonde você pensa que vai? — ele gritou, um mix de pânico e raiva em sua voz. — Você não pode ir embora! Eu ainda não acabei com você! Você não pode ir!

Engatei a primeira.

— Adeus, Leo. Não volto mais. Assim como você queria.

Mas eu não esperava o que veio depois.

Quando pisei fundo no acelerador, ele levantou a arma e mirou em mim.

— Eu te avisei!

BANG.
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