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— Nanda, já te falei isso mil vezes, sério. Jéssica está com câncer, só resta um ano para ela. Meu maior desejo é deixar um filho para família dela. Ela salvou minha vida, agora sou eu quem precisa ajudar a realizar o sonho dela!

Esse discurso do Fábio Santos, meu noivo, eu já ouvi tanto nesse último mês que nem conseguia contar.

Quando ele veio com essa história pela primeira vez, respondi na lata que não aceitava.

Só que ele não sossegou. Quase todo dia fazia questão de tocar no assunto.

No começo, Fábio ainda tentava ter tato, parecia querer minha opinião. Mas, com o tempo, começou a me pressionar e discutir comigo, como se eu fosse uma pessoa cruel só porque não concordava.

Por mais que eu fosse grata à Jéssica pelo que fez por ele, não existia cabimento em querer pagar uma dívida dessas trazendo um filho ao mundo.

Um mês de brigas acabou com a minha energia. Achei que conseguiria convencê-lo a mudar de ideia, mas agora nem tinha mais forças. Olhei para Fábio, o mesmo cara com quem namorei há cinco anos, e disse com uma voz trêmula:

— Fábio, mês que vem é nosso casamento. Você agora quer ter um filho com outra mulher. E eu? O que eu represento, afinal?

Fábio nunca me viu tão para baixo. Pela primeira vez, parecia que ele percebeu como aquilo me afetava, e o tom da voz dele amoleceu um pouco:

— Nanda, sei que é pesado para você... Mas só eu posso ajudar a Jéssica, não consigo deixar ela ir embora com esse vazio. E olha, é só inseminação artificial, não vai ter nada entre nós. Se você realmente me ama, vai entender, certo?

Na hora, senti meu coração afundar como nunca.

Estava claro que Fábio já tinha decidido. Ia mesmo dar um filho para Jéssica, gostando eu ou não.

Para ele, minha opinião era mero detalhe.

Antes que pudesse continuar, o toque do celular dele cortou o clima.

Ele só deu uma olhada na tela, pegou o celular e foi direto para varanda falar, me deixando ali parada.

Fiquei encarando as costas dele, e só consegui soltar um sorriso amargo no canto da boca.

Minha vida com Fábio sempre foi ligada. Crescemos juntos, estudamos até faculdade na mesma sala. Desde novinha, eu sabia que gostava dele, fiquei anos ao lado dele sem esperar nada em troca. Só depois da formatura, ele olhou para mim de verdade e quis namorar.

Teoricamente, depois de vinte anos de história juntos, cinco de namoro, era para eu ser a pessoa de maior confiança na vida dele.

Mas nesses cinco anos, nunca mexi no celular do Fábio. As ligações eram sempre escondidas, as mensagens também.

Teve uma vez que ele estava de cama com febre, o celular não parava de apitar. Quis pôr no silencioso para ele descansar, mas bastou eu encostar no aparelho para ele acordar e começar a me acusar, sem nem ouvir minha explicação.

De nada adiantou. Fiquei aquela noite toda encolhida no sofá, tentando entender que sentido tinha tudo aquilo.

Sempre achei que era só o jeito dele. Me convenci que, com o tempo, conseguiria conquistar a confiança dele por completo.

Mas se passaram cinco anos, e nada mudou.

E, agora, ele queria um filho com outra. Nem considerava um segundo o que eu, a noiva, estava sentindo com tudo isso.

Quando entrou em casa depois da ligação, Fábio parecia animado. Pegou a jaqueta às pressas e já ia saindo, quanto dizia:

— Preciso resolver umas coisas. Pensa direito nisso, tá bom?

Meus ouvidos só captaram o som dos passos dele apressados no corredor. No peito, ficou um vazio enorme.

Para alguém deixá-lo assim ansioso, só podia ser a Jéssica.

E como era de se esperar, pouco depois chegou uma mensagem dela.

Quando ampliei a foto que ela me mandou, o choque foi tão forte que mal consegui me manter de pé.